Mesmo com aumentos menores da tarifa de energia elétrica e de alimentos e bebidas, a inflação deve ter em fevereiro a maior alta mensal desde 2003, o que levará o índice acumulado em 12 meses a superar 7,5% no período, avaliam economistas. 

De acordo com a média de 18 instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Valor Data, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu 1,09% em fevereiro. Embora seja uma pequena desaceleração em relação a janeiro, quando a inflação foi de 1,24%, é uma variação bastante superior a de igual período de 2014, quando o IPCA foi de 0,69%. Por isso, no acumulado em 12 meses, o índice deve passar de 7,14% para 7,56%, a maior variação nessa comparação desde dezembro de 2004. 

As projeções para o IPCA, que será divulgado amanhã pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), variam entre 1,01% e 1,15% em fevereiro. 

Fabio Romão, economista da LCA Consultores, avalia que os três principais grupos que compõem o índice oficial de inflação - habitação, alimentação e bebidas e transportes - devem desacelerar entre janeiro e fevereiro, mas a correção de preços administrados deve manter o índice com variação acima de 1% em fevereiro. O economista estima alta de 1,01% do IPCA no mês. 

No caso de habitação, afirma, a alta um pouco mais branda deve ser passageira. O economista estima que o grupo passou de aumento de 2,42% em janeiro para alta de 1,02% em fevereiro, principalmente por causa da tarifa de energia elétrica. Com o início da vigência do sistema de bandeiras tarifárias no primeiro mês do ano, que corrige o preço da energia de acordo com o custo de geração, a tarifa residencial subiu 8,27%, aumento que deve passar para 2,2% nesta leitura. 

Romão lembra, porém, que em março as bandeiras serão reajustadas, o que levará a outra forte alta do preço dessa tarifa no mês, mantendo a inflação bastante elevada no período. "A energia tem um componente discricionário e essa alta menor em fevereiro não significa que o preço vai continuar desacelerando", afirma. 

O mesmo vale para alimentos e bebidas, comenta Romão. Ele projeta alta de 0,58% em fevereiro, abaixo do avanço de 1,48% em janeiro e da alta de 0,85% no IPCA-15 do mês passado. Em sua avaliação, vários itens que tiveram a oferta mais pressionada pela seca agora devem ceder um pouco, caso de feijão, tubérculos e açúcar e derivados, além de carnes e leite. No entanto, diz, a greve dos caminhoneiros, embora pareça estar sendo debelada, pode encarecer os alimentos ao longo deste mês. 

Além disso, os preços agropecuários no atacado voltaram a subir, pressionados pela desvalorização recente da taxa de câmbio, afirma Mariana Orsini, economista da GO Associados, o que também a leva a projetar que o grupo tenha alta mais forte em março do que em fevereiro. 

No mês passado, diz Mariana, dois grupos devem ter explicado boa parte da elevação de 1,12% do IPCA. Um é a alta de 5,98% de educação, que repete a variação observada na prévia do índice, com o reajuste das mensalidades escolares. Outro é transportes, com o aumento dos combustíveis que passou a vigorar no início do mês. 

Para Romão, da LCA, parte do aumento de PIS e Cofins sobre gasolina, que deve subir 6,16% nesta leitura, será compensada pelo fato de que saem da conta os reajustes de transporte público, como ônibus, trem e metrô, que pressionaram o índice no primeiro mês do ano. Por isso, o grupo transportes deve ceder de 1,83% para 1,80% na passagem mensal. 

Para Romão, a concentração de reajustes de preços administrados neste início de ano deve levar o IPCA no primeiro trimestre a acumular alta de 3,6%. A partir de abril, afirma, as variações mensais devem ser um pouco mais bem comportadas, com alta entre 0,55% e 0,6% do índice em abril, por exemplo. No entanto, com fortes aumentos de energia e desvalorização mais acentuada do câmbio, a LCA Consultores revisou projeção para a inflação oficial neste ano, de 7,5% para 7,8%. 

Mariana, da GO Associados, prevê alta de 7,3% no ano, diante da avaliação de que o dólar pode não se manter acima de R$ 2,90 ao longo do ano. "Podemos ver alguma melhora, mesmo que temporária, mas estamos avaliando a nossa projeção para o ano", diz a economista. (Tainara Machado - Valor Online)

____________________________________________________________________________________________________________________________________

Tarifa e alimento fazem inflação pesar mais para baixa renda

05/03/2015 - Fonte:  Valor Online 

Famílias que vivem com menos de cinco salários mínimos e moram no Rio de Janeiro. São pessoas que se encaixam nesse perfil provavelmente as que mais sentiram a forte alta de preços em janeiro. É o que apontou o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), indicador de inflação para a baixa renda do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) - no país ele variou 1,48% no mês e, considerado apenas o Rio, subiu 2,41%. É mais do que a inflação geral, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que considera um leque de renda até 40 salários e abarca praticamente toda a população. Em janeiro, a inflação carioca subiu 1,71% pelo IPCA, e, na média nacional, a alta foi de 1,24%. Amanhã, o INPC de fevereiro também será conhecido e vai ser possível observar se a tendência prosseguiu no segundo mês do ano. Mas num ano em que a inflação de serviços, que costuma pesar muito para os mais ricos, deve ceder espaço para a alta dos preços administrados, ou seja, tarifas básicas que proporcionalmente pesam mais sobre os mais pobres, não será surpresa se o movimento prosseguir. "Não à toa, esperamos para este ano 7% para o IPCA e 8% para o INPC", disse Fabio Romão, analista da LCA Consultores. A variação do INPC começa agora a ultrapassar a do IPCA, depois de dois anos abaixo dele. Este é apenas um exemplo de como, apesar de haver um índice oficial de referência, o IPCA, a inflação pode variar bastante de acordo com o perfil do consumidor, a cidade onde está e mesmo sua disposição em pesquisar preços e substituir o que esteja caro, fator difícil de mensurar nos cálculos tradicionais. A Fundação Getulio Vargas (FGV), por exemplo, além de calcular um índice próprio de preços ao consumidor, o IPC-S, calcula trimestralmente também a inflação para a terceira idade, o IPC-3i, que verifica a cesta das pessoas com mais de 60 anos. Em 2014, fechou com alta de 6,62%, abaixo do IPC-S geral, que bateu 6,87%. Planos de saúde, que tomam 8% do orçamento dessas pessoas, e gastos domésticos, como alimentação e luz, que têm maior peso para um grupo que sai menos de casa, pesaram para a conta alta. Mas, por outro lado, menos gastos com serviços e o direito a gratuidade no transporte público, umas das principais pressões a partir da segunda metade do ano, ajudaram a inflação da terceira idade ficar um pouco abaixo da média. Outro indicador, o Índice de Custo de Vida (ICV), calculado para a cidade de São Paulo pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), calcula a variação dos preços para três faixas: o um terço mais pobre da população da capital, o terço intermediário e o terço mais rico. Nos 12 meses até janeiro, a inflação para o grupo mais pobre foi quase 1,5 ponto maior que a do grupo mais rico: atingiu 7,9% para a baixa renda, 7,6% para a renda média e 6,6% para a faixa mais alta. A inflação média, pelo ICV, foi de 7,05% do período. "Para o tercil mais baixo, a alimentação tem um peso alto, bem como serviços básicos como transporte público, luz e água", explica Patrícia Costa, economista do Dieese responsável pelo ICV. Os gastos com alimentação, que incluem supermercado, restaurantes e bares, representam 40% da cesta mensal da baixa renda, pelo ICV. Na faixa superior é 26%. "Em anos em que os reajustes são mais intensos em serviços básicos, a inflação para a baixa renda acaba superando a geral, e o contrário acontece quando o aumento vem de serviços, de combustíveis, passagens aéreas", diz Fabio Romão, da LCA. O segundo caso foi o que aconteceu no ano passado: com a inflação puxada ainda com muita força por serviços, o IPCA, referente à renda geral, ficou mais alto que o INPC, na classe mais baixa: o primeiro encerrou o ano em 6,41% e o segundo em 6,23%. Já em janeiro, com o novo impacto dos alimentos e dos trens e ônibus, a situação começou a se inverter, com 7,14% no primeiro e 7,13% no segundo. No longo prazo, no entanto, a diferença é bem pequena. Se considerada a inflação acumulada nos últimos cinco anos, até janeiro, o IPCA marca 36,21%, enquanto o INPC acumula 36,49%. No ICV, índice do Dieese, a diferença no período entre os três estratos é também pequena: os mais pobres têm gastos 39,73% maiores, a renda intermediária teve acúmulo de 39,23% e, para os mais ricos, a alta foi de 39,77%. "A inflação é uma média de muitas variáveis", diz o economista Samy Dana, professor da Escola de Administração de Empresas da FGV. "É necessário entender que ela não é o consumo de ninguém, é uma referência. É diferente para quem mora sozinho, para quem tem ou não carro, filhos na escola."
____________________________________________________________________________________________________________________________________
Consumidor pesquisa, troca marcas e altera a percepção individual das taxas médias

Por Juliana Elias

Não é apenas a renda ou a dependência maior de um ou outro serviço que faz diferença na percepção individual da  inflação. O economista André Chagas, que coordena o IPC­Fipe, Índice de Preços ao Consumidor da Fundação  Instituto de Pesquisas Econômicas, lembra que outro elemento que desvirtua a inflação pessoal da inflação média  é a disposição do consumidor em pesquisar preços e substituir ou abandonar marcas e produtos que estejam mais  caros.  Com base em diferentes índices de preços nos últimos anos, a Fipe chegou à conclusão de que, por não considerar  a possibilidade de substituição, os índices de referência superestimam a inflação em 0,6 ponto por ano, em média.  Isso significa que, se o IPCA foi 6,4% no ano passado, para um pessoa que deixou de comprar tomate ou passou a  ir menos vezes ao cinema, por exemplo, ela pode ter sido de 5,8%.  “As fórmulas não consideram que o consumidor substitua produtos ou comprem menos de alguma coisa”, diz.  “Então, sim, é possível, como é na  verdade muito provável, que o consumidor mais atento tenha inflação menor.”

Levamento feito pela Fipe a pedido do Valor mostrou que, em janeiro, dentro de uma mesma região da cidade de São Paulo, o valor para adquirir uma cesta básica pode ficar até 43% menor caso o consumidor garimpe opções mais baratas pelo bairro. É o caso da zona norte da capital, onde a cesta mais cara custaria R$ 511 e, a mais  econômica, R$ 287,53. O preço médio na região era de R$ 382,09.  O levantamento foi feito para uma cesta fixa, de 44 produtos, sempre da mesma marca, pesquisados em 88  mercados da capital e divididos em cinco regiões. Coxão mole, leite longa vida, alface e creme dental são alguns  dos produtos. A cesta mais em conta reúne a versão mais barata encontrada de cada produto entre todas os  mercados da região, e o mesmo, na outra ponta, para a cesta mais cara.  É uma situação extrema e mais hipotética do que real, já que exigiria que o consumidor fizesse suas compras de  três ou quatro lojas diferentes, mesmo que próximas.

Chagas destaca ainda que o levantamento não capta outras  fontes de inflação, como custos diferentes por conta de aluguel mais caro ou serviço melhor. “Mas ir a diferentes  locais, pesquisar diferentes marcas, ainda mais em um momento de aumento de preços, pode ser uma forma de  escapar um pouco.”  Isso, no entanto, não vale para todos os tipos de produto. Há alguns que não têm opção alternativa e outros que  são mais difíceis ou simplesmente impossíveis de se abandonar, como aluguel ou conta de luz. Isso, diz o  economista Samy Dana, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), deve fazer a inflação de 2015 especialmente  mais difícil.

“A inflação está subindo, mas puxada por itens que não têm por onde correr, porque são serviços de  utilidade muito básica”, disse Dana. Enquanto preços livres e de serviços começam a desacelerar, em 2015 a inflação deve ser puxada para cima por reajustes já ocorridos ou aguardados em serviços monitorados como energia elétrica, transporte público, gasolina e gás de cozinha. “É muito comum, em um primeiro momento, quando os custos aumentam, as pessoas  diminuírem despesas como lazer, beleza, viagens”, diz Dana. “Mas, quando se fala em aumento de matrícula,  gasolina, de luz, não há muita alternativa. A inflação acaba sendo quase como um imposto.”Valor Econômico – SP – 05/03/2015