A forte alta de 7,7% do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado em 12 meses já é mais influenciada pelo processo de recomposição dos preços administrados, que sobem mais de 9,6% - maior alta nessa base de comparação desde outubro 2005, quando a alta foi de 9,72%. Isso não significa, no entanto, que os preços livres deixaram de pressionar a inflação: apesar do nível fraco da atividade econômica, aceleraram de 7,09% em janeiro para 7,19% no ano encerrado em fevereiro, trajetória ainda explicada pela resistência dos serviços, que seguem perto de 9%.

De acordo com cálculos da LCA Consultores, após as altas expressivas de janeiro e fevereiro, os administrados já sobem 9,64% em 12 meses. Em dezembro, a alta acumulada era de 5,31%, número que saltou para 7,53% em janeiro. Também nos 12 meses encerrados em fevereiro, os serviços tiveram alta de 8,64%. Embora seja uma taxa menor do que os 8,82% observados em janeiro, ainda se situa próxima do nível de quase 9% que vinha sendo registrado nos últimos meses.

 

Em anos típicos a inflação de fevereiro costuma ser bem mais comportada que a de janeiro. Mas devido ao ajuste dos preços administrados, o índice pouco cedeu no mês passado e ficou em 1,22%, praticamente estável em comparação aos 1,24% vistos no primeiro mês do ano. Na passagem mensal, os itens monitorados subiram 2,37% em fevereiro e já tinham subido 2,5% na medição do mês anterior. Já os preços livres ficaram praticamente estáveis, ao passarem de 0,87% para 0,88%, mas com aumento de 0,87% para 1,07% dos serviços.

Para economistas, o comportamento deste grupo tem um forte componente inercial e ainda está respondendo ao cenário favorável para o mercado de trabalho observado em 2014, quando o rendimento médio real dos trabalhadores nas seis principais regiões metropolitanas do país subiu 2,7%. Na medida em que os indicadores de renda e emprego forem piorando ao longo do ano, no entanto, espera-se que os repasses em serviços diminuam, ainda que lentamente.

Os serviços também sofreram influência da sazonalidade: na metodologia do IBGE, os reajustes de mensalidades escolares são captados em fevereiro e, por isso, o grupo educação avançou 5,88%.

Segundo Leonardo Sapienza, economista-chefe do banco Votorantim, os serviços têm inércia muito grande e, por isso, a política monetária e fiscal precisam continuar caminhando juntas para coordenar as expectativas e evitar a alta dos preços livres. Na avaliação dele, os efeitos da política mais restritiva sobre a dinâmica inflacionária devem ficar mais claros apenas em 2016.

Usados para expurgar ou diminuir o impacto de itens mais voláteis sobre o IPCA, os núcleos de inflação avançaram no mês passado. A média das três medidas mais observadas pelos economistas subiu de 6,64% para 6,78% em 12 meses, trajetória que, para a equipe econômica da Rosenberg & Associados, aponta que o índice cheio vai se elevar no curto prazo e deve mostrar forte aceleração até o meio do ano. No caso dos serviços, no entanto, a consultoria viu a aceleração do grupo em fevereiro como sazonal, influenciada sobretudo por gasto com educação.

Essa também é a percepção de Adriana Molinari, da Tendências Consultoria. Ela observa que a situação melhor do mercado de trabalho em 2014 ainda se reflete nos serviços. "Mas isso deve se inverter neste ano. Teremos aumento do desemprego e forte desaceleração da renda real". No cenário da Tendências, os serviços vão subir 7,7% em 2015, menos que os 8,39% no ano passado.

 

Realismo tarifário já explica quase metade do índice

 

Por Denise Neumann | De São Paulo

A política de realismo tarifário e de fim de subsídios setoriais explica parte expressiva da inflação de 1,22% de fevereiro. Essa alta, que superou as expectativas do mercado, foi puxada pelos preços administrados, e dentro deles, os aumentos da energia elétrica e da gasolina. Os itens monitorados subiram 2,37% e sozinhos responderam por 47,5% da inflação de fevereiro. No mesmo período do ano passado, eles responderam por 14% de um IPCA de 0,69%. A energia elétrica subiu 3,14% e respondeu por 0,10 ponto da inflação de fevereiro. O peso da gasolina foi maior, com alta de 8,27% e impacto de 0,31 ponto no índice.

Ajudaram a completar as pressões o aumento de 2,88% no preço dos automóveis novos, afetados pela recomposição do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), mais 0,09 de impacto na composição do índice do mês. Se for acrescentada a essa conta a influência de etanol e ônibus urbano, o peso desses cinco itens no IPCA de fevereiro já ultrapassa 50%. Parte deles (como ônibus) sempre sobem nessa época.

No conjunto, a política de realismo tarifário começa a pesar mais (pouco, mas mais) no orçamento das famílias de baixa renda, o que pode custar novos pontos na já bastante abalada popularidade da presidente Dilma Rousseff.

No primeiro bimestre, a inflação acumulada no INPC (que mede a alta de preços para famílias até cinco salários mínimos) subiu 2,66%, mais do que a inflação de 2,48% acumulada no IPCA, que avalia o comportamento da inflação para famílias com até 40 salários mínimos de renda familiar. Nesse movimento, um dos preços que mais influenciou a inflação das famílias mais pobres foi o item transporte, afetado por gasolina, mas também pelos reajustes de ônibus e metrô, preços cuja política não depende diretamente das decisões do governo federal. O item transporte respondeu por 35% da inflação medida pelo INPC no primeiro bimestre, enquanto habitação explica 23% dela e o grupo alimentação outros 27%. No conjunto, esses três grupos explicam 85% da inflação da baixa renda, enquanto nas famílias de renda média e alta, o peso dos mesmos grupos foi de 75%.

 

Falta d' água pode tirar 0,3 ponto do PIB, diz Tendências

 

Por Tainara Machado | De São Paulo

Ainda que seja difícil calcular os efeitos sobre a economia das restrições já vigentes no consumo de água no Sudeste, principalmente em São Paulo, a Tendências Consultoria estima que a falta de água na região e o corte de fornecimento em curso devem "tirar" 0,3 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) nacional de 2015, afirma a economista Alessandra Ribeiro.

A estimativa se baseou em pesquisas qualitativas da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e do Rio de Janeiro (Firjan), que questionaram as empresas sobre a necessidade de interromper a produção em caso de desabastecimento de água. A partir desses questionários, a Tendências estimou um porcentual de empresas que seriam atingidas pela medida na indústria e o efeito de uma queda de produção de 10% nessas companhias.

Com base no peso do setor industrial no Sudeste, a Tendências estima que cortes no fornecimento de água para a indústria deve reduzir o PIB do Brasil em 0,2 ponto percentual neste ano. A consultoria ainda realizou cálculos semelhantes a partir de dados da Sabesp para o comércio, com impacto de 0,1 ponto percentual sobre o PIB do país. No total, afirma Alessandra, a crise hídrica, ainda que concentrada no Sudeste, deve tirar 0,3 ponto do PIB neste ano.

Mesmo que um racionamento de água não tenha sido decretado, diversas regiões de São Paulo já enfrentam falta de água, com pressão reduzida no fornecimento durante à tarde desde janeiro.

O risco de racionamento de energia não foi incorporado ao cenário, afirma Alessandra.

Por enquanto, diz ela, a consultoria aguarda o fim do período de chuvas, em abril, para ajustar o cenário. A percepção é que chuvas equivalentes a 85% da média histórica, combinadas a um aumento de 68% da tarifa de energia elétrica neste ano, serão suficientes para conter o consumo de energia elétrica, sem necessidade de imposição de racionamento.

Alessandra observa, porém, que caso seja necessário impor corte de 10% do consumo sua projeção para o PIB neste muda para queda de 2%.

A economista afirma, no entanto, que boa parte da revisão em relação ao cenário que a Tendências tinha no fim do ano passado foi feita em consequência dos desdobramentos da Operação Lava-Jato. Em outubro de 2014, a Tendências ainda projetava expansão de 1% da economia neste ano - agora já prevê contração de 1,2%.

Do corte de 2,2 ponto percentual na estimativa para o PIB de 2015, 1,9 ponto se deve aos efeitos da investigação sobre o esquema de corrupção na Petrobras. Para a economista, além da revisão do plano de investimentos da estatal, há também a paralisação de obras e projetos como um todo, já que o escândalo envolveu as maiores empreiteiras do país, que enfrentam dificuldades financeiras. "E ainda tem os efeitos multiplicadores dos investimentos da Petrobras, que não são pequenos. Ou seja, a queda do PIB neste ano deve ocorrer muito mais por causa de um choque de demanda, com queda de 6% da formação de capital fixo, do que um choque adverso de oferta de energia e água", diz.