O projeto de reforma do PIS e da Cofins, em elaboração pelo Ministério da Fazenda, deverá limitar o uso de créditos pelas empresas exportadoras. Atualmente, as companhias que têm mais de 50% da produção dirigida ao mercado externo não recolhem PIS nem Cofins. A proposta é que apenas as empresas que exportem 80% de sua produção tenham direito à suspensão no pagamento do tributo. Com isso, o governo reduz o número de beneficiários da medida e, ao mesmo tempo, retoma o conceito original de empresas preponderantemente exportadoras que vigorou quando o PIS e a Cofins foram reformados em 2003.
O projeto também deve prever uma transição que comece com a migração do PIS para o novo sistema e só depois a Cofins, para evitar a eventual perda de receita. O governo teme erros de cálculo nas estimativas para mudança de alíquota e da base de cálculo. Assim, mudar só um dos tributos limitaria as perdas.
Os técnicos também debatem como tratar o setor agrícola, que hoje tem direito a um crédito presumido nas operações internas e é um dos principais entraves à intenção da área econômica de eliminar os chamados regimes especiais, que são restritos a alguns setores da economia e têm um sistema de recolhimento diferenciado.
Segundo o Valor apurou, o governo considera que o percentual de 50% da produção usado hoje para definir as empresas chamadas preponderantemente exportadoras foi excessivamente reduzido. Na prática, essas companhias não recolhem a Cofins, numa operação conhecida pelo termo técnico como suspensão, mas têm direito ao crédito, que funciona como receita extra.
A ampliação do benefício aos exportadores foi feita em 2012, quando o governo lançou um dos pacotes de incentivo às exportações. Até aquela data, tinham direito ao benefício as empresas que exportam 60% dos produtos, se fossem intensivas em mão de obra, e 70% da produção nos demais casos.
Se a mudança feita pelo governo for restrita à Cofins, as empresas exportadoras ainda continuarão tendo direito ao crédito do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), mas se a alteração for feita no conceito de empresas preponderantemente exportadoras as companhias também sofrerão com um corte no benefício dado por meio do IPI, que não precisa ser recolhido por quem se enquadra na definição.
A tributação do setor agrícola é um dos capítulos mais difíceis da reforma do PIS/Cofins. O setor atualmente tem direito a um crédito presumido que para o café é de 60%, para a carne, de 50%, e para a soja de 40%. O novo sistema de tributação em estudo pelo governo estabelece que todas as compras das empresas vão gerar créditos de PIS e Cofins que podem ser abatidos de tributos devidos na fase seguinte da produção. Hoje, apenas compras de insumos usados diretamente na produção podem gerar créditos.
O problema aparece quando as compras são feitas de produtores pessoas físicas. Nestes casos, o comprador não poderia gerar crédito, já que essa operação é restrita a pessoas jurídicas.
Assim, o imposto pago na compra de insumos, como soja em grão, por exemplo, feito diretamente dos produtores, não teria como ser descontado nas outras fases da cadeia produtiva. A avaliação inicial do governo é que será preciso um sistema alternativo para que não haja aumentos na tributação do setor, mas a equipe do ministro Joaquim Levy ainda não chegou ao desenho final.
Os técnicos do governo também estão olhando de perto os regimes especiais de recolhimento do PIS e da Cofins. Trata-se, normalmente, de benefícios tributários dados a setores específicos da economia, como informática, por exemplo. A proposta consiste em eliminar ou então reduzir ao mínimo possível essas exceções à regra.
O ministro Joaquim Levy pretende enviar o projeto com as alterações ao Congresso ainda este ano para que o novo sistema possa começar a funcionar em 2016. A ideia é que as empresas sejam obrigadas a conviver num primeiro momento com dois sistemas. O PIS passaria a funcionar segundo as novas regras de que todas as compras geram crédito no valor do imposto destacado na nota fiscal.
A Cofins, no entanto, teria uma transição mais lenta. A preocupação é com a arrecadação. Enquanto o PIS rendeu R$ 53,3 bilhões em 2014, a Cofins respondeu por R$ 200,4 bilhões. Com a transição mais lenta o governo acredita que poderá ajustar eventuais erros no novo sistema sem arriscar uma parcela muito grande das receitas federais.
Além do PIS e da Cofins, o Ministério da Fazenda também procura retomar a renegociação do ICMS, mas a discussão perdeu força depois que a União avisou que não tem como garantir os recursos que seriam usados para ressarcir parte das perdas de receitas que os Estados terão com a mudança nas regras de recolhimento.
Alta do dólar torna subsidiária brasileira mais competitiva para exportar
Por Marta Watanabe | De São Paulo
A desvalorização do real frente ao dólar facilita aos exportadores o cumprimento de uma norma tributária que tem por objetivo impedir a remessa de lucros para o exterior, o chamado preço de transferência. Isso tem dado à subsidiária brasileira uma vantagem adicional na competição pela exportação dentro do mesmo grupo, em relação a subsidiárias localizadas em outros países. Trata-se de uma vantagem importante. Cerca de 70% do comércio mundial acontece intracompanhia e na exportação brasileira a taxa não é menor, segundo a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
"O câmbio tem dado às empresas maior flexibilidade de preço para o cumprimento da norma", diz José Augusto de Castro, presidente da AEB. Ele conta que isso tem entusiasmado exportadores em vendas intracompanhia aos Estados Unidos em setores como máquinas e equipamentos. Em segmentos com bens de maior agregado tecnológico, diz, a taxa de troca entre companhias é maior.
A ideia do preço de transferência é evitar que o exportador transfira parte do seu lucro a uma empresa do mesmo grupo no exterior. Por isso a norma determina o exportador faça uma adição à base de cálculo do Imposto de Renda quando, pelas normas da Receita Federal, o preço pelo qual a empresa vende o bem ao exterior está menor do que o preço utilizado como parâmetro pelo Fisco.
Uma das formas previstas na legislação para se calcular o preço parâmetro é adicionando ao custo de produção uma margem de lucro de 15%. Esse preço é calculado na moeda nacional. A margem é considerada alta em períodos em que a moeda nacional está valorizada, o que reduz a rentabilidade da exportação.
Quando o real está valorizado, portanto, fica mais difícil baixar o preço de exportação para competir com a subsidiária em outro país e ainda cumprir a regra tributária de preço de transferência. O valor a adicionar ao IR fica muito alto, o que eleva a carga tributária da operação e muitas vezes a inviabiliza.
Com a desvalorização da moeda nacional, acontece o contrário. Cada dólar faturado na exportação rende mais reais. É possível à subsidiária brasileira baixar o preço - e portanto ficar mais competitiva - e chegar bem perto da margem de lucro de 15% estipulada pela Receita.
A pedido do Valor, a Athros Auditoria e Consultoria levantou os efeitos de diferentes taxas de câmbio para os preços de transferência. O cálculo levou em consideração um bem com custo de produção de R$ 80,00, mais impostos e contribuições de R$ 20,00 e preço de exportação de US$ 43. No primeiro bimestre do ano passado, com dólar médio a R$ 2,38, esse preço, em moeda nacional, se converteria em R$ 102,34. Ou seja, uma margem pequena, de R$ 2,34, equivalente a 2,34% do custo total incluídos os impostos.
Exportado a US$ 43 no ano passado, esse bem teria obrigado o exportador somar R$ 12,66 ao seu lucro na hora de calcular o Imposto de Renda para cumprir a norma de preço de transferência. Na prática, essa norma eleva o IR de exportadores com margem de lucro mais baixa. Considerando o câmbio de R$ 2,80 - taxa próxima à atual - o mesmo bem exportado a US$ 43 geraria R$ 120,40 na conversão à moeda nacional.
A desvalorização em relação ao real, além de elevar a rentabilidade - a margem subiria para 20,4% -, permite ao exportador, nesse exemplo, cumprir a norma de preço de transferência sem precisar acrescentar algum valor para o cálculo do IR.
Mais do que isso, lembra Castro, permite ao exportador brasileiro maior flexibilidade para baixar seu preço para competir com empresas que estão em outros países sem se preocupar com os efeitos negativos da norma tributária.
De acordo com os cálculos da Athros, no câmbio a R$ 2,80, o preço poderia ser reduzido para US$ 39,12, ainda gerando rentabilidade de 9,5% ao exportador e sem resultar em ajuste para o IR.
No câmbio a R$ 2,91, projetado pelo mercado ao fim do ano, de acordo com o último boletim Focus divulgado pelo Banco Central (BC), o preço de exportação poderia ser reduzido a US$ 37,64 sem gerar ajuste no IR, mantendo a rentabilidade em 9,5%.
Os cálculos da Athros não levaram em conta os efeitos que o câmbio pode ter sobre os custos de produção. Luciano Nutti, consultor tributário da Athros, explica que quando o preço de exportação é muito menor que o preço de transferência e é necessário fazer o ajuste, a repercussão não se limita ao IR mas também à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Quando é preciso somar ao lucro alguma diferença em relação ao preço de referência, portanto, diz Nutti, o exportador pagam 34% em tributos sobre o valor de ajuste, sendo IR de 25% e CSLL de 9%.