Os investidores de varejo do Japão se desfizeram em massa de aplicações em reais pelo vigésimo mês consecutivo em fevereiro, derrubando a fatia da moeda brasileira no estoque global aplicado via fundos Toshin ao menor percentual desde pelo menos 2010, de acordo com dados do Nomura.
Segundo o analista do Nomura em Tóquio Masayuki Nakajima, a depreciação do real em meio à piora nos fundamentos da economia brasileira é o principal motivo para essa debandada. "Não acho que é o momento para comprar ativos brasileiros agora", diz o analista.
Ele afirma, contudo, que o patamar do real próximo de 40 ienes já começa a estimular uma modesta recuperação nas alocações na moeda brasileira.
As aplicações em real via fundos Toshin segundo o critério "currency selection type" - que engloba investimentos feitos diretamente nas moedas - responderam por 28,37% do total alocado no fim de fevereiro, depois de se recuperarem ligeiramente em janeiro para 30,38%. A título de comparação, em março de 2010 o volume alocado na moeda brasileira representava 76,25% do total.
Embora ainda siga líder na preferência dos investidores de varejo do Japão, o real viu sua vantagem cair dramaticamente. Em março de 2010, a fatia das aplicações na moeda brasileira era 9,7 vezes maior que a detida pelo segundo colocado à época, o dólar australiano (7,84%).
Hoje é apenas 1,4 vez maior ante o total alocado em dólar americano, que atualmente ocupa a vice-liderança, com 20,63% de participação.
Como a rentabilidade desses investimentos depende basicamente do comportamento do câmbio, Nakajima afirma que a principal demanda dos investidores de varejo do Japão no momento é pela definição por parte do Banco Central (BC) dos rumos da política cambial.
Parte da queda de 13% do real ante o dólar e de 12% em relação ao iene neste ano se deve justamente às incertezas quanto ao suporte do BC à taxa de câmbio.
Essas dúvidas aumentaram depois que a autoridade monetária sinalizou para este mês a rolagem parcial de contratos de swap cambial tradicional com vencimento em abril.
Mantida a oferta diária de 7.400 papéis em leilões de rolagem, o BC caminha para deixar vencer quase US$ 2,2 bilhões nesses papéis. Com isso, o BC terminaria março sem promover injeção líquida de dólares no mercado por meio desses instrumentos, o que não se via desde maio de 2014.
A inquietação do mercado também ocorre porque março é o último mês de vigência do programa de oferta diária de liquidez. Por meio da "ração" diária, o BC tem ofertado ao mercado diariamente US$ 100 milhões em swaps, suprindo a demanda por "hedge" e ajudando a amenizar a pressão de baixa sobre o real.
A sinalização do governo sobre uma maior tolerância com uma taxa de câmbio mais depreciada também vem pesando sobre o real. No fim de janeiro, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, causou ruído no mercado ao dizer que não há intenção de se manter a taxa de câmbio valorizada artificialmente. O Ministério da Fazenda tentou amenizar o impacto das declarações ao esclarecer que o ministro referia-se ao movimento do dólar no mundo, mas o dólar seguiu em forte alta.
Na sexta-feira, o ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, Nelson Barbosa, disse que correções e ajustes vão viabilizar novo ciclo de crescimento, que no médio prazo o câmbio desvalorizado incentiva investimentos e que a depreciação recente do real não causa descontrole, sendo apenas uma mudança de patamar.
Investidores vêm interpretando esses comentários como um sinal de que o governo vê a desvalorização do câmbio como elemento essencial no processo de ajuste de preços relativos pelo qual o Brasil atravessa agora. Nesse sentido, o câmbio teria o papel de reduzir o déficit em conta corrente a níveis vistos como mais sustentáveis.
Nakajima, contudo, critica essa estratégia e diz que o governo precisa concentrar esforços no controle da inflação. "Por acaso a S&P e a Moody's pediram para reduzir o déficit em conta corrente?", questiona.
Depois de terem liquidado em janeiro o equivalente a 25,189 bilhões de ienes (US$ 210,609 milhões) em ativos lastreados em reais - o maior volume desde setembro de 2014 -, os fundos Toshin reduziram o ritmo de vendas em fevereiro para 3,635 bilhões de ienes (US$ 30,399 milhões).
Mas alguma recuperação já começa a se desenhar. "Tenho ouvido que alguns investidores compraram ativos brasileiros recentemente. O nível de 40 ienes por real é um importante ponto técnico", afirma Nakajima.
Na sexta-feira à tarde, o real caía 1,24%, para 39,494 ienes, no menor nível desde dezembro de 2012. Desde 2011, o real caiu para perto de 40 ienes em três ocasiões, recuperando-se logo em seguida em todas elas.
Em 2011, a queda do real foi ditada pelas ações do governo contra a valorização da moeda brasileira, que na época alcançou a máxima ante o dólar desde a adoção do regime de câmbio flutuante, em 1999.
Na metade de 2012, a aversão global a risco provocada pelo receio de a Grécia sair da zona do euro novamente derrubou o real para perto de 40 ienes. Em 2013, foi a vez de o Federal Reserve ditar uma onda de liquidação em operações de "carry trade" que pressionou todo o conjunto de moedas emergentes. Na ocasião, o Fed sinalizou que poderia encerrar o programa de compra de ativos, concluído no ano passado.