Título: Fôlego renovado
Autor: Cotta, Carolina
Fonte: Correio Braziliense, 20/07/2011, Saúde, p. 19

Medicamento que ajuda a evitar crises inflamatórias de portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica está acessível em seis estados brasileiros e no DF. A droga também reduz as internações de um grupo específico de pacientes

Belo Horizonte ¿ Tente inspirar e expirar por meio de um canudinho. A dificuldade é certa e bem parecida com a sensação que pesa no ato de respirar sobre os portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). O nome é grande e a sigla, desconhecida da maioria das pessoas, mas trata-se da quinta causa de mortalidade no Brasil. Talvez com outro nome seja mais fácil identificá-la: a DPOC é a junção do enfisema pulmonar com a bronquite crônica, essa última bem diferente da bronquite também conhecida como asma, que acomete muitas crianças e em adultos tem componentes genéticos.

Trata-se de uma doença crônica e sistêmica, por se espalhar em complicações pelo corpo. As mortes são causadas tanto por insuficiências respiratórias como por infartos do miocárdio, acidentes vasculares cerebrais (AVC) e diabetes, tudo decorrente da inflamação que começa no pulmão e se generaliza. Na ponta de tudo, está o cigarro ¿ e outros produtos da queima do tabaco ¿, causa de 85% dos casos. Os outros 15% ficam por conta da exposição constante à fumaça de fogões a lenha. Segundo Roberto Stirbulov, presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), o contato com esses agentes nocivos ao pulmão leva a um processo inflamatório contínuo e inexorável contra o qual age o roflumilaste, agora acessível no país.

O medicamento é o primeiro anti-inflamatório para DPOC, inaugurando uma nova classe terapêutica. O roflumilaste tem ação específica no combate à inflamação da doença, atuando como terapia associada aos medicamentos que tratam de sintomas. Sua ação ajuda a diminuir as exacerbações, também chamadas de crises, retardando a progressão da doença e dando mais qualidade de vida e aumento do tempo de sobrevida dos pacientes. O novo medicamento, contudo, não substitui "o melhor tratamento possível para DPOC", como afirma o pneumologista Carlos Fritscher, professor da Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul ¿ numa referência à associação entre broncodilatadores e corticoides.

Público-alvo Um diferencial do novo medicamento é que ele age especificamente sobre a inflamação do DPOC. "O roflumilaste não dilata os brônquios, mas diminui as inflamações melhorando a função pulmonar", explica Fritscher. "Ele é mais indicado para aquele paciente gordinho, que passa o dia inteiro tossindo e tem várias exacerbações". No paciente de enfisema ¿ magro e com menos inflamação ¿ a ação do novo medicamento é menor.

Ainda não há um medicamento que cure a DPOC, mas as drogas que aliviam os sintomas, como os broncodilatadores, permitem a entrada de mais ar no pulmão levando o paciente a sentir menos falta de ar. Em associação com esses medicamentos também podem ser usados corticoides inalatórios, que melhoram a função pulmonar. Também é destinado a um grupo específico de pacientes: aquele em que se sobressai a bronquite crônica.

Segundo o pneumologista José Roberto Jardim, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o roflumilaste é indicado para o paciente grave, que tem mais de uma exacerbação ao ano, tem muita tosse e catarro e já usa o broncodilatador. "Quanto mais exacerbações apresenta o paciente, mais inflamado ele está." O novo medicamento também não dá alívio imediato, papel dos broncodilatadores. "O roflumilaste será um medicamento para se tomar pelo resto da vida e os primeiros efeitos só serão sentidos em três meses", afirma Jardim.

Segundo Fritscher, o paciente tem ainda uma série de tratamentos dos quais pode se beneficiar e deve sempre começar por interromper o tabagismo, o que em 15 anos pode reduzir a chance de mortalidade em 15%, além de diminuir a perda da função pulmonar. Há ainda a reabilitação pulmonar, um programa de exercícios para o treinamento da musculatura envolvida na respiração, a oxigenoterapia ¿ pacientes mais graves podem precisar de oxigênio de 15 a 24 horas por dia ¿ e cirurgias de retirada de bolhas no pulmão, indicada em casos específicos de enfisema. Hoje, apenas seis estados brasileiros e o Distrito Federal oferecem gratuitamente o tratamento para o mal com o roflumilaste. São eles São Paulo (por ação judicial), Espírito Santo, Bahia, Pernambuco, Ceará e Amazonas.

DPOC

Doença respiratória, caracterizada pela obstrução do fluxo aéreo, que não pode ser totalmente reversível, associada a uma resposta inflamatória do pulmão a partículas ou gases nocivos, principalmente os encontrados na fumaça de cigarro (85% dos casos).Causada, geralmente, por exposição constante a essas substâncias, gera inflamação crônica nos pulmões e nas vias respiratórias, aumentando a produção de secreção e tornando o catarro mais espesso e pegajoso. A doença provoca fibrose e perda de elasticidade pulmonar e danos nos alveolos, o que leva à dificuldade de respirar.

Funcionamento alveolar Na DPOC, o fluxo aéreo está limitado porque os alvéolos perdem sua elasticidade e as estruturas de suporte, e as pequenas vias aéreas ficam estreitadas.

TESTE ( ) Você tem tosse diariamente ? ( ) Você tem catarro todos os dias ? ( ) Você cansa mais do que uma pessoa da sua idade ? ( ) Você tem mais de 40 anos ? ( ) Você é fumante ou ex-fumante?

Em caso de três respostas positivas ao questionário acima, o paciente é indicado à expirometria, um exame simples que mede a capacidade pulmonar. Esse exame e o histórico clínico do paciente, além de dados epidemiológicos levão ao diagnótico.

Complicações e crises Por ser uma doença sistêmica, a DPOC pode repercutir em problemas cardiovasculares, diabetes, perda de massa muscular, osteoporose, obesidade, AVC, ansiedade e depressão, câncer e desnutrição. As crises decorrentes das inflamações são chamadas exacerbações, que são uma piora geral no estado do paciente.

Tratamento Além dos brocodilatadores e corticoides, pacientes mais graves contam agora com nova classe de medicamento. Trata-se do roflumilaste, o primeiro administrado por via oral, apenas uma vez ao dia e específico no combate à inflamação. A droga reduz as crises, retardando, assim, o progresso da doença.

ALERTA A DPOC é considerada a 6ª causa de mortalidade no mundo e até 2020 subirá para a terceira posição.Estima-se que de 5 a 7 milhões de brasileiros sejam portadores da doença. Apenas 24% da população já ouviu falar nela e mais de 50% desconhecem os sintomas.

Fonte: Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT) e Organização Mundial de Saúde (OMS)