Em depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras em que ouviu mais elogios do que questionamentos, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), acusou ontem o procurador-geral da República (PGR), Rodrigo Janot, de ter feito uma "escolha política" dos parlamentares que responderiam a inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) por suspeita de envolvimento em desvios na estatal.

A escolha do procurador, disse, foi uma tentativa de criar "constrangimento para transferir a crise do outro lado da rua para cá", se referindo à distância que separa o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional. Ele e o presidente do Senado Federal, Renan Calheiros (PMDB-AL), viraram alvo de investigação no STF a pedido de Janot.

No depoimento, o pemedebista defendeu a tese de que é preciso alterar a legislação para evitar a recondução do PGR. "Um procurador-geral que depende do Poder Executivo para a sua reeleição deveria dizer que não é candidato à reeleição. Caberia a nós até mudar a legislação para impedir a reeleição do procurador-geral, assim ele não fica na posição de tentar agradar ninguém, seja para quem vai reconduzi-lo, seja quem vai aprová-lo", afirmou. Cabe ao Senado avalizar o nome depois da indicação da Presidência.

Para Cunha, a abertura de inquéritos atendeu a critérios políticos. O pemedebista questionou o uso, pela PGR, de uma doação de R$ 200 mil de uma empreiteiras envolvida em desvios na Petrobras, enquanto o senador Delcídio Amaral (PT-MS), que também foi citado em delação premiada e recebeu recursos das investigadas, teve o inquérito arquivado.

Cunha acusou o procurador-geral de ignorar parte da delação premiada que apontava que Delcídio Amaral que tinha indicado Nestor Cerveró para a Diretoria Internacional da Petrobras para não desfazer a "trama montada", de que o PMDB teria indicado Cerveró. "Existe uma contradição clara que ele preferiu ignorar."

O ponto central do inquérito é a delação premiada em que o doleiro Alberto Youssef afirma que Cunha recebeu propina de contrato de aluguel de um navio-plataforma da Samsung e Mitsui, que teria como representante no Brasil o executivo Júlio Camargo. Em determinado momento, Camargo teria parado de fazer repasses ao PMDB e Cunha pediu a aliados que questionassem em uma comissão na Câmara os contratos das empresas com a Petrobras.

Para o pemedebista, a denúncia é inconsistente porque Camargo também assinou termo de delação premiada e nada do que foi divulgado remete ao caso. Cunha protestou ainda que Janot não tenha lhe dado a chance de responder aos indícios de crime antes de solicitar ao STF a abertura do inquérito o que, para Cunha, foi uma atitude "irresponsável e leviana" que lhe causou constrangimentos.

O deputado Paulinho da Força (SD-SP) pediu que a CPI quebre o sigilo telefônico do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e de Janot para "descobrir como foi a trama para incluir deputados".

O pemedebista, contudo, não quis estender as críticas de "escolha seletiva" ao ministro Teori Zavascki, do STF, que analisou o pedido da PGR e decidiu autorizar a investigação. "O ministro Teori adotou procedimento único, de seguir o pedido do Ministério Público, até porque ele não teria condições de fazer uma avaliação, no prazo do procurador, em 48 horas, ler todas essas peças no detalhe", afirmou. Cunha.

A reunião da CPI serviu mais como desagravo ao presidente da Casa do que para questioná-lo sobre pontos do inquérito. Entre aplausos e elogios, apenas cinco dos 34 deputados que pediram a palavra fizeram perguntas a Cunha e o resto, de PT a PSDB, teceram rasgados elogios à "postura transparente" de ir à comissão sem precisar ser convocado. "O senhor é uma luz que há de brilhar, a esperança de lutar por um pais melhor", disse o líder do PHS, Marcelo Aro (MG).

A deputada Clarissa Garotinho (PR-RJ), adversária de Cunha no Estado, criticou o desagravo e foi uma das poucas a fazer perguntas. "Considero vergonhosa a reunião de hoje. Não cabe a nenhum parlamentar condenar ninguém, tampouco absolver. Achei eu que estava na reunião da CPI e pelo que vi foi uma reunião de felicitações", disse, para ementar questionamentos, negados pelo pemedebista, sobre se ele conhecia participantes do esquema ou se teria contas no exterior.

O presidente da Câmara também rejeitou pedido do PSOL para quebrar antecipadamente seu sigilo fiscal, telefônico e bancário. "Não vou fazer a bravata de colocar à disposição meus sigilos para não constranger quem quer que seja a ter que fazer o mesmo, sob pena de parecer que tem algo a esconder", disse. "Se a comissão entender que tem qualquer tipo de dúvida e deva promover a abertura de qualquer tipo dos meus sigilos, tem os instrumentos para isso", afirmou.

 

Gabrielli volta a defender Pasadena

 

O ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli contestou ontem afirmações de que a corrupção na estatal era institucionalizada, mas que seria ilusão dizer que não houve esse tipo de irregularidade na empresa. "Não tem como você no dia a dia saber que o cara está roubando", afirmou, em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara dos Deputados que investiga as denúncias envolvendo a petroleira.

Ao voltar ao Congresso Nacional para falar sobre a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, ele - mais uma vez - defendeu a operação. Afirmou ter "certeza absoluta" de que foi um bom negócio. Gabrielli, que comandou a Petrobras de 2005 a 2012, se disse tranquilo, pois atualmente responde a apenas um processo no Tribunal de Contas da União (TCU) a respeito dessa compra.

Os ex-dirigentes da estatal, investigados pela Operação Lava-Jato porque teriam atuado no esquema de corrupção, segundo o Ministério Público Federal (MPF), ocuparam os cargos durante a gestão de Gabrielli. No entanto, ele alega que tinha uma relação "estritamente profissional" com Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional, e Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento, por exemplo.

"Não acredito na tese que está sendo construída de que há uma corrupção sistêmica na Petrobras, mas não posso afirmar que não há corrupção", reconheceu Gabrielli. E continuou: numa empresa com mais de 80 mil funcionários, investimentos bilionários e diversas pessoas "tomando decisões, dizer que não tem corrupção, isso seria uma ilusão".

Seria impossível que auditorias internas identificassem atos de corrupção na empresa, justificou o ex-presidente da Petrobras aos deputados. Citando informações de delatores da Operação Lava-Jato, Gabrielli disse as negociações ilícitas supostamente aconteciam diretamente com os fornecedores da estatal (empreiteiras). "Se você não consegue captar isso nos sistemas internos, e tudo foi certificado durante pelo menos oito anos pelos melhores auditores do mundo, você tem que descobrir as irregularidades através de denúncia ou de investigação policial", afirmou.

Todavia não se pode "confundir o comportamento criminoso de alguns com o comportamento de uma empresa que está funcionando muito bem", frisou Gabrielli. Ele confirmou que é filiado ao PT e que tem relação de amizade com o ex-ministro José Dirceu. Mas negou que alguém lhe tenha pedido "ajuda financeira" quando esteve no comando da Petrobras.