Até onde vai o ciclo de aperto monetário continua uma questão em aberto para o Banco Central. A ata da mais recente reunião do Comitê de Política Monetária permite apenas a conclusão de que haverá pelo menos mais um aumento de juros, mas não sua intensidade. Na prática, o BC já está travando uma batalha contra o avanço de preços em 2016 e a convergência para a meta nesse ano não é favorável. Para isso, aponta a ata, "os avanços alcançados no combate à inflação (...) não se mostram suficientes".

Não se sabe se, e como, o BC pretende garantir que seus objetivos para 2016 sejam cumpridos. Os dois processos relevantes que estão movendo a inflação - realinhamento dos preços domésticos em relação aos internacionais e realinhamento dos preços administrados em relação aos livres - tendem até agora a não permitir que isso ocorra, ou a exigir, em princípio, dose de juros bem maior.

Boa parte da elevação da inflação, que pelos analistas poderá chegar perto de 8% este ano, está sendo puxada pelo realinhamento dos preços de energia e combustíveis, que levou a inflação dos preços administrados à frente do índice geral. Até a reunião do Copom de março, tomando como base janeiro, o IPCA em 12 meses atingiu 7,14%, a inflação dos administrados 7,55% e a dos preços livres, 7,01%. Para 2015, o BC elevou sua previsão de correção dos itens monitorados ou administrados para 10,7%, ante 9,3%. A conta poderá variar ainda - para cima. O BC computou em seus cálculos reajuste de energia elétrica de 38,8% e há probabilidade de que ele seja maior. Da mesma forma, em seu cenário de referência, fez simulações com o dólar a R$ 2,85 e a moeda americana já correu bem à frente desse valor.

Para 2016 só há tênue expectativa favorável. Pelos números, porém, não é trivial derrubar a inflação para perto de 4,5%. Os preços administrados se situarão acima dos 4,5% do centro da meta em 2016 - 5,2% é a previsão do BC. Os preços livres teriam então de evoluir abaixo da média, mas até agora não há sinais de que isso vá ocorrer. Apesar da ação cumulativa e espaçada no tempo dos aumentos de juros já realizados, os preços dos bens não comercializáveis estão correndo a 8,29%, com os de serviços ainda perto dos 9% (8,76%), como estiveram nos últimos quatro anos.

O trabalho de convergência para a meta será em grande medida feito pela recessão. Juros em alta e aperto nas contas públicas estão esfriando rapidamente as atividades econômicas e há reflexos disso na ata. Ela menciona que a economia está crescendo abaixo do seu potencial, que há desalavancagem no endividamento das famílias, moderação na concessão de crédito e "tendência de acomodação" na margem estreita de ociosidade do trabalho - leia-se mais desemprego. Para 2016, a promessa do governo é elevar a meta fiscal para pelo menos 2% do PIB, que é bem contracionista pois terá de ser obtida em um ambiente de baixo crescimento, na melhor das hipóteses.

Várias apostas correm o mercado, após a ata. Os juros futuros ontem apontavam para um aumento de 0,75 ponto percentual na Selic na próxima reunião do Copom e outro de 0,5 ponto na seguinte, elevando a taxa básica a 14%. Outros analistas consideraram moderada a ata, pela sinalização de que o alvo de 4,5% será obtido "durante 2016", em vez de "em 2016". A ata não diz sim nem não a ambas.

Aumentos mais fortes dos juros pressupõem que a política monetária mudou, assim como a política fiscal. Seria melhor deixar o alinhamento cambial e dos preços administrados fazerem todo o mal de uma vez, combater seus efeitos com alta carga de juros e obter retorno mais rápido à normalidade do crescimento e da inflação no centro da meta.

Parece mais sensata a hipótese de que a política fiscal mudou, mas o BC nem tanto, e que a autoridade monetária já esteja dilatando sua previsão para a convergência da inflação à meta. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem agido com a moderação que as restrições políticas exigem para tentar obter a economia de 1,2% do PIB. Já o BC, ao jogar para 2017 os 4,5%, não estaria fazendo nada mais do que fez nos últimos quatro anos, contentando-se com apertar a evolução dos preços dentro do teto da meta (6,5%).

Esta política foi ruinosa para sua credibilidade e a inflação de 2015 está desancorada. Por outro lado, o contexto político e econômico para uma tardia política monetária severa é hoje adverso e não há indícios de que o BC queira ir nessa direção.