A ida aos supermercados está se tornando traumática para boa parte dos brasileiros. Diante dos fortes reajustes de preços, muitos são obrigados a retirar produtos básicos dos carrinhos, pois o orçamento doméstico já não comporta mais as compras que se fazia há seis meses. O choque no bolso vem de todos os lados: dos alimentos, da energia elétrica, dos combustíveis, informou ontem o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De cada 100 produtos e serviços pesquisados pela instituição, 69,3% tiveram aumento nos últimos 30 dias.

Não por acaso, o IPCA-15, a prévia da inflação oficial, registrou alta de 1,24% em março, quase o dobro do verificado no mesmo mês do ano passado (0,73%), ficando acima da mediana projetada pelo mercado, de 1,21%. Apenas nos três primeiros meses de 2015, a carestia acumulou elevação de 3,50% e, em 12 meses, de 7,90%, a maior taxa desde maio de 2005. Os números surpreenderam a maior parte dos especialistas, que revisaram, para cima, as projeções para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechado de março. Segundo Elson Teles, do Itaú Unibanco, em vez de 1,30%, o custo de vida será de 1,33% neste mês, chegando a 8,1% em 12 meses.

Pelos cálculos do IBGE, a energia elétrica, com alta média de 10,91%; os combustíveis, com aumento de 6,25%; e os alimentos, com reajuste de 1,22%, responderam por 77,42%, ou 0,96 ponto percentual, do IPCA-15. São itens dos quais a maioria dos brasileiros não pode abrir mão no dia a dia. Da comida que vai para a mesa, os grande vilões foram a cebola (19%), a cenoura (18,3%), o tomate (13%), os ovos (12%), as hortaliças (7,6%) e o feijão-carioca (3%). Para Flávio Combat, economista-chefe da Concórdia Corretora, os consumidores não terão trégua ao longo deste ano, sobretudo por causa da eletricidade, que continuará tendo elevações por causa do baixo volume de chuvas.

Peso do dólar
A gritaria é geral. Para a dona de casa Soraya Nogueira, 54 anos, a carestia está no limite. Tudo aumentou. Água, luz, alimentos. Ir ao supermercado virou um suplício, reclamou. Ela garante que os seus gastos com energia elétrica aumentaram 28% de 2014 para cá. Mesmo tendo diminuído o uso de aparelhos elétricos e adotado luz solar nos banheiros, a conta está vindo mais cara a cada mês, emendou. No entender dela, com a eletricidade tão cara, ficou sem sentido o governo ter dado tanto incentivo à população para o povo comprar móveis e eletrodomésticos. Agora, não se pode usar o que comprou, porque não há como pagar a energia, desabafou.

Para encaixar os altos preços no orçamento, o servidor público Leandro Lima, 38, decidiu trocar o carro pelo transporte público. Pelo que calculei, gastaria pelo menos R$ 500 com combustível, R$ 100 a mais do que antes, disse. Mas não foi só: cortei todos os supérfluos. Agora, em casa, só entram produtos de primeira necessidade, complementa. Ou é isso, ou a conta não fecha.

A mesma estratégia foi adotada pela aposentada Vera Lúcia Tibúrcio, 64, que levou um susto na última vez em que foi ao supermercado. Comprei os mesmos produtos de sempre, mas gastei quase R$ 40 a mais, reclamou. Nada que eu comprava ano passado consigo achar pelo mesmo valor neste ano. Segundo ela, os preços da carne, do feijão e dos legumes foram os que mais subiram, e o impacto fica maior ao juntar a conta de luz, que mais do que dobrou no último mês de R$ 50 para R$ 120, mesmo não tendo mudado os hábitos de consumo.

Daqui por diante, destacaram os especialistas, os consumidores vão sentir mais no bolso o peso da disparada dos preços do dólar. Vão subir pães, massas, bolos, biscoitos, todos produtos fabricados a partir do trigo. Como Brasil importa quase 50% do grão que consome, pagará mais caro. A indústria e o comércio já avisaram que repassarão o aumento dos custos para a clientela.