O Brasil vem atravessando um longo período de alta incerteza econômica. Há algum tempo já não há confiança em projeções econômicas para um horizonte temporal um pouco mais longo, digamos um ano.

Em 2014, a incerteza econômica parecia advir, principalmente, da imprevisibilidade do desfecho do processo eleitoral. A disputa presidencial foi pautada por mudanças bruscas nas intenções de votos nos vários candidatos, que representavam possibilidades distintas de evolução da economia. A dificuldade de prever o candidato vitorioso alimentava a incerteza econômica.

Mas, ao contrário do que muitos imaginavam, finda a eleição, a incerteza econômica não se dissipou. Tornou-se ainda maior. Há pelo menos três razões para isso.

Mesmo que o governo escolha políticas adequadas, a incerteza econômica não se dissipará tão cedo

Primeiro, um ambiente político conturbado ameaça abortar o surpreendente esforço de ajuste fiscal posto em marcha para ajudar a restaurar a credibilidade econômica. O início do ano foi marcado por uma série de derrotas do governo no Congresso. Com isso, a viabilidade desse ajuste passou a ser imediatamente questionada. Pairam dúvidas sobre a capacidade do Planalto constituir a base parlamentar requerida para aprovar as medidas fiscais necessárias. Neste caso, a incerteza política potencializa a incerteza econômica.

Segundo, o país vem atravessando uma longa crise energética. A resistência do governo em reconhecer a gravidade do problema inviabiliza medidas que levem à superação da crise. O que significa uma enorme incerteza sobre o suprimento de energia no curto e médio-prazos. É difícil precisar probabilidades de ocorrência de racionamentos ou apagões, assim como projetar tarifas futuras de energia. Como a energia elétrica é um insumo crucial, os possíveis desfechos da crise energética afetarão a capacidade produtiva do país. Mais uma vez, a incerteza econômica é potencializada.

Finalmente, não se tem a mais vaga ideia sobre quais serão os desdobramentos dessa avalanche de denúncias da Operação Lava-Jato. Mas enquanto a crise perdura, a Petrobras e as demais empresas envolvidas parecem paralisadas, e em processo de rápida contração de suas escalas de operação. Se o desenrolar do petrolão afetasse apenas essas empresas, o choque de incerteza econômica já seria brutal.

Mas a magnitude da incerteza que emana do petrolão vem sendo amplificada por dúvidas de ordem econômica, institucional e política, que transcendem às empresas implicadas e demorarão a ser esclarecidas. Há dúvidas quanto à extensão do envolvimento da classe política no petrolão. Há dúvidas quanto ao desfecho dos vários processos penais subjacentes. E, ainda, dúvidas quanto à capacidade do governo de atrair novas empresas dispostas a investir em infraestrutura. E quanto à própria governabilidade. Há dúvidas...

Hoje, ao analista macroeconômico já não basta dominar a teoria econômica e as ferramentas estatísticas usuais. É necessário compreender a dinâmica das forças políticas no Congresso, entender as inúmeras especificidades e tecnicalidades inerentes ao setor elétrico, como projeções de afluência e seus efeitos no volume dos reservatórios, ter um mínimo de familiaridade com o direito penal e o funcionamento do Poder Judiciário. Há de se concluir que nem o mais hábil dos analistas está apto a vislumbrar cenários econômicos confiáveis.

Dado este alto grau de incerteza que assola a economia brasileira, cabe nos perguntar como a atividade econômica está sendo impactada.

 

A teoria é intuitiva: incerteza econômica paralisa o investimento. O retorno esperado das várias possibilidades de investimento depende do cenário econômico prospectivo. Diante da inabilidade de se projetar tal cenário com um mínimo de nitidez, é natural que, sob a hipótese plausível de que o investimento possui algum componente irreversível, se opte por postergá-lo à espera de um período menos incerto.

Considere a decisão de construir um fábrica. Diante da perspectiva de uma demanda forte (fraca), deve-se se projetar uma fábrica que acomode muitos (poucos) trabalhadores. Caso contrário, a fábrica não seria lucrativa. Sob uma grande incerteza em relação à demanda, como é custoso adaptar as instalações de uma fábrica já construída à escala de produção que afinal se revelar adequada, o melhor a se fazer é esperar. No futuro, quando a demanda se revelar nitidamente forte ou fraca, constrói-se a fábrica de dimensões apropriadas.

Uma vez estabelecido o canal teórico, resta quantificá-lo. Artigos acadêmicos costumam documentar que o efeito da incerteza na atividade econômica é colossal. Basta ter em conta três exemplos recentes. Julio e Yook (2012) documentam que em períodos pré-eleitorais, quando as eleições presidenciais são acirradas, o investimento das empresas cai 11% em média. Baker e Bloom (2013) defendem que pelo menos metade da variação do crescimento econômico pode ser atribuída a choques de incerteza. Finalmente, Bloom e coautores (2014) argumentam que um aumento de incerteza similar ao que ocorre durante os períodos recessivos nos EUA reduz o PIB em 2,5%.

A evidência empírica sugere, portanto, que a enorme incerteza econômica, vigente já há algum tempo na economia brasileira, está tendo um efeito deletério substancial sobre o PIB.

É forçoso concluir que para recuperar a capacidade de crescimento da economia brasileira é necessário, em primeiro lugar, que esta incerteza colossal que nos assola se dissipe. Parte dela reflete fatores políticos e institucionais que estão fora da alçada do Planalto. Isto significa que mesmo que o governo nos surpreenda com a escolha de políticas adequadas, a incerteza econômica não se dissipará tão cedo. Ao que tudo indica, a estagnação será duradoura.

Eduardo Zilberman é doutor pela New York University e professor de Economia da PUC-Rio.