O crescimento de apenas 0,1% do Produto Interno Bruto (PIB) no ano passado reforçou a iminência de retração da economia. Relatos de empresas de vários setores mostram que o comércio sentiu a ausência do consumidor nas lojas e reduziu encomendas das indústrias e contratação de serviços logísticos. Indústrias e redes varejistas abortaram planos de investimento e não descartam demitir para lidar com o aumento de custos. Todos os empresários entrevistados peloValor relataram custos maiores com preços de energia, frete ou insumos importados.

Mesmo setores que ainda conseguiam escapar ao marasmo na atividade econômica, como serviços, sentem os consumidores mais cautelosos e dispostos a barganhar por preço, até devido aos efeitos da inflação alta nos primeiros meses do ano. Sandra Bacchin e Marina Arruda Acioli, sócias da Bem Florido, empresa de decoração de eventos, afirmam que os últimos meses do ano passado foram mais "parados", mas no início de 2015 as empresárias notaram súbito aumento por pedidos de orçamento. O problema é que as consultas não se concretizaram em contratos. "Está todo mundo buscando preço, fazendo comparações", diz Sandra.

Sandra enxerga um claro "soluço" da economia em março, com aumento da incerteza diante de manifestações, do cenário político conturbado e noticiário econômico mais adverso. Com isso, os clientes também ficam mais reticentes. "Os mesmos fatores que fizeram o dólar subir nas últimas semanas fazem todo mundo parar".

Nilso Berlanda, presidente da rede Berlanda, que possui 201 lojas de móveis e eletrodomésticos na região Sul, relata que em março a queda da receita foi de 10% contra igual mês de 2014, o que fechou um primeiro trimestre muito fraco. Com liquidações, janeiro empatou com 2014, mas em fevereiro a queda foi de 20%, com o impacto da greve de caminhões. Para ele, março mostra o que deverá ser um padrão para 2015. "As lojas estão vazias. A classe C, que puxava as vendas, parou de consumir e está tentando pagar dívidas. A inadimplência aumentou."

Com a queda de vendas e a falta de perspectiva de reversão do quadro, Berlanda reduziu as suas encomendas entre 10% e 15% em relação a 2014 e avalia que terá que cortar pessoal. O grupo, que também reúne indústrias de colchões, móveis e estofados, possui 2,4 mil empregados em Santa Catarina. Berlanda estuda corte de 10% do quadro. Diz que não pensa em fechar lojas, mas os planos de expansão da rede em 2015 foram suspenso. "A ordem este ano é me manter. Estamos tentando reduzir despesas. As lojas que abastecíamos duas vezes por semana, por exemplo, vamos reduzir para uma vez ", conta. "Da última vez em que houve uma crise assim, o Lula baixou o IPI. Mas a Dilma não pode mais fazer isso, porque as pessoas não conseguem mais comprar."

No setor industrial, os relatos também são desanimadores. José Carlos Nadalini, diretor-presidente da Engrecon, fabricante de engrenagens para caminhões e implementos agrícolas, conta que não se lembra de a empresa atender tantos pedidos de orçamento, sem que as consultas se transformem em encomendas.

Segundo Nadalini, as consultas estão chegando porque as empresas estudam um processo de nacionalização necessário para financiamentos e também por conta do real desvalorizado. A decisão de produzir ou investir dos clientes, porém, ainda não foi tomada.

O empresário diz que a receita da empresa nos primeiros dois meses e meio do ano caiu cerca de 30% em relação a igual período de 2014, quando já houve recuo de 10% contra o ano anterior. A taxa de ocupação está em torno de 50%, diz Nadalini, e hoje são 160 trabalhadores na empresa. Em 2014, eram 180. "Estamos tentando segurar novas demissões e dando férias para os funcionários."

No lado oposto, a Estrela, fabricante de brinquedos, começa a se beneficiar das três fábricas que tem no Brasil. Carlos Tilkian, presidente da empresa, afirma que essa "vantagem" tem contribuído para que a empresa aumente a fatia no mercado doméstico e tenha alta de faturamento mesmo em ambiente econômico difícil. "Hoje, 70% do faturamento vem da produção nacional e esperamos elevar a fatia até o fim do ano, o que permitirá ser mais competitivo do que quem importa, que tem aumento de custo ou perda de rentabilidade", diz.

Tilkian avalia que o cenário atual não impede a empresa de crescer, mas é desafiador. "Tenho conversado com nossos clientes e todos demonstram preocupação com nível de atividade econômica, com falta de clientes dentro da loja", afirma. O empresário acredita em pequeno aumento do faturamento neste ano, o que será positivo no cenário atual, apostando em um último trimestre mais favorável para o consumo, à medida que as incertezas no quadro político e econômico se dissipem.

Eduardo Mazurkyewistz, diretor da fabricante de papelão Mazurky, comemora ter apostado nas vendas de embalagens para os setores farmacêutico e alimentício. "Temos uma série de concorrentes com dificuldades por estarem mais focados no setor de bens duráveis, que vai mal", diz. A expedição total de papel ondulado, segundo a associação de empresas do setor, caiu 8,19% em janeiro e fevereiro, na comparação com igual período de 2014, mas o primeiro bimestre da Mazurky foi bastante positivo, com crescimento de 39% das vendas em volume, na mesma comparação. "O mercado não cresce, mas temos conseguido ganhar clientes da concorrência, abrir novas contas, com investimento relativamente alto em marketing", diz Mazurkyewistz.

O diretor prevê continuidade do bom ritmo de expansão das atividades da empresa ao longo do ano, ainda que menos forte, já que a empresa deve reajustar preços em abril, após aumento de 10% dos fornecedores em março. "Tivemos aumento de custos com frete, energia, dissídios, não tem como absorver esse reajuste na nossa margem", avalia.

O economista Simão Silber, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP, diz que as estatísticas demoram um pouco para refletir a retração da economia. "Há uma piora gradual nas últimas estimativas do Focus sobre PIB e produção industrial ao fim do ano, o que também revela que a atividade não anda bem."

Aloisio Campelo, coordenador do Ibre-FGV, ressalta que os índices não dão sinais de melhora e ainda apontam intenção generalizada das empresas de demitir, "algo bem raro de acontecer".