O desemprego segue ganhando força no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgado ontem pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), foram eliminadas 2.415 vagas com carteira assinada em fevereiro. O pior desempenho para o mês, em 16 anos. Essa é a terceira queda seguida no índice. No acumulado dos últimos 12 meses, houve redução de 47.228 empregos (- 0,11%).
É a primeira vez na série histórica, iniciada em 1999, que o número fica negativo nesses dois itens. Somados janeiro e fevereiro, temos um saldo de 84 mil demissões. O primeiro bimestre de 2015 só não foi pior que 1999, com 92 mil cortes, e 2009, ano da crise financeira mundial, com 92, 5 mil. O resultado desanimou até mesmo o ministro do Trabalho, Manoel Dias: “Não foi bom porque queremos geração de empregos”. Entre os oito setores analisados, cinco registraram queda. As mais acentuadas foram no comércio, com o fechamento de 30.354 postos; e na construção civil, que perdeu 25.823.
O ministro explicou o desempenho do setor de construção como “efeitos da Operação Lava-Jato”. Para ele, o estado do Rio de Janeiro, com o maior número de demissões no país (-11.101), foi o principal prejudicado com as repercussões da investigação da Polícia Federal. Ao contrário de outros anos, o ministro não quis fazer uma projeção para 2015. “É impossível hoje fazer uma previsão. É preciso ver como será o primeiro semestre. O aumento do dólar vai beneficiar o mercado de trabalho”, afirmou. Dias citou como exemplo a indústria de transformação “que vinha demitindo e criou 2 mil postos”. Esse segmento, no entanto, no mesmo período do ano passado criou 52 mil vagas, de acordo com os dados do Caged. Ano difícil Para especialistas, o fechamento de vagas com carteira assinada deve se manter este ano.
O professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) Carlos Alberto Ramos acredita que o único setor que será favorecido pela taxa de câmbio é o da indústria de produtos alimentícios, “mas isso não significa que o emprego crescerá”. Ele não vê condições de crescimento por causa da queda da demanda, da redução do poder de compra dos salários e do aumento do endividamento das famílias. “Já tínhamos setores penalizados e, agora, comércio e serviços começam a mostrar fraqueza.” Ramos lembra que a incerteza sobre a capacidade de se manter empregado retrai o consumo. “Além disso, o problema é estrutural: inflação em alta, taxa de juros crescente, falta de confiança, economia internacional ainda fraca, tudo isso contribui para que o quadro se deteriore”, conclui.
Rafael Bacioti, economista da Tendências Consultoria, explica que há perspectiva de contração da economia de 1% a 2% neste ano. Para ele, as repercussões da Operação Lava-Jato, do choque tarifário e de uma falta de energia em indústrias podem “ampliar a cautela das empresas na hora da contratação e, com isso, amplificar o desemprego. Em nota, a Fator Corretora chama atenção para a redução da renda no país. Na análise da corretora, s dados demonstram redução no salário de novas contratações, revertendo a trajetória que vigorava até meados de 2012.
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Conseguir trabalho está mais difícil
Sem emprego desde dezembro, o montador de móveis Jailson Rodrigues, 30 anos, considera que 2015 está sendo o ano mais difícil dos 15 em que está no mercado de trabalho. “Até 2014, eu saía de uma loja e já conseguia vaga em outra”, lembra. Para ele, o problema é que, como as pessoas estão consumindo menos, o comércio acaba tendo que diminuir o número de funcionários. “Tem muitas lojas cortando pessoal, algumas em que eu trabalhei já até fecharam as portas”, conta. Quem também está tendo dificuldades é Adeilson Gouvea, 34, que passou a manhã de ontem procurando emprego pelo DF — esteve em Águas Claras, Guará e Taguatinga.
A última parada do dia foi na Agência do Trabalhador, no Setor Comercial Sul, onde pelo menos outras 10 pessoas esperavam por uma boa notícia. “Vim atualizar o cadastro, ver se tem alguma vaga, porque já tem muito tempo que não recebo nenhuma ligação daqui”, disse ele, que nos últimos cinco anos trabalhou na área de construção civil. “Essa é a pior fase desde que entrei no ramo. A situação está feia”, acredita. Até o ano passado, achava fácil encontrar emprego; bastava procurar diretamente nas construções ou pedir indicação para os amigos. “Agora, os que me indicavam também estão sem serviço”, disse. A situação fica ainda pior para quem não tem nenhum contato, só o currículo e a história de vida.
O alagoano José Flávio Cunha, 29, que veio para Brasília na expectativa de encontrar mais oportunidades, hoje está sem emprego e, pela primeira vez, sem teto. Há pouco mais de um mês na capital, onde ele não conhece ninguém, conta quase 10 passagens por agências de trabalho e várias recusas por parte das empresas. “As exigências são absurdas. Esses dias tive que pedir dinheiro na rua para imprimir um novo currículo, porque precisava ter foto. Eu não queria ter que pedir, ninguém gosta de estar nessa situação, mas não tenho alternativa”, desabafou, indignado. Desde os 14 anos, Cunha trabalhou, principalmente, na construção civil, mas também tem experiência no comércio.
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