Após enfrentar uma série de derrotas no Congresso e ver até sindicatos ligados ao PT atacarem o ajuste fiscal do governo, o Palácio do Planalto passou o dia ontem fazendo afagos no PMDB para tentar romper o isolamento político e aprovar duas medidas provisórias que reduzem direitos trabalhistas e previdenciários, sem que o Congresso desfigure seu conteúdo. Em nome do reequilíbrio das contas públicas, os ministros Aloizio Mercadante (Casa Civil), Pepe Vargas (Relações Institucionais) e a equipe econômica tiveram uma série de encontros com os principais dirigentes do partido. Peemedebistas já admitem apoio ao ajuste fiscal, mas cobram envolvimento do PT para não carregarem sozinhos o ônus da medida impopular.

Mercadante foi à residência oficial do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), enquanto Pepe Vargas encontrou-se com o líder do PMDB na Casa, Leonardo Picciani (PMDB-RJ). Mas foi à noite que ocorreu o principal encontro do dia, quando toda a equipe econômica - Joaquim Levy (Fazenda), Nelson Barbosa (Planejamento) e Alexandre Tombini (Banco Central) - foi com Mercadante ao Palácio do Jaburu, residência oficial do vice Michel Temer, para explicar o ajuste a ministros, dirigentes e parlamentares do PMDB.

Após receber no fim da tarde o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), o vice Michel Temer já afirmava que o governo "seguramente" poderia contar com o PMDB na votação do ajuste fiscal.

- É o primeiro passo para que o ajuste fiscal possa ser vitorioso no Congresso. É preciso começar o diálogo e começar pela área econômica. O ministro Levy prontamente atendeu ao meu convite - disse Temer, ressaltando que é preciso focar no diálogo no Congresso: - Quem dá a última palavra em matéria legislativa é o Congresso. Vai haver um ajustamento. Não tenho dúvida disso.

Peemedebistas cobram compromisso do PT

Visto durante muito tempo como inimigo pelo governo, Eduardo Cunha ressaltou após o almoço com Mercadante a necessidade de o governo articular sua base aliada para assegurar que as medidas não sejam desfiguradas. Segundo o presidente da Câmara, o ministro da Casa Civil ligou para ele antes do Carnaval pedindo uma conversa. O Palácio do Planalto apoiou a candidatura do deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) para a presidência da Câmara e agora tenta recompor a relação.

- Foi um diálogo normal, debatemos a pauta, o ajuste fiscal, pacto federativo, Lei de Licitações. O governo tem duas medidas provisórias que demandam articulação com a base, senão correm o risco de serem emendadas e desfiguradas - afirmou Cunha.

Com o PT contestando o ajuste fiscal, cresceu a dependência do governo em relação ao PMDB. Deputados e senadores petistas apresentaram emendas que alteram o cerne das MPs que endurecem as regras de acesso a benefícios como o seguro-desemprego. Com a baixa popularidade do governo Dilma, o PT não quer comprar briga com o movimento sindical, que compõe sua base.

Peemedebistas, no entanto, dizem que não é hora de "jogar para a plateia". Afirmam que o PMDB apoiou o Plano Real; viabilizou a aprovação, no fim do ano passado, de manobra fiscal que permitiu ao governo fechar suas contas; e não colocará em risco a estabilidade econômica. Mas os peemedebistas defendem que o governo trate de convencer os demais partidos, especialmente o PT, se quiser aprovar as medidas.

- Não se pode deixar o custo do ajuste para o PMDB. O PT não assume, posa de defensor dos direitos dos trabalhadores e deixa para o PMDB resolver e sofrer o desgaste sozinho. É preciso deixar claro que o ajuste é do governo - afirmou um cacique peemedebista.

Remédio amargo exige diagnóstico certo

Além do ajuste fiscal, existem outras pautas-bomba para o governo no Congresso. Mais do que nunca, será necessário o apoio do PMDB. Embora a negociação ainda não esteja nessa etapa, os próprios peemedebistas já admitem que devem cobrar maior participação no governo assim que o Planalto abrir as conversas sobre o preenchimento dos cargos de segundo escalão.

O líder do PMDB na Câmara afirmou que, para apoiar as medidas impopulares, espera que o ministro da Fazenda aponte perspectiva de melhora do cenário econômico.

- Quando se propõe o uso de um remédio amargo é preciso dar uma perspectiva de melhora no futuro para se convencer politicamente. Vamos receber as matérias e discuti-las, mas ainda não avaliamos o mérito. Essa é apenas uma ação informativa que ajudará na construção do processo, mas sem chance de arrancarem um compromisso - afirmou Picciani.