CURITIBA

Em depoimento de três horas à Polícia Federal em Curitiba, onde está preso desde quarta-feira, Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional da Petrobras, disse ontem que o lobista Fernando Baiano, operador do PMDB no escândalo da Petrobras, atuava nas diretorias de Abastecimento e de Gás e Energia da estatal. A diretoria de Abastecimento foi comandada entre 2004 e 2012 por Paulo Roberto Costa, outro réu na Lava-Jato. Já a área de Gás e Energia teve como diretores Ildo Sauer, entre 2003 e 2007, e a atual presidente da estatal, Graça Foster, de 2007 a 2012.

No depoimento, Cerveró disse que conheceu Fernando Baiano em 2000, durante a crise energética daquele ano. Segundo ele, Baiano intermediou um contrato de assistência técnica entre a Petrobras e espanhola Union Fenosa, de assistência técnica para termelétricas. Depois disso, segundo Cerveró, o lobista "continuou frequentando a Petrobras representando outras empresas, tendo se dirigido a outras diretorias, como a Diretoria de Abastecimento e a de Gás e Energia". Cerveró não especificou em que período isso ocorreu.

O ex-diretor negou ter sido beneficiado por propina, e disse que não tem contas e empresas no exterior. Também negou ter recebido propina de Fernando Baiano, mas deu detalhes da aquisição e locação de sondas pela estatal, que passava pela criação de subsidiárias no exterior destinadas a comprar e alugar navios-sondas para a própria Petrobras. No depoimento do ex-diretor foi mencionada não só a Mitsui, do consultor Júlio Camargo, mas também a Schahin, empresa próxima do petista João Vaccari Neto.

Locação de navios-sonda

Em nenhum momento do depoimento, os delegados da PF perguntaram se esse esquema de criação de subsidiárias facilitava o desvio de recursos da estatal. Camargo, que assinou acordo de delação premiada, informou ter pago propinas para a Fernando Baiano em duas negociações de sondas, e indicou contas onde depositou o dinheiro no exterior.

Segundo Cerveró, a Mitsui foi transformada em sócia da Petrobras numa subsidiária criada fora do Brasil, e passou a alugar sondas para a própria Petrobras. O mesmo modelo de negócio, afirmou ele, foi montado para a produção e locação de navios-sonda para a estatal utilizar em seus campos de perfuração na África. Nesse caso, o navio-sonda seria feito pela Samsung, mas a empresa criada no exterior para alugar a sonda para a Petrobras foi uma uma associação entre o Grupo Schahin e a Petrobras.

Esta não é a primeira vez que o Grupo Schahin é citado na Operação Lava-Jato. A Schahin teria sido alvo de uma "troca" de créditos de propina relatada ao Ministério Público por Pedro Barusco Filho, ex-gerente do setor de Engenharia, comandado por Renato Duque. Barusco teria dinheiro a receber da Schahin. Vaccari Neto teria dinheiro a receber de outra empresa. Para facilitar, eles teriam trocado os "créditos".

Cerveró comandou a diretoria internacional até 2008 e afirmou que todas as aquisições de equipamentos, construção de refinarias e de gasoduto passavam pela aprovação de toda a diretoria executiva, formada por seis diretores e pelo presidente da estatal. No depoimento, prestado a quatro delegados da PF, dois deles de Curitiba, nada foi perguntado sobre a refinaria de Pasadena, nos EUA. Segundo seu advogado, Beno Brandão, a compra da refinaria no Texas será tema de um novo depoimento, ainda sem data definida, pois a PF ainda analisa documentos relativos ao negócio.

Ainda ontem, a Petrobras pediu acesso aos processos que envolvem Cerveró, e obteve autorização da Justiça.

movimentações financeiras

Cerveró também disse à PF que se viu obrigado a fazer movimentações financeiras porque ganhava R$ 100 mil por mês até março do ano passado, quando foi demitido do cargo de diretor financeiro da BR Distribuidora, e está desempregado desde então. Agora, segundo ele, ganha R$ 10 mil de aposentadoria e R$ 5 mil do aluguel de um apartamento em Ipanema. As movimentações financeiras, afirmou, foram necessárias. Ele disse que, por causa dos altos impostos, não chegou a sacar quase R$ 500 mil de um fundo de previdência para repassar o dinheiro à filha, Raquel Cerveró.

Essas movimentações o levaram à prisão. Os procuradores suspeitam que o ex-diretor tenha tentado ocultar os bens par impedir futuros arrestos.

Cerveró confirmou a compra dos imóveis, iniciadas em 2003, e disse que elas são fruto de herança e do rendimento dele como executivo da Petrobras. Confirmou ter morado num apartamento avaliado em R$ 7,5 milhões que pertence à offshore Jomey, mas afirmou que é apenas locatário. Sua defesa fez ontem um pedido de habeas corpus.