Título: Trágica estatística
Autor: Torres, Izabelle
Fonte: Correio Braziliense, 24/07/2011, Política, p. 2/3

Às margens da AL-101 Sul, cerca de 160 famílias convivem com carros e caminhões e contabilizam mortos. Na família de Maria José Vieira, 50 anos, já são três nos últimos quatro anos. Ela vive na área há 20 anos e perdeu o marido, o enteado e o cunhado atropelados. Mesmos assim, insiste em ficar e criar os filhos no lugar em que a morte parece ser companheira. Aposentada, veio com a família do município de Jequiá da Praia, distante 86km da capital alagoana, para tentar uma vida melhor. Construíram uma casa de adobe e lá vivem até hoje. Ela é uma das que deve receber R$ 2.400 do Departamento de Estradas e Rodagens (DER) para desocupar a área para a duplicação da rodovia. O governo deve pagar a mesma quantia a quase 200 famílias.

Quem mora na margem da rodovia costuma lembrar de tragédias. O caso da menina Eduarda, de oito anos, ocorrido no final de 2010, é um dos mais comoventes. O pai, Edivan Severiano, 40 anos, viu quando a filha desceu do ônibus e foi atingida por um carro em alta velocidade. A garota morreu na hora. O caso chocou gente como Eriene dos Santos, 31, que tem um bebê de um ano e meio. Mesmo assim, ela diz que prefere o risco a ser transferida para um barraco de lona oferecido pelo governo estadual.

A estrada que leva ao litoral sul de Alagoas também conta com histórias que, de tão comuns, até parecem fazer ser normais para quem vive no local. Maria dos Anjos, 67 anos, acha que ninguém vai poder tirá-la da casa onde mora, pois ela foi "comprada". Localizada a menos de 5m do acostamento, ela pagou R$ 2 mil economizados durante anos para ganhar a tranquilidade de não ser retirada. "Juntei meu dinheiro e comprei esse lote onde vivemos. Estamos bem, apesar da falta de estrutura. Pelo menos vivo em uma coisa que é minha", diz, enquanto a filha Maria da Silva a ampara para sentar-se na cadeira em frente de casa, onde costuma passar as tardes. (it)