O anúncio feito ainda no final de novembro, pelo ministro indicado Joaquim Levy, de um superávit primário em 2015 de 1,2% do PIB pareceu razoável. Àquela altura, com a economia em desaceleração e a perspectiva de um resultado nulo no exercício, no encontro de contas entre despesas e receitas públicas, exceto juros, um superávit pouco acima de 1% em 2015 era meta alcançável, apesar das dificuldades para tal.

Mas a situação fiscal era mais grave do que aparentava. Sabia-se que nada seria, e não será, fácil, porque o primeiro governo Dilma transitou sob a égide da “contabilidade criativa”, técnica de ilusionismo estatístico desenvolvida na Secretaria do Tesouro de Arno Augustin, sob o ministro da Fazenda Guido Mantega. Porém, quando vieram os números de 2014, ficou evidente que obter o 1,2% do PIB de economia nas contas públicas, para abater da despesa com juros, se tornara uma tarefa ainda mais desafiadora.

O alvo de 1,2% do PIB considerava uma frustração de receita em 2014 de R$ 43,7 bilhões, mas ela atingiu R$ 65 bilhões. Longe de acabar o ano passado no zero a zero ou algo próximo disso, as contas públicas consolidadas acumularam um déficit primário de 0,63% do PIB — desde 1997 não houvera um resultado no vermelho por esse critério.

Assim, a nova equipe econômica começou a sua administração já “em dívida”. Ou seja, para obter o mesmo saldo fiscal, a meta de 1,2% terá de aumentar para 1,8% do PIB. Será difícil.

Há, ainda, o imponderável, derivado da aplicação da “contabilidade criativa” e sua capacidade de montar esqueletos fiscais no armário da contabilidade pública, para surpreender os governantes mais à frente. Uma forma de escamotear despesas foi jogá-las sempre para frente, por meio das ditas “pedaladas”.

No final de janeiro, o jornal “Valor Econômico” informou que auditores do Tribunal de Contas da União (TCU) detectaram R$ 40 bilhões não devidamente inscritos na dívida pública, cifra proveniente de débitos do Tesouro com o BNDES, Banco do Brasil e FGTS. Na prática, bancos públicos financiaram o Tesouro, algo proibido pela Lei de Responsabilidade Fiscal. E R$ 40 bilhões equivalem a mais da metade da meta de superávit para este ano.

Economistas da Fundação Getúlio Vargas, por sua vez, se depararam com R$ 35 bilhões de dívidas cruzadas entre estatais, insumo clássico para a confecção de esqueletos fiscais. Voltou a existir, em alguma dimensão, aquele novelo de dívidas no setor público que exigiu muito esforço para ser eliminado depois do Plano Real e com o fim da superinflação. Além de administrar o caixa no dia a dia, a equipe econômica tem de vasculhar gavetas e armários em busca dessas bombas-relógio. Mas não há alternativa a não ser perseverar e também cumprir a promessa de transparência absoluta na administração da economia. Ainda há chance de o país se livrar do rebaixamento da sua nota de risco.