Título: Crises afetam nomeações
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Correio Braziliense, 31/07/2011, Política, p. 6
Escândalos levam Dilma a aumentar a cautela nas indicações ao segundo escalão, para desespero dos aliados, de olho em 300 cargos
Os recentes escândalos de corrupção no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), na Valec e, agora, na Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), reforçaram a cautela da presidente Dilma Rousseff em nomear os integrantes do segundo escalão da máquina pública federal. Por consequência, aumentou o desespero dos partidos aliados, ansiosos para indicar os afilhados nos estados e nos municípios. Os comandantes partidários querem nomes políticos para agradar os prefeitos e aumentar as chances de êxito nas eleições municipais de 2012. Mas Dilma quer nomes técnicos, que saibam conduzir os projetos que considera prioritários para o país.
Existem cerca de 300 cargos em aberto. A maior parte deles é reivindicada pelo PT. Há mais de um mês, o presidente nacional da sigla, deputado estadual Rui Falcão (SP), apresentou à Casa Civil uma lista com 104 nomes para integrar o segundo escalão. Logo depois, aparece o PMDB, que está de olho em 50 postos na administração federal. Os aliados têm preferências por vagas ligadas ao setor elétrico ou em ministérios que tenham bons orçamentos para obras de infraestrutura ¿ justamente as áreas nas quais Dilma reforçou seu olhar crítico em busca de irregularidades ou suspeitas de corrupção. "Os aliados estão tímidos para pressionar a presidente diante de tudo o que está acontecendo no Dnit e na Conab", reconheceu um assessor governista.
No caso dos Transportes, já ocorreram mais de 20 exonerações desde o início da crise, com a denúncia de superfaturamento em obras e cobrança de aditivos para rechear os cofres partidários do PR. Na semana que passou, a tempestade deslocou-se para a Conab, com a exoneração do então diretor-finaceiro Oscar Jucá Neto, o Juquinha, acusado de autorizar ¿ supostamente sem o conhecimento do ministro da Agricultura, Wagner Rossi ¿ o pagamento de R$ 8 milhões a uma empresa de armazenagem chamada Renascença.
Jucá Neto deu entrevista à revista Veja deste fim de semana afirmando que existe um conluio entre PTB e PMDB na pasta, e que a relação entre o seu irmão ¿ o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR) e o vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP), responsável pela indicação de Rossi para o Ministério ¿ é péssima. Além disso, apontou um esquema suspeito de pagamento do ministério para a empresa Caramuru, uma das maiores fabricantes de alimentos do país.
Rossi divulgou nota negando irregularidades na pasta e afirmou que o ressarcimento de dívidas com a Caramuru faz parte de um processo judicial transitado em julgado e que o pagamento "respeitará a decisão do juiz e não aquilo que um diretor da Conab, qualquer que seja ele, acredite ser possível fazer". Jucá também passou o sábado desfazendo o constrangimento causado pelo irmão. Ligou para o vice-presidente Michel Temer, para a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e até para a presidente Dilma Rousseff, que estava no Rio de Janeiro participando do sorteio das eliminatórias da Copa do Mundo (leia mais no caderno Super Esportes).
"Pedaço do bolo" Para o cientista político David Fleischer, esses problemas vão se repetir sempre porque o país vive um "presidencialismo de coalizão" ¿ no caso do governo Dilma, são 14 legendas orbitando em torno do Palácio do Planalto. "Cada um deles vai querer um pedaço do bolo. E os pedaços mais atraentes são aqueles com mais recursos, como Transportes, Cidades e Turismo", declarou o cientista político.
Fleischer cita o exemplo de outros países, onde as indicações políticas para os cargos do segundo escalão são bem mais reduzidas. "Nos Estados Unidos, quando algum senador ou deputado resolve assumir um cargo no governo, tem de renunciar ao mandato. Na Inglaterra, apenas o ministro e o secretário executivo de um ministério são indicados politicamente. Os demais escalões são preenchidos exclusivamente por funcionários de carreira." Ele destaca outra diferença básica: "No exterior, flagras de corrupção levam à cadeia. Aqui, no máximo, provocam manchetes de jornais".
Em disputa
Saiba o que está em jogo na briga pelos cargos » 70% dos cargos do segundo e do terceiro escalões estão nas mãos do PT
São 300 vagas » Os salários variam de R$ 8 mil a R$ 12,7 mil, em valores brutos
Áreas de interesse: » Especialmente os ministérios ligados ao setor de infraestrutura (Transportes, Energia e Integração Nacional, além de Agricultura e do Incra) e diretorias de bancos públicos
Agências reguladoras » Aliados já sabem que Dilma não abre mão de nomes técnicos
Principais interessados » PT e PMDB. Os petistas apresentaram uma lista com 104 nomes. Já o PMDB, outros 50