Título: Crise lá fora exige atenção ao investir
Autor: D"angelo, Ana ; Monteiro, Fábio
Fonte: Correio Braziliense, 31/07/2011, Economia, p. 14/15

Ambiente de incertezas impõe desafio aos aplicadores no Brasil. É preciso cuidado para não perder dinheiro

No atual clima de incertezas que assolou as economias dos dois lados do Atlântico ¿ Estados Unidos e Europa ¿, os investidores e consumidores andam se debatendo em dúvidas para proteger o patrimônio e manter o poder de compra. A situação anda tão complicada que mesmo analistas experientes se mostram reticentes em dar conselhos sobre o que fazer com o dinheiro neste momento. Para acalmar os ânimos, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, assegura: "Estamos tomando as medidas necessárias para que a dona Maria tenha a garantia de uma economia saudável nos próximos seis, 12, 18 meses". A promessa vale tanto para a inflação quanto para o dólar, que está perigosamente desvalorizado em relação ao real.

Ainda que o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, anuncie um acordo com o Congresso para aumentar o teto da dívida do país e afaste o risco de um calote, a economia norte-americana continuará cambaleante. Na Europa, países como a Grécia e a Espanha enfrentam sérias dificuldades, que podem solapar a Itália, a terceira potência da região. Na China, o risco é de haver um tranco no crescimento para conter a inflação. "O quadro externo está tão conturbado, que o melhor, neste momento, é ter cautela", afirma Márcio Cardoso, diretor da Título Corretora. "Hoje, é difícil afirmar quando essas incertezas mundiais vão passar", observa o diretor de Investimentos da Corretora Franklin Templeton no Brasil, Frederico Sampaio.

Mesmo no cenário interno, o horizonte não é dos mais claros. Tanto que o Comitê de Política Monetária (Copom) já indicou que o processo de alta da taxa básica de juros (Selic), de 12,50% ao ano, chegou ao fim. "É em momentos como esse que a ajuda de um profissional competente ganha relevância para ajudar os investidores a encontrar as melhores oportunidades de ganho", acrescenta Wagner Caetano, analista do mercado financeiro.

Para os especialistas, mesmo com a interrupção da alta da Selic, as aplicações em títulos do governo permanecem atraentes assim como os fundos de renda fixa, os certificados de depósito bancário (CDBs) e a tradicional caderneta de poupança. Já a bolsa de valores brasileira está no menor nível desde maio do ano passado, amargando queda de 15,1% ao ano, depois de fechar 2010 com apenas 1% de ganho. Para quem está de olho no mercado de ações, pode ser um momento de compra. Muitos papéis estão sendo negociados como verdadeiras pechinchas. Mas, como qualquer investimento de risco, é preciso ter sangue frio para esperar o retorno a longo prazo. Dificilmente a bolsa oferecerá lucros expressivos nos próximos meses.

Importados Cardoso é taxativo: "Com os juros dos títulos públicos em 12,50% anuais, o investimento em bolsa está brigando contra um leão poderoso e quase sem risco". O analista está coberto de razão. Mas antes de tirar qualquer centavo do bolso para ir ao mercado financeiro, ensina o consultor financeiro José Kobori, professor do instituto Ibmec, é preciso que cada investidor defina o seu perfil, se é mais arrojado ou mais conservador. E vai além: é preciso estabelecer o prazo que poderá ficar com os recursos aplicados. O dinheiro do dia a dia jamais deve ir para ativos de risco, como ações ¿ nesse caso, o prejuízo é certo.

Cuidado também é recomendado aos consumidores, principalmente os das classes C e D, que ainda precisam satisfazer necessidades reprimidas ao longo de anos. O crédito está caro e a renda não deve continuar aumentando na velocidade dos últimos anos. Mas não é só. Caso o governo consiga impulsionar a cotação do dólar para além de R$ 1,60, produtos importados tenderão a ficar mais caros, principalmente eletroeletrônicos, e uma variedade de alimentos e bebidas, como massas, queijos, azeite, vinhos e alguns tipos de peixes. O governo reconhece que os importados têm ajudado a segurar a inflação. Porém, nos níveis atuais de preços, o dólar se tornou um problema para a economia.

Para Caetano, ao longo do tempo, o real supervalorizado se torna uma ameaça a todos. Ou seja, o país que atualmente vive uma situação de quase pleno emprego pode voltar a sofrer com uma onda de demissões. Sem poder competir com os produtos importados, empresas vão cortar vagas, a massa salarial diminuirá e o consumo ficará mais difícil. O presidente do BC afirma, porém, que não permitirá qualquer distorção da moeda norte-americana que coloque em risco os ganhos da economia brasileira.

No colchão Especialistas lembram também que é importamte ficar alerta com os investimentos em ouro, ativo que mais rendeu no ano: 14,5%. O metal já vinha de um 2010 forte, quando acumulou ganho de 30,2%. Mas o número de negócios na Bolsa de Mercadorias e de Futuros (BM&F) é quase inexpressivo. No momento, não é recomendado pelos analistas sérios, já que a alta foi motivada pelo cenário externo conturbado, que pode respirar um pouco nos próximos meses. Já o dólar deixou de ser investimento há anos. Em 2011, acumula queda de 6,7%."Acabou o tempo em que se deixava dólares debaixo do colchão. A moeda norte-americana não pode ser mais considerada um ativo", diz Cardoso. "Se eu tivesse dólares, eu os venderia imediatamente", afirma Kobori.

Poupança A tradicional caderneta de poupança não tem feito feio. Acumula ganho de 4,9% no ano, pouco abaixo da média dos fundos de renda fixa, com rendimento líquido médio de 5,2%. Ao optar por um deles, o poupador deve escolher o que cobra as menores taxas de administração; do contrário, poderá ver a poupança render mais. No geral, o custo da aplicação na renda fixa e nos fundos DI é maior para pequenas quantias. Já no Tesouro Direto, é possível comprar títulos públicos a partir de R$ 200 e garantir a rentabilidade dos fundos oferecidos pelos bancos.