Demissões à vista, inflação nas alturas, colapso da indústria e disparada do dólar. Para analistas, o Brasil vive em 2015 o período mais agudo daquela que já é considerada uma década perdida para o crescimento. A população sente no bolso os efeitos da crise na economia: da hora de abastecer o carro com o combustível mais caro, tentar negociar com o chefe um aumento do salário a ver a renda encolher diante da escalada dos preços. Em quase tudo, o cotidiano do brasileiro está mais difícil este ano.

Prestes a ver o Produto Interno Bruto (PIB) desabar pelo segundo ano consecutivo e diante do risco de o Brasil sucumbir à maior recessão em 25 anos, o governo ligou o sinal de alerta. Somando os resultados pífios alcançados desde 2011, já são cinco anos perdidos em matéria de crescimento.

E, a julgar pelas expectativas dos analistas para o futuro da economia, o risco de mais cinco anos de pibinhos é enorme. Se os prognósticos do mercado financeiro estiverem certos, a riqueza gerada por famílias e empresas deverá encolher 0,58% este ano — o pior desempenho desde 1990.

E a situação pode estar subestimada. Caso o nível das chuvas e dos reservatórios que abastecem o sistema elétrico não aumente, é praticamente certo que o país viverá um apagão tão ou ainda mais intenso que o de 2002. Só que, desta vez, além de ficarem às escuras, as famílias encarariam um intenso racionamento de água. Isso, caso ocorra, pode aumentar o tombo do PIB em três ou quatro vezes, para até 2%.

Uma ideia da dimensão da perda pode ser dada pelos números de 2009, auge da crise financeira mundial: o PIB encolheu apenas 0,3%. Não é por acaso que o economista-chefe da agência de risco Austin Rating, Alex Agostini, aposta que o Brasil perderá para a Índia, ainda em 2015, o posto de sétima maior economia do mundo.

 Essa ultrapassagem só era esperada para 2018, mas, dada a debilidade da recuperação econômica, o prazo foi antecipado. O prognóstico para os próximos anos também não é nada confortável. Analistas do Itaú Unibanco estimam que o PIB brasileiro aumentará numa média de 1,4%, a cada ano, até 2020. No mesmo período, o crescimento mundial seria2,3 vezes maior, de 3,2%. ―A gente está na contramão do mundo‖, desabafa o estrategista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno. ―Enquanto a maioria dos países está retomando o crescimento, nós enfrentamos uma recessão sem precedentes‖, diz. O diagnóstico do Palácio do Planalto é que, por mais duros que sejam os ajustes propostos pela nova equipe econômica, esses devem continuar. Prova disso é que o Banco Central (BC) não deverá recuar do aperto monetário posto em prática desde dezembro, ainda que uma alta adicional de juros possa acelerar o colapso do PIB.

No lado fiscal, o maior desafio é evitar a sangria dos cofres públicos após meia década de desequilíbrios orçamentários, marcados por períodos em que os gastos cresceram sempre acima das receitas tributárias. A avaliação dos técnicos do governo é de que a presidente Dilma Rousseff terá de se envolver pessoalmente para apaziguar os ânimos entre a base aliada e o PT. A demora em arregimentar apoios para cumprir o ajuste fiscal faz os problemas políticos prolongarem ainda mais a recessão na economia. ―Um problema puxa o outro‖, assinala uma fonte. Cada dia de atraso empurra o Brasil cada vez mais para a década perdida.

Colapso

 Não são poucos os problemas decorrentes de 10 anos de estagnação na economia. O consumo das famílias perde força e já impacta negativamente nas vendas do varejo, que desaceleram ano após ano. Já a indústria, que durante os anos 1970 e 1980 puxou o crescimento do país, empacou de vez. Entre 2011 e 2020, a produção nas fábricas deve acelerar, em média, apenas 1,24% ao ano. Isso, porém, apenas se o setor voltar a registrar bons resultados, o que só é esperado para além de 2017. O colapso da indústria se reflete na piora do mercado de trabalho, já que o setor costuma pagar os melhores salários e empregar os funcionários mais qualificados. Boa parte do menor desempenho da renda, no entanto, se deve à escalada dos preços, que sobem sem parar desde 2009.

Para este ano, por exemplo, as apostas do mercado financeiro são de que o IPCA poderá romper os 8%. Pior para o país, que tende a ficar cada vez mais próximo da década perdida. ―Se a inflação vai subindo, em algum momento, o crescimento para. A gente já viveu isso durante os anos 1980‖, explica o coordenador de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) e professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Armando Castelar Pinheiro. ―Não existe escolha entre inflação e crescimento. Uma hora, dado o patamar de preços, a coisa para. A inflação desarranja a economia e, no Brasil, onde o nível de organização já é baixo, isso é ainda pior.