Refém dos gargalos de infraestrutura, sobretudo nas rodovias que escoam a maior parte da produção nacional, o Brasil começa a enfrentar a paralisia de obras concedidas a empreiteiras envolvidas nos escândalos de corrupção da Petrobras. A duplicação e a manutenção de quatro estradas vitais para o transporte de grãos do Centro-Oeste estão nas mãos de construtoras ou companhias formadas por sócios investigados pela Operação Lava-Jato: a BR-153, a BR-163 em dois trechos, e a BR-040.

O comprometimento dessas obras de infraestrutura agrava ainda mais o quadro do país, que, em recessão, vem reduzindo sistematicamente os investimentos. O economista Claudio Porto, presidente da Macroplan,afirma que, nos últimos 10 anos, o aporte de recursos para ampliar a infraestrutura do país tem sido, em média, de 2% do Produto Interno Bruto (PIB). A meta para resolver os principais gargalos até 2017 era chegar a 3,7% e, em 2022, a 5%. "Com as empreiteiras na Lava-Jato, o objetivo de 2017 está inviabilizado. A curto prazo, teremos atrasos, porque as empresas com melhor capacidade técnica e escala de operações estão com dificuldades financeiras e com a reputação abalada", diz.

Sem crédito para tocar o empreendimento, a Galvão Engenharia desmobilizou o canteiro de obras da BR-153, com investimento previsto de R$ 4,7 bilhões para duplicação de 624,8km entre Goiás e Tocantins. O maquinário e a frota de operações para serviços ao longo da rodovia, incluindo ambulâncias e guinchos, estão encostados no canteiro de obras, 305 de 360 funcionários diretos foram demitidos e cerca de 600 colaboradores terceirizados, dispensados (leia texto abaixo). A Concessionária de Rodovias Galvão BR-153 apenas tapa buracos e recupera uma ponte em risco de desabar.

O financiamento inicial, dado antes da liberação do crédito a longo prazo - chamado empréstimo-ponte - do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), de R$ 800 milhões, não saiu. A empresa já aportou R$ 200 milhões do próprio caixa e não tem mais de onde tirar dinheiro. O BNDES não comenta o caso, mas explica que é prática, antes da realização de um leilão, divulgar as condições de seu eventual apoio aos vencedores do certame, sem que isso signifique compromisso prévio de concessão de crédito.

A Galvão Engenharia enviou uma carta para a Agência Nacional de transportes Terrestres (ANTT), responsável por controlar as concessões rodoviárias, informando que não pode tocar a obra sem a liberação do financiamento. Também informa que não conseguiu obter do BNDES qualquer justivficativa pelo o atraso e diz, textualmente, que " é possível que seja parte da reação pelas apurações realizadas no âmbito da operação Lava-Jato".

Especula-se que o BNDES esteja sem recursos para conceder o empréstimo. "Outras concessionárias já recebera o empréstimo-ponte", defende uma fonte ligada à cocessionária Galvão que preferiu se manter no anonimato. Sobre a alegação de que o contrato condiciona a concessão ao empréstimo do BNDES, a ANTT afirma que "se trata de uma suposição e a agência não entrará nesse mérito".O órgão regulador também assinala que as penalidades, em caso de não cumprimento de qualquer contrato de concessão de rodovias federais são, entre outras; advertência, multas, abertura de processo e suspensão de participação de licitações.

A concessão da BR-040 que prevê a duplicação de 936,8 km, ligando Brasília a Juiz de Fora(MG) e investimentos de R$7,92 bilhões, está a cargo da concessionária Voia 040, controlada pela Invepar, contemplada com um empréstimo-ponte do BNDES de R$965,7 milhões. Envolvida na operação Lava-Jato a OAS é acionista da Invepar. A construtora OAS foi contratada pela Via 040 para executar as obras. A empresa já deu um calote de R$130 milhões de reais ao deixar de pagar juros e dívidas que venciam em janeiro. Para a agência de classificação de risco Fitch, a empreiteira tem a situação mais complicada entre as empreiteiras envolvidas na operação Lava-Jato, com dívidas de R$2 bilhões que vencem em 2016.

A Invepar não comenta o  assunto e diz que o problema é de sua acionista. Em nota, a OAS diz que todas as operações estão sendo executadas de forma normal e no curso dos negócios. A companhia admite, contudo, que sua dívida bruta ajustada, em setembro, era de R$7,6 bilhões e o caixa, de R$1,4 bilhão. As atuais condições do mercado de crédito são adversas. "Em função disso, a OAS está conduzindo ações visando ao fortalecimento de sua liquidez, tal como um plano de desinvestimentos", explica por meio da assessoria de imprensa.

Empréstimo-ponte

Os lotes concedidos da BR 163 estão sob a responsabilidade de companhias cujos sócios estão na lista do Lava-Jato que afirmam, porém, não estar expostas. O trecho de Mato Grosso é da Concessionária Rota do Oeste (CRO) controlada pela Odebrecht Transportes (OTP) . O empreendimento prevê investimentos de R$5,5 bilhões para duplicação de um trecho de 850,9 km. A empresa recebeu um empréstimo-ponte de R$762 milhões do BNDES e enquadrou o financiamento a longo prazo, de R$ 2,2 bilhões ainda em 2014.

Por meio da assessoria de imprensa , a CRO explica que "as obras de transformação da BR 163 prosseguem normalmente". A CRO esclarece ainda que "as investigações não têm relação com o processo da concessão da BR163".

O trecho de Mato grosso do Sul está a cargo da MS Via, controlada pelo grupo CCR, cujos sócios são a Andrade Gutierrez e a Camargo Correia, ambas citadas no Lava-Jato. Nenhuma das companhias se pronunciou sobre o assunto.