Em depoimento que durou cerca de seis horas à CPI da Petrobras, na Câmara, o ex-gerente executivo de Serviços da estatal Pedro Barusco revelou que o esquema de corrupção — com valores que chegam a R$ 10 bilhões — se institucionalizou na petroleira em 2004, durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Barusco confirmou ainda que houve repasse de US$ 300 mil da empresa holandesa SBM Offshore à campanha presidencial de Dilma Rousseff em 2010.

À CPI, Barusco contou que Renato Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobras e indicado ao cargo pelo PT, pediu ao representante da SBM, Júlio Faerman, os US$ 300 mil para reforçar o caixa da campanha eleitoral, e o dinheiro foi repassado ao tesoureiro do PT, João Vaccari. “Não foi dado por eles diretamente, eu recebi o dinheiro e repassei num acerto de contas em outro recebimento. Foi para a campanha presidencial em 2010, na que teve José Serra e Dilma Rousseff. (A doação) foi ao PT, pelo João Vaccari Neto”, disse Barusco, sem oferecer mais detalhes de como teria funcionado a operação.

Por lei, empresas estrangeiras são proibidas de fazer doações financeiras para candidatos do sistema eleitoral brasileiro. Na declaração de prestação de contas da campanha de 2010 da presidente Dilma entregue ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), não há nenhum registro de recursos recebidos por Faerman, pela SBM Offshore ou pela Oil Drive, uma das empresas envolvidas no esquema. Procurada, a SBM Offshore afirmou que se pronunciará por meio de nota apenas hoje.

Barusco iniciou o depoimento na Câmara esclarecendo como funcionava o “mecanismo” que ele próprio, Renato Duque e João Vaccari recebiam recursos do esquema de propina da Petrobras. “O mecanismo envolvia representante da empresa (Petrobras) e próprios empresários. Eu, Duque e João Vaccari fomos protagonistas”, afirmou. O ex-gerente fez questão de frisar que não sabe se o tesoureiro depositava os recursos no exterior ou se mandava direto para o PT como doações.

O engenheiro acusou Vaccari de apontar dificuldades em receber valores de propinas. “Vaccari reclamou que estava recebendo menos.” Ele explicou que a troca de uma empresa por outra ocorreu por causa da dificuldade em pegar o dinheiro. “Gostaria de esclarecer essa questão de que acusei o PT de ter recebido US$ 200 milhões. O que eu disse é uma estimava que o PT pode ter recebido. Se eu recebi, por que ele não poderia ter recebido? Cabia a mim uma quantia e cabia ao PT o dobro dessa quantia. Se foi doação oficial, eu não sei. Tinha uma quantia de reserva para o PT receber. E eu tenho conhecimento do que eu recebi.”

Orçamento

Barusco afirmou que os gerentes e diretores tinham conhecimento do cartel das empreiteiras para elevar o preço das licitações. “Havia um aquecimento de mercado, muita obra, e se colocou o pacote da Abreu e Lima no mercado. Tanto que a primeira licitação foi cancelada primariamente. Foi muito difícil negociar com a licitação para trazer os preços para dentro da margem. A gente sentiu a ação do cartel. Quando chegou ao Comperj, a mesma coisa. As empresas vieram com preços absurdos, tipo o dobro. Até que demorou um ano para chegar e sentimos uma ação muito forte do cartel.”

“A Petrobras tinha costume de fechar contrato entre 85 e 120, se o orçamento era 100. Mas o cartel trabalhou fortemente para levar para um limite ainda superior. “A gente começa a receber recurso do exterior e não tem volta. Hoje em dia, com a transparência, é um caminho sem volta. No início, tem uma fase feliz, depois vem o temor. Sinto-me feliz em repatriar”, afirmou. Barusco contou que as obras eram orçadas em 20% acima do valor. “Se o orçamento era 100, a Petrobras tinha costume de fechar contrato entre 85 e 120. Mas o cartel trabalhou fortemente para levar para um limite ainda maior”, disse.

Por nota, a Secretaria Nacional de Finanças do PT esclareceu que Vaccari, tesoureiro do PT desde 2010, “nunca tratou de finanças ou doações para o partido com Pedro Barusco, delator que busca agora o perdão judicial envolvendo outras pessoas em seus malfeitos”. “Barusco não apresentou nenhuma prova ou mesmo indício que ligue o secretário João Vaccari ao recebimento de propinas, apesar de falar por mais de cinco horas e ser reiteradamente questionado pelos integrantes da bancada do PT, e por deputados de outros partidos”, afirmou o texto assinado pelo presidente do PT, Rui Falcão. Na nota, o partido informou que processa Barusco e alegou que só recebe doações “dentro dos parâmetros legais”.

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Acostumado à corrupção 

Funcionário de carreira da Petrobras desde 1979, o engenheiro Pedro Barusco conquistou o primeiro cargo de gerência na estatal em 1985, apenas seis anos depois de ingressar na petroleira. Em depoimento, que durou cerca de seis horas, prestado aos parlamentares da CPI da Petrobras, ontem, na Câmara, o ex-gerente executivo da diretoria de Serviços — considerado braço direito do exdiretor Renato Duque — contou ter chegado à gerência por mérito próprio e negou ter recebido indicações políticas.

Barusco afirma ser o responsável por criar a Sete Brasil, empresa que venceu licitações para executar 28 contratos de construção de sondas de perfuração da Petrobras. O engenheiro orgulha- se de ter construído a empresa em 2011, após aposentar-se da estatal. A Sete Brasil tinha o fretamento de 29 navios-sonda para águas ultraprofundas para a estatal. Segundo a Polícia Federal, também era Barusco, o diretor de operações da Sete, o responsável pelos contratos da empresa com estaleiros, empreiteiras e agentes financeiros nacionais e internacionais.

Com contratos de longa duração, o recebimento ilegal do dinheiro ocorria de forma regular até 2003. Barusco confirmou que, nesse período, recebia quantias que variavam entre US$ 25 mil e US$ 50 mil por mês. Em 2007, foi firmado outro contrato entre a SBM e a Petrobras, desta vez para o fornecimento de um navio-plataforma chamado P57, um contrato de R$ 1,25 bilhão. Barusco era então gerente executivo de Engenharia e recebeu 1% do total entre 2007 e 2010. Ele disse que recebeu, só pelos contratos entre a Petrobras e a SBM, US$ 22 milhões entre 1997 e 2010.