A economia brasileira parou, definitivamente, em 2014, e está a caminho da recessão. Ano passado, o Produto Interno Bruto (PIB, soma de toda a renda gerada no País num período) cresceu apenas 0,1%, informou, ontem, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A queda nos investimentos foi a principal vilã da atividade econômica e o consumo das famílias, sem fôlego, não conseguiu compensar.

Em 2014, a economia viveu um quadro de "estagflação" - apesar da atividade pífia, o IPCA, índice oficial de inflação, ficou em 6,41%. Para este ano, economistas esperam retração no PIB, alta do desemprego, renda em queda e inflação ainda maior. Levantamento da Agência Estado feito com 30 analistas de mercado, após a divulgação dos dados do IBGE aponta, na média, para uma contração de um por cento na economia.

O avanço de 0,1% da economia no ano passado foi menor do que o ritmo de crescimento no número de habitantes. Com isso, o brasileiro ficou mais pobre: o PIB per capita recuou 0,7% em termos reais na passagem do ano, para R$ 27.229. Foi a primeira queda, desde 2009, auge da crise internacional.

"O nosso desafio é criar as condições para retomar o impulso que foi se enfraquecendo em 2014", disse o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, para quem as "questões" por trás da "desacelerada forte" da economia "estão sendo respondidas". "Há um esforço para que a gente veja mais para a segunda metade do ano uma recuperação do investimento", completou

Os investimentos recuaram 4,4%, ano passado, após uma alta de 6,1%, em 2013, e foram os grandes responsáveis pela estagnação. Como reflexo, a indústria recuou 1,2%, com agravamento da crise na indústria de transformação e o primeiro recuo no PIB da construção desde 2006.

Embora no campo positivo, o PIB de serviços teve o pior crescimento (0,7%), desde 1996, e o consumo das famílias (0,9%), a menor alta desde 2003, ritmo três vezes menor do que o avanço de 2013 (2,9%).

Economistas concordam que houve um esgotamento no ciclo de consumo, sobretudo de bens duráveis. Crescimento menor da renda, inflação pressionada e a elevação dos juros reduziram a disposição de consumir, segundo o IBGE - o crédito para pessoas físicas teve expansão abaixo da inflação em 2014.

O setor externo teve contribuição nula para o crescimento econômico. O quadro foi melhor do que em 2013, mas a composição da contribuição foi ruim. O dólar mais alto e a atividade mais fraca fizeram as importações caírem, enquanto o câmbio mais favorável não ajudaram as exportações.

Segundo o IBGE, a queda nas cotações de commodities, a crise econômica na Argentina e a desvalorização conjunta das moedas de vários países emergentes exportadores explicam isso.

Nem a agropecuária, motor da economia nacional, salvou a lavoura ano passado, crescendo apenas 0,4%, abaixo dos 7,9% de 2013. A desaceleração decorreu da queda de produtividade da soja, principal cultura do País. A produção cresceu 5,8%, mas a área plantada avançou em ritmo maior, o que provocou queda no rendimento médio por hectare.

BOLSA TERMINA SEMANA COM PERDA DE 3,6%
Ontem, marcou o fim de mais uma semana de perdas para a Bovespa, com investidores e operadores citando os motivos de sempre para vender ações: desconfiança com a economia e crise política. A expectativa pela divulgação do balanço da Petrobras, ainda sem data exata, permeou os negócios, enquanto Vale foi penalizada pelo recuo do minério de ferro no exterior. Nesse cenário, o Ibovespa - índice de referência da bolsa brasileira - cedeu 0,96%, aos 50.094,66 pontos, na contramão de Nova York, onde os principais índices de ações subiram. Na semana, a bolsa acumulou perda de 3,6%. No mês, o recuo acumulado é de 2,89% e, no ano, há leve alta de 0,18%.

DÓLAR 'IGNORA' E SOBE 1,51%
Ontem, o dólar voltou a registrar ganhos firmes ante o real, com os investidores de olho em Brasília. As dificuldades na relação entre o Planalto e a base aliada no Congresso voltaram a incentivar a busca pela moeda norte-americana, assim como o exterior, onde o dólar avançava ante as demais divisas. O dólar até teria motivos para recuar em função do PIB do Brasil "melhor" que o esperado. Mas os investidores se mostraram cautelosos em função do ambiente em Brasília. As notícias de que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), colocará em votação na próxima terça-feira projetos que não são de interesse do governo federal - como o que obriga a regulamentação da mudança de indexador das dívidas de Estados e municípios - ajudavam a sustentar os ganhos da moeda norte-americana. O dólar à vista negociado no balcão subiu 1,51%, aos R$ 3,236. Com isso, a divisa encerrou a semana com leve perda de 0,03%. No mês, porém, acumula ganhos de 13,31% e, no ano, avanço de 21,88%. 

Economia deu uma 'desacelerada forte' no começo do ano, diz Levy

REUTERS E AGÊNCIA ESTADO

Ministro da Fazenda afirma, no entanto, que o governo está construindo uma estratégia de retomada do crescimento e que exportações e investimentos devem ganhar fôlego ainda em 2015

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou nesta sexta-feira que não houve surpresa nos dados doProduto Interno Bruto (PIB) brasileiro referentes ao ano passado, mas que os números apontaram para um início de 2015 sem impulso na atividade doméstica.

"Vamos descobrir (adiante) que a economia deu uma desacelerada forte neste começo de ano", disse Levy a jornalistas, em entrevista para comentar os dados divulgados mais cedo pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

Segundo ele, no entanto, as questões que geravam incertezas já estão sendo respondidas. "Na medida em que a gente também vai construindo essa estratégia da retomada do crescimento, certamente a economia vai responder, porque o principal fator era a incerteza que havia na virada do ano", afirmou.

Levy repetiu que o Brasil vive um momento de transição e que os ajustes em curso na política econômica são necessários para que a confiança seja retomada e os investimentos cresçam. O ministro afirmou ainda que o real mais depreciado ajudará as exportações, beneficiando a economia brasileira à frente. Em relação aos investimentos, ele espera uma recuperação no segundo semestre deste ano.

"Começa a haver espaço para uma recuperação das exportações. No ano passado, a contribuição das importações e exportações foi neutra, uma compensou a outra. Este ano, nós esperamos que haja recuperação das exportações e que, portanto, o setor externo possa ajudar no crescimento da economia", afirmou o ministro.