Três funcionários que ocupavam cargos estratégicos no governo passado são suspeitos de grilagem de terra pública em áreas muito cobiçadas nesse tipo de crime no Distrito Federal. Dois deles trabalhavam na extinta Secretaria de Regularização de Condomínios (Sercond) e já foram indiciados: o adjunto da pasta, Fernando Negreiros, teria recebido uma caminhonete de R$ 90 mil para emitir um documento favorecendo o parcelamento irregular Mini-Chácaras, no Lago Sul. O outro funcionário não teve o nome divulgado.Em episódio diferente, um policial militar é citado em um inquérito que investiga diversas invasões em Ceilândia. Atualmente subcomandante do 11º Batalhão da PM, major Carlone Batista era gerente de condomínio na administração regional da cidade quando surgiu a ocupação Nova Jerusalém, no Sol Nascente. 


Investigações policiais descobriram o envolvimento de Fernando Negreiros, que também ocupava o cargo de secretário executivo do Grupo de Aprovação e Análises de Projetos de Parcelamentos (Grupar), e de um outro ex-servidor da Sercond no esquema de venda de lotes irregulares. Negreiros seria responsável por emitir um documento que reconhecia o Mini-Chácaras, no Lago Sul, como um parcelamento já consolidado. Em troca, teria recebido um veículo avaliado em R$ 90 mil do síndico, Ricardo Alda Lima. Esse atestado emitido pelo governo pode favorecer o condomínio no processo de regularização ou dar mais credibilidade na hora da venda. 


O síndico do Mini-Chácaras era o responsável por negociar os lotes. Em muitos casos, recebia veículos pela compra do terreno e repassava a uma agência da Cidade do Automóvel para revenda. Um deles, no entanto, foi parar nas mãos do ex-secretário. Eles tentaram passar para o nome de Negreiros, mas a tentativa foi frustrada. Por isso, usaram o outro servidor, contou o delegado-chefe da Dema, Ivan Dantas.

A Operação Revelação, desencadeada na madrugada de ontem pela Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente e à Ordem Urbanística (Dema), tinha o objetivo de investigar a participação de servidores no esquema de venda de lotes irregulares e levou os indiciados a prestarem depoimento. Eles não foram presos, mas o síndico vai responder por lavagem de dinheiro e corrupção ativa; o ex-servidor e Fernando Negreiros, por lavagem de dinheiro e corrupção passiva. De acordo com Dantas, o ex-secretário deve se apresentar em outro momento para depor.


O trabalho da polícia é uma continuação das operações Faraó 1 e 2, realizadas em 2013 (veja Memória) para buscar mais provas sobre o caso. Como as penas para os crimes ambientais são brandas, houve um aprofundamento das investigações a fim de comprovar o envolvimento deles (indiciados) em crimes mais graves. A ideia é levar a conhecimento do Ministério Público e da Justiça visando uma responsabilidade penal futura, explicou o delegado. Na época, os lotes custavam entre R$ 100 mil e R$ 120 mil. Hoje, há terrenos que valem R$ 500 mil.

Ceilândia

Pelo menos 400 barracos foram levantados em Nova Jerusalém de julho do ano passado para cá (leia mais na matéria abaixo). Moradores da região contam que parte das residências surgiu por incentivo de políticos. Outro lado teve iniciativa de grileiros. Eles parcelaram a terra e cadastraram os interessados. Eram cobrados R$ 3 mil pelo lote e, caso as construções não fossem derrubadas, os compradores teriam de pagar R$ 20 mil parcelados. 


Major Carlone, segundo alguns moradores que preferiram não se identificarem, se denomina o dono de Ceilândia e ameaça quem questiona se é ele, de fato, o proprietário da área. O policial é citado em uma investigação da Delegacial Especial de Repressão aos Crimes Contra Administração Pública (Decap), que apura as invasões na cidade. O policial nega qualquer envolvimento com grilagem e afirma que foi um dos maiores combatentes das invasões. 


Eu, um PM, fui colocado no cargo justamente para evitar esse tipo de ocorrência, garante. Ele conta que, em novembro último, liderou a derrubada de 200 casas no Trecho 2 do Sol Nascente. Muita gente ficou com raiva de mim porque eu era rigoroso nessa questão. Dei prejuízo a muito grileiro. Talvez, por isso, queiram me derrubar agora, acredita. Já houve vezes em que liderei derrubadas e diziam para mim: Não derruba que é área do Major Carlone. Falavam em meu nome, sem minha autorização.

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Invasores tomaram terrenos de famílias

Há 18 anos, 23 famílias moravam em barracos de madeirite, em condições precárias, no assentamento Santarém, emSamambaia. Depois de todo o tempo lutando por uma vida decente, o GDF cedeu 60 hectares, em Ceilândia, para receber as famílias e ali formar unidades agrícolas. Quando acharam que realizariam o sonho de ter um terreno para plantar e construir um lar, contudo, as famílias chegaram ao local destinado pelo governo e foram recebidas por grileiros. Os criminosos tomaram uma parte do terreno e deixaram o resto para os assentados.

Sem ter o que fazer, eles registraram o caso na Polícia Civil e aguardam uma resposta. Hoje, várias casas de alvenaria, idênticas, foram levantadas no local. Os moradores da antiga Santarém, agora, além de terem feito a denúncia na polícia, negociam com a Secretaria de Relações Institucionais e Sociais como se dará a derrubada das residências e a retomada do terreno para a agricultura familiar. Possivelmente, esses sejam os mesmos grileiros da Nova Jerusalém, invasão no Sol Nascente.

A ocupação pode ser demolida na próxima semana. Outra área que o GDFtem monitorado é a Quadra 702, no condomínio Pôr do Sol. Proibida a construção de casas no local, por três vezes o GDF derrubou construções naquele endereço. Os moradores, no entanto, são insistentes. Um residente da quadra, que não quis se identificar, diz que os grileiros não agem mais naquela região e critica o governo. “Compramos deles (grileiros) em 2012, mas eles sumiram e nunca mais voltaram. Gastei R$ 30 mil para comprar o lote”, diz. Segundo o morador, ele se inscreveu no programa habitacional Morar Bem, mas não pode ser beneficiado por pagar IPTUanualmente. “Comprei dos grileiros, mas pago imposto, tenho toda a documentação. Na verdade, meu imóvel não existe: o Estado derrubou”, relata.