Embora as investigações da Operação Lava-Jato já tivessem alcançado João Vaccari Neto no ano passado, a prisão do agora ex-tesoureiro do PT surpreendeu o partido. Ao receber a notícia em Brasília, o presidente da legenda, Rui Falcão, voou para São Paulo, onde se reuniu durante horas com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Saíram do encontro com a carta de afastamento de Vaccari na mão e uma série de desafios para a sigla, entre elas, como resgatar o PT dos escândalos, cerca de 10 anos depois do mensalão.

O PT decidiu, por ora, manter a defesa do ex-tesoureiro. Em um aceno a Vaccari, Lula e Falcão optaram por apresentar a carta de afastamento, e não destituí-lo do cargo. Simbolicamente, a sigla sinaliza a ele que não o abandonou. O temor entre petistas é que Vaccari abra à Polícia Federal informações sobre outros possíveis envolvidos no esquema de pagamentos de propina na Petrobras. Em nota enviada à imprensa, o PT presta solidariedade a Vaccari e à família.

O texto acrescenta que a prisão de Vaccari é “injustificada visto que, desde o início das investigações, ele sempre se colocou à disposição das autoridades para prestar qualquer esclarecimento que lhe fosse solicitado”. O PT diz ainda que reafirma a “confiança na incoerência de Vaccari”. A nota acrescenta que os advogados do ex-tesoureiro apresentaram pedido de habeas corpus. 

Agora, o PT tem em mãos outro problema para resolver: quem ocupará o cargo deixado por Vaccari. Na avaliação de parlamentares do partido, o melhor nome é o de Edinho Silva, tesoureiro da campanha da presidente Dilma Rousseff em 2014. Ele, porém, assumiu a Secretaria de Comunicação da Presidência há duas semanas. A intenção é encontrar o substituto até amanhã.

O Palácio do Planalto espera manter o caso distanciado de Dilma. O discurso é de que Vaccari era tesoureiro do partido, e não da campanha da presidente. No Congresso, parlamentares do PT se demonstraram abatidos com a notícia. Parte deles disse que não se pronunciaria, sob alegação de esperar a posição oficial do partido. Nos bastidores, congressistas admitiram que não esperavam a prisão do ex-tesoureiro e lamentaram que ele não tenha se afastado do cargo antes de as investigações avançarem, como fez Delúbio Soares quase 10 anos atrás (veja Memória abaixo).

O líder do PT na Câmara, Sibá Machado (AC), foi um dos poucos que se pronunciou. Ele usou a tribuna para criticar a prisão do colega. “Quero chamar a atenção desta Casa para o que estou chamando de arbitrariedade, que é a forma como foi feita a prisão do tesoureiro do PT. Para uma prisão preventiva, é preciso que a pessoa investigada esteja ameaçando fugir, ameaçando testemunhas ou ameaçando ela própria. Vaccari é tesoureiro do PT com endereço certo, com a vida normal dele”, discursou.

Vice-líder do PT na Câmara, o deputado Afonso Florence (PT-BA) evitou comentar avaliar a prisão do tesoureiro do partido. “Do ponto de vista partidário, vejo com reserva e naturalidade. Reserva porque penso nas famílias. O réu está dizendo que é inocente. Tem que transitar em julgado. E vejo com naturalidade porque tem tanta gente sendo envolvida na operação que ele não é o primeiro nem será o último a ser preso”, comentou o vice-líder, que é integrante da CPI da Petrobras.

No ataque
Já a oposição aproveitou para ajudar a desgastar o PT. “É algo extremamente grave e inédito na história do Brasil, e acho que de qualquer país do mundo. O homem responsável pelas finanças do partido da presidente da República está preso, com inúmeras acusações em relação à malversação de dinheiro público. O que estamos vendo é o agravamento da crise política e cada vez ela chegando mais próximo do governo e da própria presidente da República”, disse o senador Aécio Neves (PSDB-MG).

Por meio de nota, o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), disse que o PT é reincidente. “O PT não tem credenciais de partido político, e sim de lavanderia. O partido é reincidente ao ter o tesoureiro Vaccari, sucessor de Delúbio Soares, flagrado e preso por arrecadar dinheiro desviado de empresas públicas para alimentar suas campanhas e encher os bolsos de seus dirigentes”, afirmou.


Passo a passo
Entenda como ocorreu a prisão de João Vaccari Neto

1 - O então tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, foi preso pouco depois das 6h, em São Paulo. Ele não ofereceu nenhum tipo de resistência. Os agentes da Polícia Federal o algemaram

2 - Desta vez, a PF não enfrentou problema para entrar na casa do petista. Em fevereiro, Vaccari se recusou a abrir o portão da residência. Na ocasião, os agentes tiveram que pular o muro para cumprir os mandados de busca e apreensão e de condução coercitiva

3 - A Polícia Federal chegou a informar, às 8h30, que a cunhada do tesoureiro do PT, Marice Correa de Lima, havia sido presa na 12ª fase da operação. No entanto, às 10h20, a informação foi corrigida. Marice permanece foragida

4 - Havia um mandado de condução coercitiva contra a mulher do petista, Giselda Rousie de Lima, para que ela prestasse esclarecimentos na sede da Polícia Federal, em São Paulo. No entanto, ela foi ouvida por delegados na sua própria residência

5 - João Vaccari Neto foi transferido para Curitiba na noite de ontem. A previsão da Polícia Federal é de que ele preste depoimento aos delegados da força-tarefa na tarde de hoje


Memória




A queda de Delúbio
Em julho de 2005, outro tesoureiro do PT pedia afastamento do cargo por denúncias de corrupção. Em meio às primeiras informações sobre o mensalão, Delúbio Soares decidiu se afastar da tesouraria da legenda sob alegação de preparar a defesa e provar a inocência no caso. Na época, o então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) acusou Delúbio de ser um dos cabeças do esquema de “mesada” a parlamentares da base aliada do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Jefferson alegava ainda que o então tesoureiro tinha um operador para a distribuição do dinheiro: o publicitário Marcos Valério. Diferentemente de João Vaccari Neto, Delúbio não esperou as investigações avançarem para deixar o cargo. Em outubro de 2005, três meses depois de pedir afastamento do cargo de tesoureiro do PT, ele foi expulso do partido. Em 2011, ele foi admitido de volta à legenda. É reconhecido entre os companheiros pela fidelidade ao partido e aos líderes petistas.

O ex-tesoureiro acabou condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2012, a 6 anos e 8 meses de prisão por corrupção ativa. Ele foi preso em novembro de 2013 e, no fim do ano passado, conseguiu progressão de regime. Hoje, cumpre pena em prisão domiciliar.