O Banco Central adotou ontem (26) pela primeira vez números que o mercado já usa há algum tempo: a inflação de 2015 vai estourar o teto da meta. A projeção é que o IPCA feche este ano em 7,9%, bem acima do limite máximo determinado, de 6,5%. O pior é que o risco de o teto da meta ser ultrapassado, pelos próprios cálculos do BC, é de 90%. A inflação deste ano, portanto, deve ser a maior em 12 anos.

Dado o cenário perdido para o combate à alta dos preços em 2015, não resta outra saída ao BC senão mirar 2016. A promessa de entregar o IPCA na meta de 4,5% foi repetida ontem, apesar da desconfiança do mercado financeiro. “É um dever que temos com a sociedade brasileira”, disse o diretor de Política Econômica do Banco Central, Luiz Awazu Pereira da Silva.

Pelos cálculos do BC, a taxa de 2016 ficará em 4,9%, mas Awazu admitiu não estar satisfeito com a projeção. “Estamos com política monetária que é vigilante, está vigilante e se manterá vigilante para esse objetivo (atingir 4,5% de IPCA)”, declarou. Segundo ele, essa postura do BC é a principal mensagem a ser passada no Relatório Trimestral de Inflação divulgado ontem. O curioso é que a expressão, que constava na edição de dezembro, foi retirada do documento atual e só foi comentada na entrevista do diretor para explicar as novas projeções.

O mercado viu no documento um BC “mais suave” nas suas projeções. Os analistas do setor privado acreditam que o índice do ano que vem será de 5,6%, bem mais alto do que o do BC. O grande trabalho da instituição agora é domar as expectativas, que também são fonte importante de pressão sobre os preços. A avaliação é a de que, apesar de já mostrarem alguma redução no médio prazo, as estimativas ainda não baixaram o suficiente. “Temos reiterado que o papel da política monetária é circunscrever os efeitos para 2015 e impedir que extrapolem para 2016.”

Câmbio

Para a diretoria do BC, o dólar alto muda vários pontos da economia, mas não chegará a ser um problema tão grande para a inflação, apesar de já ser constatado um realinhamento de preços domésticos em relação aos externos, porque o repasse da alta do dólar tem sido menor.

Contestada por agentes do setor privado, esse é o mais recente dogma que o BC quer passar. Tanto que deu ênfase ao tema, tratando-o de forma isolada no relatório. O cenário favorável dos preços das commodities, segundo o BC, deve reduzir à metade o repasse cambial, ajudando a tarefa do BC na convergência do IPCA para o centro da meta em 2016. O documento não traz números, mas o presidente do BC, Alexandre Tombini, disse esta semana que essa contaminação é de 5% a 10%.

Awazu não admitiu que o BC deve fracassar em sua única missão este ano, a de entregar a inflação na meta. O certo é que, se isso ocorrer, conforme tudo indica, Tombini terá de escrever uma carta ao Ministério da Fazenda explicando o que deu errado e traçando os próximos passos para pôr as rédeas nos preços novamente. Isso não ocorrer desde 2004. “Nós, da equipe do BC, trabalhamos 200% para isso: 24 horas por dia, sete dias por semana e 365 dias por ano para atingir esse objetivo.”

Atualmente em 12,75% ao ano, a Selic deve continuar a subir na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de abril, segundo analistas do mercado financeiro que leram o documento. A dúvida é em relação não apenas o próximo passo do BC sobre o rumo dos juros - se o aumento será de 0,25 ponto porcentual ou de 0,50 ponto porcentual -, mas também sobre a extensão desse ciclo, já que, embora tenha demonstrado que a inflação está alta este ano, ainda mantém um prognóstico considerado otimista para 2016.