SÃO PAULO

Empresas que contrataram os serviços de consultor do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu afirmam que estavam interessadas em suas análises sobre conjuntura política ou sua atuação como lobista em países da América Latina. Dirceu intermediou até mesmo encontros com o ex-presidente Hugo Chávez, como informou um dos contratantes ao GLOBO.

O dono da Consilux Tecnologia, Aldo Vendramin, disse ter pagado R$ 1,22 milhão a Dirceu para assessorar a empresa "no relacionamento com o governo venezuelano", um de seus principais clientes. Desde 2006, a Consilux participa da construção de moradias e infraestrutura em bairros populares da Venezuela, ao custo de US$ 416 milhões.

- Tínhamos muitas dificuldades com o recebimento (por contratos), havia um desgaste grande com o governo. Foi muito satisfatório o serviço prestado, a relação melhorou muito. Sou grato - disse Vendramin.

Segundo ele, Dirceu atuou em conversas com ministros venezuelanos e com o próprio presidente da Venezuela à época, Hugo Chávez. O ex-ministro alega que os serviços foram prestados dentro da lei.

Responsável por pagamentos que totalizaram R$ 1,5 milhão, a Ambev também diz ter contado com os serviços de consultoria de Dirceu em atendimento às suas operações na Venezuela e "em função do notório conhecimento de que dispunha (Dirceu) acerca do país vizinho". Na época, o petista atuou, segundo a Ambev, para evitar que Chávez levasse adiante projeto de confiscar uma das fábricas da companhia na Venezuela.

A lista de clientes da JD Assessoria e Consultoria, empresa de Dirceu, foi tornada pública em inquérito que apura a relação do ex-ministro com empresas investigadas na Operação Lava-Jato. Entre 2006 e 2013, a empresa do petista recebeu R$ 29,2 milhões, dos quais R$ 8,5 milhões foram repassados por prestadoras de serviço da Petrobras suspeitas de corrupção. Outro R$ 1,45 milhão foram pagos a uma empresa de Milton Pascowitch, citado em depoimentos como operador de pagamento de propinas ao PT, conforme revelou O GLOBO.

"Internacionalização"

Cliente que mais pagou oficialmente pelos serviços de Dirceu, a farmacêutica EMS disse ter buscado com os serviços do ex-ministro a "internacionalização da empresa", por meio da "prospecção, expansão e diversificação dos negócios do grupo". Segundo relatório da Receita Federal, Dirceu recebia R$ 150 mil por mês da empresa, que não quis dizer em que países o petista trabalhou. Os pagamentos ocorreram entre 2009 e 2013, e totalizaram R$ 7,8 milhões.

Holding que pertence ao controlador da Hypermarcas, a maior empresa de bens de consumo do Brasil, a Monte Cristalina Ltda. pagou R$ 1,59 milhão ao petista entre 2008 e 2013. Em troca, diz ter recebido "análises e palestras sobre o cenário político brasileiro", usada como "suporte para as suas decisões de investimentos".

Quem também diz ter buscado a "análise do cenário político brasileiro e latino-americano" a um custo de R$ 20 mil por mês foi o Grupo ABC, do publicitário Nizan Guanaes, que pagou R$ 1,1 milhão ao petista.

Prestadora de serviços de tratamento de resíduos em 16 estados brasileiros e no Peru, a Solví Participações diz ter pago R$ 448 mil a Dirceu entre 2008 e 2010, em apoio "às ações de internacionalização da empresa", segundo a assessoria.

De acordo com a Solví, o serviço prestado foi "satisfatório" e considerou o "conhecimento geopolítico da América do Sul" do ex-ministro. A Solví reúne aproximadamente 30 empresas, entre elas a Revita Engenharia, acusada pela contadora Meire Poza de emitir notas frias. A empresa nega.

A Arns Engenharia e a Credencial Construtora pagaram, respectivamente, R$ 600 mil e R$ 200 mil a Dirceu, em busca de oportunidades fora do país. No entanto, segundo a empresa, os negócios não prosperaram.

- Foi uma tentativa válida - disse Eduardo Meira, sócio da Credencial.

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Engevix diz que pagou R$ 10 milhões de propina  

SÃO PAULO

O presidente do Conselho de Administração da Engevix, Cristiano Kok, admitiu em entrevista ao jornal "Folha de S.Paulo" que a empreiteira pagou cerca de R$ 10 milhões ao doleiro Alberto Youssef, um dos principais operadores do esquema de corrupção na Petrobras. A Engevix, como outras corporações, é investigada pela Operação Lava-Jato.

Cristiano Kok afirmou que "os políticos aparelham a Petrobras para arrancar dinheiro das empreiteiras", e que "foi uma extorsão" o que funcionários da estatal fizeram com as empresas denunciadas. Kok também disse que dificilmente algum empresário poderia ter denunciado a extorsão anteriormente.

"Agora, será que alguma empresa poderia ter denunciado que estava sendo extorquida pelo Paulo Roberto (Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras)? No mundo real não dá para fazer isso", disse Kok.

Segundo o presidente do Conselho da Engevix, o pagamento de propina da empreiteira foi feito diretamente a Youssef. Foram pagos entre R$ 6 milhões e R$ 7 milhões num contrato de R$ 700 milhões na Refinaria Abreu e Lima, e "mais uns R$ 3 milhões" na obra da refinaria de Cubatão. O valor era pago em prestações mensais para três empresas do doleiro.

Kok disse que pagava propina para não ser "prejudicado nos pagamentos de aditivos e nas medições da obra". E afirmou: "Para receber em dia, e ter as mediações aprovadas, tem que pagar comissão, taxa de facilitação, propina, chame do que você quiser. Era chantagem mesmo, extorsão".

"Quando começou a Lava-Jato, ficamos sem dinheiro e paramos tudo", disse o executivo da Engevix. Apesar de afirmar não saber para quem ia o dinheiro, Kok disse na entrevista que Youssef havia sido indicado para a Engevix pelo ex-deputado do PP José Janene, morto em 2010. A propina, segundo ele, era para que a empresa não fosse prejudicada. No entanto, os contratos, segundo o presidente, foram ganhos por meio de licitação.

Parte da empresa à venda

Cristiano Kok falou ainda à "Folha" sobre as dificuldades enfrentadas pela empresa. Parte da Engevix foi colocada à venda. Além disso, a empreiteira está com uma dívida de R$ 1,5 bilhão junto a bancos e fornecedores. O faturamento, segundo o presidente, caiu de R$ 3 bilhões para R$ 1 bilhão. O Ministério Público pede indenização de R$ 538 milhões pelos supostos delitos. Ele disse que, depois do escândalo envolvendo sua empresa, mudou de vida, passou a rezar e a meditar: "Peço ao poder superior uma ajuda".

O presidente do conselho administrativo ainda negou à "Folha" que o contrato realizado pela empreiteira com o ex-ministro José Dirceu para consultoria tenha sido uma forma de pagar propina. "Nunca foi propina. Dirceu foi contratado pelo relacionamento que tinha no Peru, em Cuba e na África, tínhamos interesse nesses mercados", relatou ele.

Kok afirmou que Milton Pascowitch, citado por Gerson Almada como um elo entre a empresa e o PT, atua com a Engevix há mais de 15 anos. Segundo Kok, Pascowitch era contratado para fazer lobby e não para pagar propina. Almada é sócio da Engevix e está preso há mais de 120 dias.

Acusada de participar do esquema de corrupção investigado pela Operação Lava-Jato, a Engevix é processada por improbidade administrativa.

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Quadros de Duque chegam ao Museu

Um funcionário do Museu Oscar Niemeyer (MON), em Curitiba, transporta uma das 131 obras de arte apreendidas na casa do ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, além de outras oito encontradas na casa de Adir Assad, operador da Delta Engenharia. As obras foram entregues à tarde ao MON e ainda passarão por perícia para comprovar autenticidade. O museu já tem a guarda temporária de outras 64 peças apreendidas na Lava-Jato.