Título: Tentativa de blindagem
Autor: Rizzo, Alana
Fonte: Correio Braziliense, 17/07/2011, Política, p. 8
Baseado em argumentos como falta de autonomia, MP defende mudanças no projeto de criação do grupo que investigará os crimes cometidos durante a ditadura
Procuradores da República defendem alterações no Projeto de Lei nº 7.376/2010, que cria a Comissão da Verdade, antes da votação da matéria na Câmara dos Deputados, sob risco de o órgão ficar só no papel e perder a efetividade. A nota técnica elaborada pelo Grupo Memória e Verdade, do Ministério Público Federal (MPF), cobra a definição dos poderes de instrução e a autonomia financeira e orçamentária. A Comissão da Verdade vai examinar e esclarecer violações de direitos humanos no passado recente brasileiro.
O texto está na Câmara desde o ano passado e, apesar de o governo ter anunciado que queria aprová-lo até 15 de julho, os parlamentares deixaram para depois do recesso. Familiares das vítimas do regime afirmam que não houve debate suficiente sobre a proposta e que o texto precisaria ser ajustado. A ideia original, no entanto, teria sido acordada entre líderes partidários e com as vozes divergentes dentro do governo. O Executivo defende que o texto é a única possibilidade de consenso e que é melhor aprovar e depois buscar ajustes. A ordem da votação depende de o governo federal destravar a pauta.
Segundo o documento do MPF, a comissão precisa de poderes de investigações cíveis, como a notificação de testemunhas; a requisição de documentos e informações a entidades privadas; e a requisição de auxílio de força policial. Pelo direito brasileiro, assemelha-se às atribuições das comissões e do Ministério Público na condução do inquérito civil.
¿A intervenção judicial deve ser limitada aos casos para os quais a Constituição estipula proteção especial, tais como a garantia de inviolabilidade do domicílio e as quebras de sigilos telefônicos, postais¿, destaca a nota técnica. ¿Em realidade, fazer depender a atuação da comissão de homologação judicial menoscaba (menospreza) a sua missão, tolhe seu desempenho, e, na prática, pode inviabilizar o cumprimento de parte da sua finalidade¿, completam os procuradores.
Verbas A nota técnica também alerta que a vinculação financeira e orçamentária da Comissão da Verdade à Casa Civil pode representar a perda da autonomia. ¿Não se pode esquecer de que a busca da verdade custa dinheiro e que esses valores podem ser consideráveis. E não se pode realmente crer que uma comissão será autônoma e independente se a todo momento precisar solicitar verbas para a Casa Civil¿, aponta o documento. A dependência econômica é uma das formas mais claras, segundo os procuradores, de estabelecer a subserviência e ainda permitir a limitação dos trabalhos da comissão.
Os procuradores destacam ainda a necessidade da neutralidade dos membros indicados pela Presidência da República para formar a comissão. A Procuradoria da República defende a supressão do artigo que permite a presença de militares no grupo. ¿Uma comissão da verdade imparcial e capaz de fazer justiça é muito bom para o país¿, destaca o procurador Marlon Weichert.