Título: Edmar do castelo e do jeitinho
Autor: Prates, Maria Clara
Fonte: Correio Braziliense, 17/07/2011, Política, p. 9

Congresso

Ex-deputado usou verba indenizatória para socorrer suas empresas à beira da falência

Os brasileiros já se acostumaram com a criatividade de alguns políticos para torrar de forma ilegal a verba indenizatória, que deveria ser usada para o exercício de seus mandatos. Já teve parlamentar que lançou mão do recurso para custear viagens de passeio com a família, pagar impostos de veículos, entre outros mimos. Mas ainda assim alguns conseguem surpreender. O ex-deputado federal Edmar Moreira, por exemplo, usou R$ 230 mil da verba indenizatória, em 2007 e 2008, para socorrer empresas de segurança, de sua propriedade, que estavam à beira da falência.

O emprego inusitado da verba foi admitido pelo próprio parlamentar durante seu depoimento à Comissão de Sindicância, instaurada pela Corregedoria da Câmara, em março de 2009. No entanto, a confissão do socorro a empresas privadas com dinheiro público, em depoimento no dia 19 daquele mês à comissão, só foi revelada agora (veja quadro). Edmar Moreira, que ficou conhecido por ter sido dono de um castelo no interior de Minas e por trapalhadas quando assumiu a Corregedoria da Casa ao defender o fim do julgamento dos parlamentares no Conselho de Ética, confessou a prática ao relator da sindicância, à época o deputado federal José Eduardo Cardozo (PT-RJ), hoje ministro da Justiça.

A confissão, entretanto, custou caro a Edmar: em seu relatório, Cardozo foi duro e defendeu a instauração de processo disciplinar por quebra do decoro parlamentar, o que de fato ocorreu. Cardozo concluiu que ficaram configurados indícios de infringência ao decoro. E foi mais longe. Em um trecho do seu relatório, ele coloca sob suspeita a transação de venda de uma das empresas do então colega Edmar. E afirma: "De início, cumpre observar que resta comprovado que o representado apresentou à Casa, entre maio de 2007 e janeiro de 2009, notas fiscais de empresas que foram (Itatiaia) ou são (Ronda) de sua propriedade, das quais foram sócios apenas ele e sua mulher".

O tamanho do rombo nas empresas que pertenceram ao ex-parlamentar, derrotado nas eleições de 2010, é facilmente apurado numa simples pesquisa nos site do Judiciário. De acordo com o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo, tramitam ali cinco ações de execuções fiscais, que totalizam dívidas com a Previdência de R$ 53.187.967,25. Essas ações foram ajuizadas contra o ex-parlamentar e sua empresa F. Moreira Empresa de Segurança e Vigilância. A Empresa de Segurança de Crédito Itatiaia LTDA., que foi de sua propriedade, acumula dívidas de R$ 2.299.219 na Prefeitura de Belo Horizonte. Uma ação de execução fiscal, atualmente embargada, tenta cobrar o valor devido. Em razão desse rombo, Edmar Moreira e sua mulher respondem, por decisão unânime do Supremo Tribunal Federal (STF), a processo pelo crime de apropriação indébita previdenciária.

Apesar de todos esses registros, Edmar Moreira conseguiu ser absolvido no processo disciplinar, sob a alegação de não existir uma norma na Câmara que proibisse a contratação de segurança por empresas de parlamentares. O deputado foi procurado pela reportagem para falar sobre o assunto, mas não retornou as ligações.

CONFISSÃO

Deputado José Eduardo Cardozo: O senhor falou que há muitos anos, mesmo antes de ser deputado federal, o senhor usava o serviço de segurança. No entanto, só a partir de um certo momento é que o senhor começa a apresentar os gastos de segurança como onerando a verba indenizatória. Antes disso, o senhor não apresentava. Por que a partir de um certo momento o senhor começou a apresentar esses gastos?

Deputado Edmar Moreira: Porque eu tive que fazer uma opção relativamente à saúde financeira, à pré-falência das empresas e tudo.

Cardozo: Como auxílio à sua empresa? Seria isso?

Edmar: É.

Trechos do depoimento do ex-deputado à Comissão de Sindicância da Câmara em 19 de março de 2009