Título: Ressentimento econômico e cultural
Autor: Martínez, Manuel
Fonte: Correio Braziliense, 17/07/2011, Mundo, p. 20
Nos últimos anos, o Brasil foi protagonista de imbróglios que contribuíram para que crescesse, na vizinhança, a sensação de que o país tem interesses imperialistas. As fontes consultadas pelo Correio consideram que, de maneira geral, isso é fruto de um sentimento de desconfiança dos países da região, um quadro com o qual temos dificuldade de lidar e que, eventualmente, nem conseguimos identificar.
Na lista dessas confusões, há algumas querelas antigas, como as brigas comerciais com a Argentina e as disputas de terras entre brasileiros paraguaios, com quem ainda temos divergências a respeito do uso de Itaipu. Mais recentemente, a essa bola de neve se somou a expulsão da construtora Odebrecht do Equador, país que processou o BNDES em tribunais internacionais, e a invasão de unidades da Petrobras na Bolívia, a mando do presidente Evo Morales ¿ que decretou em 2006 a nacionalização dos recursos naturais. E, como se fosse pouco, tivemos o nariz torcido contra nós durante algum tempo por países centro-americanos, por termos sido praticamente os últimos a reconhecer o novo governo de Honduras, alçado ao poder em eleições realizadas pela junta provisória que governou o país após a destituição, em 2009, do presidente Manuel Zelaya, acusado de infringir a Constituição.
"Muitos latino-americanos ainda se perguntam se temos um projeto para a região, e isso gera neles expectativa e temor a nosso respeito, situações com as quais ainda temos certa dificuldade de lidar", explica o professor Alcides Vaz, da UnB. Por outro lado, o cientista político argentino Fabián Calle entende que falta ao Brasil promover melhor sua participação no cenário internacional, sobretudo na América Latina, para assim dirimir essas incertezas. E a historiadora Albene Menezes, da UnB, estudiosa da integração regional sul-americana, sugere que as empresas brasileiras com atuação lá fora teriam de buscar um novo método de inserção nos países onde operam. Segundo ela, essas companhias deveriam esforçar-se para entender melhor as particularidades socioculturais das comunidades com as quais se relacionam para, pelo menos, buscar reduzir possíveis desgastes com prováveis divergências.
No mês pasado, a Odebrecht recebeu uma encomenda do governo peruano para que construa em Lima uma réplica do Cristo Redentor, o cartão-postal por excelência do Rio de Janeiro e do Brasil. A obra, em que a empreiteira apenas atuava como fornecedora, fez com que se desatassem acusações em torno do que seria uma amostra do "imperialismo cultural" brasileiro, segundo reportagem do Wall Street Journal.
"Talvez, se a empresa tivesse contratado um artista peruano para projetar a imagem, ou se seguisse os padrões religiosos desses povo extremadamente católico, com características próprias, as críticas não tivessem incluído o Brasil", analisou Menezes. (MM)