A Associação de Juízes Federais (Ajufe) prometeu ontem levar ao Congresso Nacional e ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) propostas para reduzir a impunidade. Uma delas, anunciada em artigo assinado pelo presidente da entidade, Antônio César Bochenek, ao lado do juiz responsável pela Operação Lava-Jato no Paraná, Sérgio Moro, causou polêmica: executar imediatamente as prisões determinadas em condenações em primeira instância. Hoje, o Supremo Tribunal Federal (STF) só admite a prática no último recurso.

A proposta foi feita com base nos encontros da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla), entidade que reúne mais de 60 órgãos dos Três Poderes, além de representantes da iniciativa privada e da sociedade civil organizada.

Na cerimônia, em Brasília, Sérgio Moro disse que o momento de “crise” no país é uma “oportunidade” para impulsionar mudanças e melhorar o sistema judicial, mas, ao mesmo tempo, afirmou que as proposições não têm referência com a investigação policial sobre desvios na Petrobras.

Bochneck, Moro e os juízes Roberto Veloso, André Prado e Fernando Mendes insistiram que a proposta em nada diminui a presunção de inocência dos acusados. O juiz da Lava-Jato disse que o projeto não muda a garantia de que uma pessoa só será condenada se houver “uma prova categórica” e que não será punida antes do julgamento, a não ser em casos excepcionais. “É uma garantia do cidadão e uma conquista da humanidade”, reforçou Moro. Os magistrados consideraram que, se a medida não for aprovada no Legislativo, já seria “um avanço” a aprovação da PEC dos Recursos, que permite a execução das prisões na segunda instância.

Bochenek disse que a Ajufe estuda mais dois temas para o Congresso: mudanças para reduzir o número de habeas corpus e alterações no foro privilegiado, que permite que políticos só sejam julgados em tribunais superiores — o benefício, na avaliação de alguns magistrados, muitas vezes resulta em divisões e tumulto nos processos. “Esse debate é importante. É necessário haver transformação”, disse o juiz.

Mensalão
Ao comentar o combate à corrupção, Sérgio Moro disse que o julgamento do mensalão foi “histórico” por mudar costumes no Judiciário do país. “É uma decisão que a imprensa e a população em geral considera como histórica, porque o Supremo Tribunal Federal julgou e rompeu, de certa maneira, com uma tradição bastante negativa em casos de foro privilegiado, de processos que não chegavam a bom termo. Nesse aspecto, foi um julgamento extremamente positivo, tanto em relação às absolvições quanto às condenações”, analisou o juiz, que foi assessor da ministra do STF Rosa Weber durante a análise do mensalão.

Em informações enviadas ontem ao STF, Moro disse que o empresário Ricardo Pessoa, presidente licenciado da empreiteira UTC, pagou propina mesmo depois de deflagrada a Operação Lava-Jato. No entanto, o juiz não detalhou quem recebeu o pagamento. Pessoa está preso desde novembro.

As propostas dos juízes
Confira as sugestões apresentadas pela magistratura

Prisões imediatas
» Executar imediatamente, independentemente de recurso, as prisões após a condenação na primeira instância. A medida só vale para crimes graves e hediondos, como tráfico, corrupção e lavagem de dinheiro. A prisão imediata não ocorre se houver garantias de que o réu não fugirá ou não voltará a praticar crimes. Essa prisão ainda pode ser revertida por um tribunal.

Regras claras para confisco
» Estipular normas mais transparentes para permitir o uso de bens de criminosos por órgãos de investigação e controle ou por entidades assistenciais que previnem delitos, como clínicas de recuperação de dependentes químicos.

Confisco sem condenação
» Em casos de crimes graves, permite que os bens dos criminosos sejam repassados ao Estado ou leiloados antes mesmo da condenação criminal. É a chamada ação de extinção de domínio.

Lewandowski nega enfraquecer CNJ
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, negou a diminuição de poderes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na minuta da nova Lei Orgânica da Magistratura (Loman). O texto diz que os magistrados só poderão ser interrogados por um juiz da mesma categoria. Alguns conselheiros interpretaram a medida como uma vedação aos processos tocados no CNJ por membros que não vieram da magistratura, mas da sociedade civil e do Ministério Público. O ministro comparou à situação à dos militares. “Não se tem ideia nem notícia jamais na história de nossas Forças Armadas de sargento que interrogasse um coronel, ou um capitão, ou um general.”