Título: Todos sofrem diariamente
Autor: D"angelo, Ana; Bonfati, Cristiane
Fonte: Correio Braziliense, 23/07/2011, Economia, p. 11
A cabeleireira Adamanla Djai está há um ano e dois meses em Brasília e garante que a discriminação aqui é muito mais forte que em sua terra natal, o Senegal (África). "Quando vou comprar algo, sempre me mostram os itens que estão em promoção", revela.
O professor Ernandes Reis Marinho, 54 anos, presidente do Conselho de Defesa dos Direitos dos Negros (CDDN) afirma que existe uma identificação entre o preconceito racial e a questão social. "O problema no Distrito Federal é muito sério. Para muita gente, pobre e negro são a mesma coisa", diz. "Todos os negros passam por discriminação, a gente vê isso diariamente", acrescenta.
Ernandes, que foi padre durante 12 anos, tem uma coleção de casos de discriminação sofridos por causa de sua cor. O mais marcante, segundo ele, foi quando quis visitar uma pessoa no Hospital de Base. A resposta curta e direta veio logo: "Desculpe, o senhor não pode subir". Foi somente após se identificar como padre que ele conseguiu passar do hall de entrada. "Antes de ser padre, sou cidadão", enfatiza. "As pessoas não relacionam profissão e função com cor. Nunca imaginam, por exemplo, um médico negro", completa.
Os apelidos e expressões com termos pejorativos também fazem parte do rol de lembranças que marcaram a vida de muitas pessoas. O ascendente de japonês Goro Ichikawa, 44 anos, gerente do Brasília Café, lembra-se até hoje dos termos maldosos. "Diziam que japonês comia rato todo mês", recorda. Goro conta que hoje nem se incomoda em ser chamado por "japonês" em vez do próprio nome. Para a cabeleireira Ana Paula Pereira Nascimento, 22, apelidos pejorativos como "neguinha, favelada e macaco" eram comuns durante a quarta série, quando tinha apenas 9 anos. "Não tem como dizer que criança nenhuma não sofre discriminação", lamenta.