Diante da perspectiva de levar menos gente às ruas nos grandes centros, movimentos procuram dar capilaridade às manifestações e chegar a mais de 400 municípios

 

Os grupos contrários ao governo federal chegaram a uma bandeira comum para os protestos de hoje - todos adotaram o slogan "Fora Dilma" -, mas não obtiveram o mesmo grau de mobilização nas redes sociais registrado às vésperas de 15 de março, data em que atraíram o maior contingente de um ato político desde a campanha pelas Diretas-Já. Diante da perspectiva de levar menos gente para as ruas, os três principais movimentos anti-Dilma tentam dar mais capilaridade às manifestações e realizá-las em mais municípios do que no mês passado.

 

"Nossa intenção é fazer com que a mensagem chegue em mais cidades", afirma o porta-voz do Vem Pra Rua, Rogério Chequer. Em sua página no Facebook, o grupo diz ter atos confirmados em 413 cidades brasileiras e no exterior. O Movimento Brasil Livre (MBL), outro grupo organizador dos protestos, confirmou presença em 161 cidades. No dia 15 de março, os protestos ocorreram em 212 cidades, atraindo um público total de 1,9 milhão de pessoas, 1 milhão delas em São Paulo, segundo estimativa - para alguns inflada - da Polícia Militar. De acordo com o Datafolha, a mobilização na Avenida Paulista reuniu 210 mil.

 

 

 

Na primeira grande manifestação antigoverno, Revoltados On Line e Movimento Brasil Livre já pediam o impeachment da presidente Dilma Rousseff, mas o Vem Pra Rua, não. Este último grupo agora aderiu ao slogan, que será reforçado pelo Solidariedade (SD), único partido a participar formalmente dos atos de hoje - o PSDB, por exemplo, convocou apoiadores, mas não fala abertamente em impeachment. Integrantes do SD vão tentar aproveitar o público das manifestações para colher assinaturas pelo impedimento da presidente.

 

Assim como os organizadores, o governo e o PT avaliam que as manifestações de hoje serão menores e não terão tanto impacto quanto as de 15 de março. Mesmo assim, a orientação é de acompanhar com atenção redobrada o movimento principalmente em São Paulo, onde há a maior concentração de pessoas.

 

Levantamento da consultoria Interagentes, especializada em análises de mídias sociais, mostra que a mobilização na internet para o ato de hoje é cerca de dois terços menor do que a registrada antes de 15 de março.

 

Coordenado pelos sociólogos Sério Amadeu e Tiago Pimentel - a dupla trabalhou na campanha de Dilma em 2014 - , o estudo mostra que para o primeiro protesto foram convidados 18,2 milhões de pessoas via internet. Destes, 2,1 milhões confirmaram presença, 192 mil disseram "talvez" e 830 mil recusaram. Para hoje 5,5 milhões de pessoas foram convidadas, 607 mil confirmaram presença, 46 mil disseram "talvez", e 204 mil recusaram.

 

O Ibope também mediu o humor nas redes e detectou queda nas referências aos termos "manifestação" e "protesto". Não há como se medir, no entanto, convocações ou mobilizações por mensagens de WhatsApp, ferramenta também usada pelos grupos.

 

Organização. Em São Paulo, a PM estima que de 10 a 16 carros de som sejam levados para a Avenida Paulista a partir das 14 horas para dar voz a ao menos oito grupos que pedem o impeachment. Apesar de rechaçado pelos demais grupos, o SOS Forças Armadas estará presente pedindo a intervenção militar. Como no dia 15, não haverá caminhada: os carros ficarão parados na avenida.

 

No Rio ativistas planejam se concentrar às 11 horas no posto 5 da praia de Copacabana (zona sul), para, três horas depois, seguir em caminhada rumo ao hotel Copacabana Palace, a 2,5 km de distância. Convocado pela internet por grupos como Cariocas Direitos, MBL-RJ, Revoltados On Line e União Contra a Corrupção (UCC), o ato desta vez será único - em 15 de março houve um pela manhã e outro à tarde.

 

Os organizadores planejam reunir ao menos o mesmo público do evento anterior - 18.500, na avaliação da PM. "Tivemos dois meses para divulgar aquele ato. Este foi promovido em muito menos tempo, então já será bom se tivermos público semelhante", afirmou Denis Abreu, do Cariocas Direitos. Segundo ele, outros dois fatores que ajudaram a impulsionar o protesto do dia 15 não estão presentes hoje: o pronunciamento de Dilma na semana anterior e o ato promovido dois dias antes por CUT, UNE e MST com apoio mais explícito à presidente.

 

Como nas manifestações de 15 de março, políticos da oposição devem marcar presença discreta nos atos, sem discursar em carros de som. / COLABORARAM VERA ROSA e FÁBIO GRELLET

 

Movimentos unificam bandeira, mas disputa entre eles aumenta

Grupos que no dia 15 de março pregavam ações conjuntas mesmo com diferenças estratégicas e ideológicas se afastam

 

Unidos no discurso “Fora Dilma”, os principais responsáveis pela organização dos protestos contra o governo federal estão divididos em uma disputa que envolve o tom das manifestações. 

 

 

Grupos como Movimento Brasil Livre (MBL), Revoltados On Line, Vem Pra Rua e o minoritário SOS Forças Armadas, que até o dia 15 de março dialogavam frequentemente, apesar das diferenças estratégicas e ideológicas, hoje estão afastados.

 

 

Além das tentativas de diferenciação ideológica, os grupos se valem do número de seguidores nas redes sociais para reivindicarem protagonismo nas manifestações. 

Além das tentativas de diferenciação ideológica, os grupos se valem do número de seguidores nas redes sociais para reivindicarem protagonismo nas manifestações. 

 

 

 

 

A rusga mais grave envolveu MBL e SOS Forças Armadas. Os jovens liberais do MBL foram à Justiça para garantir o direito de ficarem distantes dos militaristas ultrarradicais hoje à tarde na Avenida Paulista.

 

No protesto do dia 15 de março, os dois grupos ficaram frente à frente. Os primeiros no vão-livre do Masp e os outros no Parque Trianon. O fato de o SOS Forças Armadas defender a intervenção militar no País com um grande aparato de carros de som e propaganda causou constrangimento no MBL, que defende o impeachment da presidente, mas não a intervenção. A ação judicial só foi retirada após um acordo mediado pela Polícia Militar. 

 

‘Chequer Semfunds’. Mentor intelectual do MBL e de boa parte da direita universitária, o escritor conservador Olavo de Carvalho fez críticas públicas ao Vem Pra Rua, um dos grupos mais moderados que relutavam em defender o impedimento da presidente Dilma Rousseff. O alvo foi o empresário Rogério Chequer, porta-voz do Vem Pra Rua. “Ou o sr. Rogério Chequer passa a pedir abertamente o fim do PT e do Foro de São Paulo bem como a destituição da presidente por qualquer meio legal disponível ou passarei a chamá-lo de Chequer Semfunds (sic)- e esse apelido vai pegar. O prazo termina amanhã à noite”, ameaçou o escritor em sua página no Facebook em 26 de março.

 

No mesmo dia, Carvalho publicou um post dizendo que Chequer o havia procurado para conversar. Dias depois o Vem Pra Rua passou a defender o impeachment de Dilma. 

 

O posicionamento mais brando do Vem Pra Rua sobre o impeachment também azedou a relação com os membros do MBL, que acusam o grupo de estar ligado ao PSDB. Se antes os dois grupos dialogavam e articulavam juntos os protestos de rua, hoje o MBL nem sequer atende aos telefonemas de Chequer. 

 

O empresário, que prega o “diálogo”, diz que os grupos podem se entender nas convergências, “respeitando as diferenças”. “Não precisamos ter uma superposição de causas de interesse ou de estilo. Pega-se o objetivo comum e se coordena. E os outros, respeita-se sem um pisar no pé do outro”, disse. 

 

Apesar do tom conciliatório, ele também critica o estilo radical dos outros dois grupos. “Eles (MBL) queriam que a gente fosse mais radical. É como se eu dissesse que o Marcello Reis deveria ser menos radical, senão não falo com ele”, disse. 

 

Além das tentativas de diferenciação ideológica, os grupos se valem do número de seguidores nas redes sociais para reivindicarem protagonismo nas manifestações. Se até o dia 15 de março esta disputa era velada, agora é escancarada. 

 

“Se juntar estes dois grupos (Vem Pra Rua e MBL), não chega no Revoltados On Line”, afirmou Marcello Reis, líder desse último. A página dos Revoltados On Line no Facebook conta com 764 mil seguidores, enquanto o Vem Pra Rua tem 475 mil e o MBL, 121 mil.