O noticiário econômico tem apontado algumas iniciativas de reforma tributária como essenciais para tirar o País da crise e voltar a crescer. Por seu turno, o governo federal vem propondo algumas alterações no sistema tributário para ampliar a arrecadação federal. Não apresentou, no entanto, nenhum projeto de reforma tributária.

 

 

Surgem, também, propostas de ampliação da tributação do patrimônio. Visam a elevar a arrecadação do imposto sobre a herança a cargo dos Estados, criá-lo a nível federal e a regulamentação do Imposto sobre Grandes Fortunas, que consta como integrante do sistema tributário, mas não regulamentado pelo Congresso, desde 1988.

 

Qual a importância de uma reforma tributária que vise o crescimento econômico? A resposta a essa questão importa em verificar a qualidade do sistema tributário em vigor em seus vários aspectos: nível da carga tributária, sua repartição entre União, Estado e município, distribuição regional Norte/Nordeste x Sul/Sudeste e face à renda do contribuinte.

 

As diversas propostas de reforma tributária até hoje apresentadas visavam dois objetivos: a repartição dos tributos entre os níveis de governo (União, Estado e município) e a simplificação no ICMS, que deixaria de ter 27 legislações estaduais por uma federal que visasse a eliminação da denominada guerra fiscal. Malograram todas, devido à oposição dos governadores em alterar o ICMS, principal fonte de recurso dos Estados.

 

Nenhuma dessas propostas teve foco no contribuinte, que é quem paga a conta do setor público. Estudos revelam a forte regressividade do sistema, onde quem ganha até dois salários mínimos (SM) paga metade de sua renda em tributos e para os que ganham acima de 30 SM a incidência é de ¼ da renda.

 

Há que reduzir a carga tributária, que nos últimos anos tem girado em torno de 36% do PIB, que é próxima da cobrada pelos países desenvolvidos e bem acima da média dos emergentes, que se situa próxima de 25%.

 

Assim, esse sistema tributário é recessivo e piora ainda mais a má distribuição de renda na sociedade. Há que mudá-lo na sua parte principal, que é a elevada carga tributária e sua distribuição face à renda.

 

Carga tributária. Ela contribui para elevar em média 40% (!) os preços de bens e serviços. Perde apenas para os juros como fator de elevação de preços, que mais do que os dobra no crediário. Isso explica porque o Brasil é um país caro para se viver.

 

Para reduzir essa carga sem afetar os recursos que o setor público dispõe para atender a demanda social e de infraestrutura, é necessário diminuir o peso dos juros nas despesas públicas. Eles consomem 6% do PIB, ou seja, 1/6 da carga tributária. A média mundial na despesa com juros no setor público gira no entorno de 1% do PIB. Assim, gasta-se desnecessariamente cerca de 5% do PIB. Pode-se afirmar que a carga tributária útil, ou seja, a que serve às finalidades do setor público, é de 30% do PIB (36 menos 6).

 

Essa anomalia na economia se deve à elevada taxa básica de juros, que sempre se situou acima da inflação e que atualmente está seis pontos acima. Já foi pior no passado. Sob FHC (1996/2002) atingiu 14,1 pontos (!), sob Lula (2003/2010) 9,1 pontos (!) e sob Dilma (2011/2014) 3,7 pontos. Esse diferencial é o que atrai os rentistas e o capital especulativo internacional. Desde a crise de 2008, os países passaram a praticar a taxa básica de juros ao nível da inflação como medida de combate à recessão. Aqui, embora tenha ocorrido melhora com pontuação cadente de 2005 a 2013, quando atingiu o mínimo da série, com 2,4 pontos, voltou a subir, devendo se situar neste ano em cinco pontos (Selic em 13% e IPCA em 8%). Com forte despesa com juros, fica difícil reduzir a carga tributária. Caso ocorra mudança na política econômica, combatendo a anomalia da elevada Selic, torna-se possível uma pressão maior pela redução da carga tributária sem afetar o almejado equilíbrio fiscal.

 

Distribuição de renda. A forte regressividade do sistema tributário se deve ao excesso de tributação sobre o consumo e subtributação sobre a renda e o patrimônio. Ao supertributar o consumo, sacrifica mais as classes de menor renda, cujo orçamento doméstico é mais afetado do que nas classes de maior renda.

 

A tributação sobre o consumo representa metade da carga tributária e o dobro da que ocorre nos países desenvolvidos. O principal tributo a incidir sobre o consumo é o ICMS estadual, responsável por metade dessa carga.

 

Para reduzir esse imposto, é necessário compensar os Estados, pois 80% da arrecadação estadual é com o ICMS. Uma forma de fazer essa compensação é elevar a tributação sobre a renda com maior partilha aos Estados, que recebem 21,5% do imposto de renda federal. Isso implica em elevar a tributação sobre as pessoas físicas, ou seja, mudando a grade de incidência com a alíquota máxima acima dos atuais 27,5%, uma das mais baixas do mundo.

 

Mas, para reduzir a tributação sobre o consumo, além da maior tributação sobre a renda, há que ampliar a tributação sobre o patrimônio. Para isso, é possível elevar a tributação sobre a herança de competência estadual com alíquota média de 4% face a uma média internacional de 30%.

 

Além disso, deve-se regulamentar o imposto sobre a riqueza, denominado de Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF). Esse tributo tem elevado potencial tributário e tem a vantagem de incidir sobre a capacidade econômica do contribuinte conforme princípio tributário constante da Constituição (artigo 145). O IGF tem forte oposição no Congresso, pois os parlamentares em sua maioria poderão ser atingidos. O mesmo ocorre entre os que temem ser atingidos.

 

A redução da tributação sobre o consumo vai permitir baixar o nível de preços da economia e tornar mais competitivas as empresas face à concorrência externa. Mas dificilmente vai ocorrer mudança no sistema tributário para redução da carga tributária e sua distribuição no contribuinte. De qualquer forma, é importante o debate e a colocação de propostas visando a melhoria do sistema vigente.