O controverso pronunciamento de Benjamin Netanyahu em Washington contra o acordo nuclear que vem sendo negociado pelo Irã e seis potências (EUA, Alemanha, Reino Unido, França, China e Rússia) foi inapropriado na forma e no conteúdo. Costurado pelo presidente do Congresso e líder republicano, John Boehner, o convite ao premier israelense para falar em sessão conjunta do Capitólio foi aceito e feito à revelia da Casa Branca, atitude que beirou o insulto protocolar, e agravou a divisão partidária no Legislativo, em meio à reação indignada de parlamentares e autoridades democratas.
No discurso, Netanyahu afirmou que não teve a intenção de desrespeitar o presidente Barack Obama, mas o convite de Boehner converteu-se numa oportunidade incontornável, em face dos riscos à segurança de Israel embutidos num acerto que permita algum tipo de atividade nuclear pelo Irã, por menor e mais controlada que seja. Ele lembrou o envolvimento do Irã com o terrorismo do Hezbollah, sua atuação desestabilizadora no Oriente Médio e o ódio proclamado contra Israel.
O premier, no entanto, não apresentou em seu discurso uma proposta alternativa ao que vem sendo negociado em meses de conversações complexas, capitaneadas pelo secretário de Estado americano, John Karry, e o ministro de Relações Exteriores do Irã, Mohammad Javad Zarif. Se o acordo avançar conforme deseja a Casa Branca, o Irã se comprometerá a um período mínimo de dez anos, em que manterá um programa nuclear limitado a um número de centrífugas com capacidade apenas de enriquecer urânio para uso medicinal e geração de energia. O país será monitorado por inspetores internacionais e qualquer mudança de rumo dará aos países signatários do pacto um prazo mínimo de um ano para agir, antes que Teerã possa produzir efetivamente armamento nuclear.
Sem um acordo, restam basicamente duas opções: a aplicação de sanções e a intervenção militar. A primeira, até aqui, não se mostrou eficiente em deter o programa nuclear iraniano; e a segunda precisaria de um difícil acordo com Rússia e China. Como disse o presidente Obama, ao comentar o pronunciamento de Netanyahu, exigir que o Irã simplesmente capitule não é um plano factível, se o objetivo das negociações for mesmo encontrar uma saída pacífica para o impasse.
O discurso do líder israelense aos congressistas americanos, duas semanas antes das eleições de amanhã em Israel, gerou dúvidas legítimas quanto às verdadeiras intenções de Netanyahu. Mas, mesmo concedendo o benefício da dúvida ao premier, pode-se afirmar que os efeitos foram desastrosos por acirrar a guerra partidária entre a Casa Branca e o Capitólio; por ameaçar o acordo que está sendo negociado com o Irã; e por colocar em seu pior momento histórico as relações entre Israel e os EUA, aliados, até então, incondicionais.
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Abraham Lincoln foi baleado no ano de 1865. Em 1881 foi a vez de James Abram Garfield, o vigésimo presidente dos Estados Unidos ser assassinado, por último no ano de 1963, John Kennedy foi morto a tiros em Dallas. O que eles têm em comum além de dois deles levarem o nome Abraão?
Certa vez, conversando com um amigo, professor em Berkley, ele me disse que a América não tolera presidentes que pensem com as próprias cabeças e caminhem com as próprias pernas.
No país onde se estimula a cultura da discussão todos devem ter uma opinião sobre qualquer assunto e na cabeça nada mais além disso. Lá, como aqui, a questão é ser a favor ou contra.
Os argumentos deixaram de ter valor nestas culturas e o bate-boca se instaura como língua oficial. Democracia de superfície.
Recentemente, Benjamin Netanyahu fez no Congresso dos Estados Unidos um discurso que gerou opiniões a favor e contra ele. Mas me interessa falar particularmente do Irã.No Brasil alguns jornalistas falaram sobre o assunto como se o discurso tivesse sido feito no Congresso Nacional. Digo isso porque se tivesse sido aqui, poderíamos ter lembrado da entrada brasileira na mediação do acordo de Teerã.
O ex-chanceler Luiz Felipe Lampreia em seu livro “Aposta de Teerã”, disse que o episódio mais vergonhoso da diplomacia brasileira aconteceu no governo Lula, e exatamente com o Irã.
A interpretação errada feita por Celso Amorim da carta que Obama enviou a Lula o levou a pensar que os EUA estariam alinhados com o Brasil e que os norte-americanos ratificariam o que estaria sendo decidido com os aiatolás. Em 17 de maio de 2010, foi divulgada a “Declaração de Teerã” e, no dia seguinte, Hillary Clinton ligou para Amorim desautorizando o acordo.
O Irã é um país cheio de contradições, como o Brasil e Israel, mas as idiossincrasias dos dois primeiros desaparecem quando um jornalista fala sobre as de Israel. O governo brasileiro se uniu ao iraniano para atacar Israel.
Críticas feitas por jornalistas brasileiros ao discurso do chanceler israelense não consideraram que os aplausos correspondem à luta de um Estado que desde sua criação batalha para ser reconhecido. Ahmadinejad em 2012 disse que Israel é "tumor cancerígeno” e que em breve desaparecerá do mapa.
Não se tolera Netanyahu como não se tolerou Lincoln, Garfield e Kennedy. Muitos querem vê-lo morto como aconteceu com Israel na guerra de 1948.
A sensatez que tenta margear as matérias feitas contra Bibi nasce de segundas intenções. Pode-se não gostar de Israel, mas deve-se respeitá-lo.
Sócrates Nolasco é professor da ECO/UFRJ