Ao alinharmos as pesquisas Ibope e Datafolha sobre avaliação do governo Dilma Rousseff, vemos que repetiu-se em 2015 o fenômeno de acumulação de tensões e explosão abrupta da insatisfação – como ocorrera em 2013. A diferença é que, desta vez, a avalanche foi mais ampla e profunda. Atingiu camadas que antes resistiram à onda de criticismo. Agora, a avalanche não apenas soterrou a popularidade da presidente. Ela corroeu a esperança da maioria da população de que ela possa vir a recuperá-la.
Se recordes 64% acham a segunda gestão Dilma ruim ou péssima – igualando o ponto mais baixo do governo Sarney – e 76% avaliam que ela está pior do que foi no seu primeiro mandato, 55% dizem que o restante será também ruim ou péssimo. O pessimismo dobrou desde dezembro, e é o principal obstáculo para a presidente. Quando traduzidas para a economia, as previsões negativas tendem a se autorrealizar, pois inibem consumo e investimento.
Daí a necessidade de Dilma aprovar a qualquer custo o ajuste fiscal no Congresso – o que levou-a a engolir as críticas veladas do ministro Joaquim Levy, e fez o ex-presidente Lula ir a uma reunião com sindicalistas da CUT e militantes do PT para tentar vender o ajuste ortodoxo para sua base política.
O desmoronamento da aprovação de Dilma em 2015 vai mais fundo do que em 2013 porque solapou as bases de apoio à presidente entre os mais pobres (60% de ruim/péssimo entre quem tem renda familiar mensal até 1 salário mínimo), entre os menos escolarizados (56% de ruim/péssimo) e no Nordeste (55%). São segmentos que votaram em peso nela em 2014, em 2010 e em Lula.
Ao final da campanha eleitoral de 2014, Dilma tinha saldo de 22 pontos na opinião pública. Foi o fato de ter mais gente achando seu governo ótimo ou bom (42%) do que ruim ou péssimo (20%) que permitiu a ela reeleger-se. Mas logo após o pleito ela começou a perder prestígio. Seu saldo caiu para 13 pontos em meados de dezembro. A virada aconteceu ao longo de janeiro, pois no começo de fevereiro Dilma já tinha saldo negativo de 21 pontos. Foi a menos 49 pontos há duas semanas e chegou a menos 52 agora.
Nenhum presidente brasileiro após a ditadura desceu abaixo dos 53 pontos negativos de saldo que Sarney conseguiu em julho de 1989, segundo o Ibope. Dilma é candidata a tomar-lhe o recorde.
VERA ROSA - O ESTADO DE S. PAULO
01 Abril 2015 | 22h 41
Brasília - Em documento intitulado "Manifesto", a corrente Construindo um Novo Brasil, majoritária no PT, convoca os partidos de esquerda, os movimentos sociais e os intelectuais a contribuírem com um "programa emergencial para sair da crise". Ao fazer um mea-culpa por muitas das turbulências do atual cenário político, a tendência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirma que o PT precisa se "reinventar" e defende mudanças no ajuste fiscal proposto por Dilma Rousseff.
"Não se pode fazer da necessidade de sanear a situação fiscal a ocasião para a apologia de uma política econômica conservadora, cujas consequências bem conhecemos", diz um trecho do documento, ao qual o Estado teve acesso.
O manifesto será debatido no 5.º Congresso do PT, que vai discutir os rumos do partido e do governo Dilma entre os dias 11 a 13 de junho, em Salvador (BA). Após os escândalos de corrupção que abalaram a imagem do PT, os petistas admitem que o partido ficou "prisioneiro" do "presidencialismo de coalizão", passa por uma "crise de identidade" e necessita mudar.
A ser apresentado como "tese" da CNB e de outras correntes que apoiaram Rui Falcão para o comando do PT, o documento critica as medidas que reduzem os direitos trabalhistas, como o seguro desemprego e o abono salarial.
"O governo está pressionado pela necessidade de uma solução de curto prazo para seus problemas fiscais. Os meios econômicos e financeiros internacionais querem que o "ajuste" seja o ponto de inflexão de nossa política econômica em direção ao conservadorismo. (...) Esse movimento não se pode fazer confrontando os trabalhadores", insiste a tese.
O texto foi escrito por Falcão e pelo assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia. Ao convocarem as "esquerdas" e os "democratas" para a construção de um programa de emergência, os grupos que detêm a hegemonia do PT pregam a formação de uma frente para impedir "o avanço da direita" e dizem que o partido precisa "voltar às ruas".
O manifesto não menciona como deveria ser o programa, mas diz que "um fator de enorme convergência de todos esses setores é, sem dúvida, a figura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a maior liderança popular das últimas décadas da história brasileira".
O ex-presidente Lula, artistas e intelectuais durante a plenária de São Paulo na Quadra dos Bancários, centro da capital
Dilma e Vaccari. Com um tom bem mais ácido, o documento produzido pela corrente Mensagem ao Partido, grupo do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, afirma que o segundo mandato de Dilma começou com "uma clara inflexão conservadora na gestão macroeconômica, contraditória com o programa eleito".
Redigido pelo ex-governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro, o texto "Mudar Mais: por um ciclo de mudanças democráticas no País" diz que os maiores erros, nos últimos anos, foram cometidos pelo Banco Central, define a taxa básica de juros (Selic) como "escandalosa" e cobra a rejeição das tentativas de desmontar a política de desenvolvimento.
"É preciso superar esse impasse ou o segundo governo Dilma trabalhará, na melhor das hipóteses, com um cenário de baixo crescimento e eventual crescimento do desemprego (...), em um contexto de ajuste fiscal vicioso", destaca o documento da Mensagem ao Partido.
Mesmo sem citar o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, o grupo de Cardozo e Tarso deixou claro que defende o afastamento do dirigente. Vaccari se tornou réu numa ação penal da Operação Lava Jato, acusado de participar do esquema de desvio de dinheiro na Petrobrás. Ele responde a processo por corrupção e lavagem de dinheiro e nega as denúncias.
"(...) Combateremos sem trégua a corrupção, a conciliação com a corrupção e a convivência com a corrupção. Além disso, filiados com função dirigente na condição de réu ou sob inquérito criminal em processos de apuração de corrupção devem ser afastados preventivamente, garantindo direito de defesa, enquanto perdurar esses processos", diz o texto.
Há três dias, Tarso já havia externado sua opinião sobre a necessidade de afastamento de Vaccari. "Se ele não se afastar, o PT terá de fazer o afastamento preventivo", argumentou o ex-governador.
Embora petistas estejam pressionando Vaccari a deixar o cargo, a corrente dele (CNB) no espectro ideológico do petismo não foi tão explícita como o grupo de Tarso e Cardozo. Ao mencionar que é imprescindível cortar a corrupção "na raiz", e, se necessário, "na própria carne", o manifesto fez, porém, uma advertência. "O PT necessita sair das páginas policiais do noticiário e ficar apenas naquelas dedicadas à política, onde tem muito a dizer", observou.