As quatro ferrovias administradas pela América Latina Logística (ALL), maior concessionária da América do Sul, voltaram no tempo. Em cinco anos, a velocidade dos trens que circulam pela malha da empresa despencou, em média, 50% e atingiu níveis próximos aos do período pré-privatização. Além de contribuir para a queda dos níveis de produtividade, a redução é um obstáculo à competitividade e à expansão do setor ferroviário.

A piora dos números da ALL, que no ano passado anunciou sua fusão com a Rumo Logística, do Grupo Cosan, começou a se desenhar em 2009. Naquela época, sob a filosofia de administração da gestora GP Investimentos, a empresa vendia a imagem de modelo de eficiência e modernidade. A velocidade média das ferrovias variava de 23,40 quilômetros por hora (km/h) a 31,07 km/h. 

Mas, depois de uma série de fiscalizações feitas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), a velocidade média passou a cair gradualmente ano após ano. Em 2013, último dado constante no Anuário 2014 da agência reguladora, a velocidade passou a variar entre 13,36 km/h e 14,85 km/h. A queda foi uma determinação da agência reguladora para preservar a segurança do tráfego ferroviário e reduzir riscos para a sociedade.

A partir de 2010, o número de acidentes nas quatro malhas da ALL aumentou e atingiu o pico em 2011. Em 2009, foram 167 ocorrências; em 2011, 401; e, em 2013, 389. Em termos relativos, no entanto, considerando a movimentação de trens, o índice de acidentes melhorou ou ficou estável em alguns trechos, segundo os dados da ANTT.

Qualidade da via. Pelo manual da agência reguladora, a velocidade de uma ferrovia precisa ser reduzida se a fiscalização detecta que a qualidade da via permanente (trilhos, dormentes, pontes e túneis) está inadequada. Nos bastidores, especialistas afirmam que a situação da malha da ALL se deteriorou nos últimos anos por falta de manutenção adequada. A gestão anterior não fez os investimentos necessários na via, apenas trocou os dormentes (madeiras que sustentam os trilhos) que estavam podres por novos, afirmou uma fonte, em Brasília.

Segundo relatório da ANTT, entre 2009 e 2013, a empresa investiu R$ 3 bilhões nas quatro malhas administradas – sendo parte desses recursos na expansão da Malha Norte, em Mato Grosso. Apesar disso, o volume é considerado baixo comparado ao que a empresa havia prometido, afirma o professor da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende. Segundo ele, a expansão da ferrovia para o Centro-Oeste, maior produtor de grãos do País, demorou muito para ocorrer, o que suscitou inúmeras críticas. “Além disso, o traçado da malha da ALL tem problemas, é antiga e exigiria uma grande modernização das estruturas. E isso é uma responsabilidade do concessionário.” 

O professor lembra que os comboios puxados pelas locomotivas têm cada vez mais vagões para aumentar a produtividade das empresas. A prática, por si só, já exigiria uma redução da velocidade por questões de segurança. Junta-se a isso o fato de as vias não serem preparadas para aguentar tamanho sobrepeso e também a falta de investimento por parte do governo, que deveria eliminar gargalos importantes, como a travessia de centros urbanos. O resultado é o que se vê nos relatórios da ANTT.

“A dimensão da queda na velocidade das ferrovias da ALL é espantosa, chama muita atenção. Não é cair de 30 km/h para 25 km/h. É de 30 km/h para 13 km/h”, afirma o presidente da consultoria Inter.B, Cláudio Frischtak, especialista em infraestrutura. Na opinião dele, os números são indícios de “sub investimento” na malha ferroviária. “Mesmo com a queda na velocidade, o número de acidentes (em termos nominais) continuou em patamares elevados.”

Em nota, a ALL afirma que a premissa básica de sua operação é a segurança ferroviária. “A expansão dos centros urbanos em torno das linhas, a dificuldade de obtenção das licenças para os investimentos nos acessos ao porto, o aumento do volume transportado e a maior circulação de trens exigem que a velocidade média seja reduzida para manter o tráfego dentro das condições de segurança exigidas.”

Com a fusão entre a Rumo (empresa de logística da Cosan) e a ALL, há novamente a promessa de recuperação da malha. Para isso, pretende pôr em prática um plano de investimentos de cerca de R$ 8 bilhões até 2020 para duplicar alguns trechos ferroviários, eliminar gargalos e comprar novas locomotivas e vagões.