Grupo recém-formado se articula para barrar na Casa pautas apoiadas por Eduardo Cunha

 

BRASÍLIA- Senadores começaram a articular a criação de uma frente suprapartidária com o objetivo de “barrar” pautas patrocinadas pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que eventualmente cheguem à Casa. A principal intenção do grupo, ainda embrionário, é respaldar a decisão do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de “desacelerar” a tramitação do projeto que trata da regulamentação da terceirização do País, ao contrário da rápida votação que a matéria teve na Câmara sob a gestão de Cunha. 

 

 

 

O grupo, que começou a ser formado durante a tramitação do projeto que fixa o marco legal da biodiversidade, na semana passada, definiu ao menos quatro pautas prioritárias para serem discutidas em outro ritmo no Senado: além da terceirização, as propostas que tratam da redução da maioridade penal, da flexibilização do porte de armas com mudanças no Estatuto do Desarmamento e o chamado Estatuto da Família, que determina, entre outros pontos, que apenas a união de um homem e uma mulher pode constituir uma família. Desses, apenas a terceirização já passou pela Câmara. 

 

“Temos um momento novo na política e um presidente da Câmara que está vindo com uma agenda extremamente conservadora e de supressão de direitos”, afirmou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), um dos articuladores da criação da frente. “(É preciso) somar força com o presidente Renan Calheiros no enfrentamento dessa ameaça que o presidente da Câmara, lamentavelmente, faz”, disse ontem o 1.º vice-presidente do Senado, Jorge Viana (PT-AC). 

 

 

Renan Calheiros nega intenção de polemizar com Eduardo Cunha

Renan Calheiros nega intenção de polemizar com Eduardo Cunha

 

 

 

 

O senador Cristovam Buarque (PDT-DF), outro articulador da frente, disse ter ficado “horrorizado” com o fato de Cunha falar que vai restabelecer a proposta de terceirização aprovada pela Câmara caso o Senado realize modificações. “É a primeira vez que vejo uma posição monocrática, como se todos fossem vassalos dele”, afirmou. “Se ele tem esse poder, muito bem, que exerça, mas nós no Senado temos que cumprir o nosso papel”, completou o pedetista, que, embora não tenha apoiado em fevereiro a reeleição de Renan, é a favor da posição dele de manter uma tramitação normal da proposta no Senado. 

 

Reunião. Lindbergh afirmou que vai intensificar na próxima semana as conversas com integrantes da base e da oposição para aumentar as adesões ao grupo que, acredita, pode chegar a 30 senadores. A primeira reunião formal do grupo está marcada para terça-feira, no gabinete do líder do PSB, João Capiberibe (AP). 

 

O objetivo imediato do petista é fazer com que o projeto de terceirização só seja concluído no Senado depois de janeiro de 2017, quando Cunha deixará a presidência da Câmara. “Se (o projeto) demorou 11 anos na Câmara, não vejo como esse projeto, passando por quatro comissões, demore menos de dois anos no Senado”, afirmou.

 

Mesmo tendo sido aprovado na quarta-feira pela Câmara, o projeto ainda não chegou oficialmente ao Senado, o que só deve ocorrer amanhã. Só a partir daí, e com a decisão do presidente da Casa, será possível saber qual tramitação a proposta terá no Senado. A intenção de Lindbergh coincide com as discussões que Renan tem tido nos bastidores de “engavetar” o projeto que trata da terceirização, embora, oficialmente, negue intenção de polemizar com Cunha.

 

Os presidentes do Senado e da Câmara têm protagonizado nos bastidores uma queda de braço desde que o aliado de Renan, Vinícius Lages, foi desalojado do Ministério do Turismo em favor do apadrinhado de Cunha, o ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves. 

 

Cenário: sem força, Renan Calheiros tenta se reinventar

Fato é que o peemedebista garantiu a Dilma um 1º mandato sem sobressaltos no Senado, mas não foi recompensado à altura no 2°

 

BRASÍLIA - O advogado José Renan Vasconcelos Calheiros completa 60 anos em setembro, 36 dos quais dedicados à vida pública. Mudando de lado conforme a ocasião, Renan foi deputado, ministro e está pela quarta vez na presidência do Senado. Também elegeu em outubro o filho Renanzinho como governador de Alagoas, aos 34 anos.

 

 

Com esse retrospecto, um aliado de Renan desdenha da briga pública que o presidente do Senado travou esta semana com Eduardo Cunha, em torno do projeto que regulamenta a prática da terceirização no País. Para esse aliado, o maior problema de Renan não é com Cunha, mas com o próprio futuro.

 

Pela legislação, ele não poderá se candidatar novamente ao cargo. Tampouco terá condições políticas de ser ministro de Dilma Rousseff. Ele tem contra si cinco inquéritos no Supremo, três deles relacionados à Operação Lava Jato. 

 

 

Presidente do Senado, Renan Calheiros 

Presidente do Senado, Renan Calheiros 

 

 

O fato é que Renan perdeu força política. O peemedebista garantiu a Dilma um primeiro mandato sem sobressaltos no Senado, mas não foi recompensado à altura no segundo. Perdeu indicados na Transpetro e no Ministério do Turismo, que foi dado a um aliado de Cunha. Tampouco conseguiu alívio financeiro para seu filho governador, sua principal aposta para a manutenção da força do clã.

 

Assim, Renan tem tentado se reinventar com o único objetivo de sobreviver politicamente. O embate com Cunha é visto por aliados como um elemento desse processo. Ele já forjou um discurso da economia de gastos do Senado e, recentemente, fez uma atuação em defesa dos mais desfavorecidos.

 

Para quem em 2007 renunciou à presidência do Senado para não ter o mandato cassado, sob a acusação de ter despesas pessoais pagas por um lobista de uma empreiteira, e depois voltou ao comando da Casa duas vezes, a estratégia pode dar certo. Renan tem experiência em se reencontrar e tempo para isso. Em 2018, poderá concorrer à reeleição ou mesmo ao cargo ocupado pelo filho.