Às vésperas de completar cem dias do segundo mandato, a presidente Dilma Rousseff foi obrigada a entregar a articulação política do governo ao vice-presidente Michel Temer (PMDB), na tentativa de reduzir os danos provocados com a recusa do ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, também do PMDB, em assumir a função. 

Em um operação desastrada que durou pouco mais de 24 horas, Dilma conseguiu desagradar a uma ala do PMDB e enfraquecer o setor mais à esquerda do PT. No fim do dia, Temer acabou por salvar o governo de mais um vexame. 

O vice vai assumir as atribuições da Secretaria de Relações Institucionais, até então ocupada pelo petista Pepe Vargas, que entregou o cargo após o “vazamento” da notícia sobre sua saída. Pepe deve ser transferido para a Secretaria de Direitos Humanos, atualmente com Ideli Salvatti (PT), cotada agora para Correios. 

Pelo novo desenho do “núcleo duro” do Palácio do Planalto, as funções da Secretaria de Relações Institucionais serão incorporadas pela Vice-Presidência da República. Com isso, o número de ministérios passará de 39 para 38. Dilma prometeu a Temer que ele terá autonomia para negociar com o Congresso.

O ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, disse que Temer, presidente do PMDB, é “leal ao projeto e a Dilma”. Destacou, ainda, que ninguém melhor do que ele para ajudar a amenizar a crise política e a aprovar o ajuste fiscal no Congresso.

“Todos reconhecem que foi uma solução política que ajuda bastante na interlocução, no diálogo, nas pontes, no fortalecimento da base aliada e, mesmo, na interlocução com outras forças políticas de oposição”, afirmou Mercadante.

Temer, porém, não foi a primeira escolha de Dilma. Na segunda-feira, ela convidou o titular de Aviação Civil Eliseu Padilha, amigo do vice-presidente, para assumir a articulação política no lugar de Pepe. Ao fazer a oferta, Dilma tinha a intenção de conciliar os interesses dos grupos do PMDB que comandam a Câmara e o Senado para aplacar a revolta do partido e aprovar o ajuste fiscal.

Tudo foi por água abaixo quando a informação sobre o convite a Padilha “vazou” enquanto Pepe ainda exercia suas funções. Para piorar, Padilha acabou recusando o convite, alegando motivos pessoais. 

Àquela altura, no entanto, Dilma já tinha conversado com Pepe, que entregou o cargo e não escondeu sua mágoa. A presidente se desculpou e elogiou o petista. “Essa conta é nossa, não é sua. Mas preciso desse cargo para o PMDB”, disse ela. 

A troca de Pepe é a terceira que Dilma se viu obrigada a fazer no primeiro escalão desde que assumiu o segundo mandato, em 1.º de janeiro. A primeira foi Cid Gomes (PROS), que deixou a Educação após dizer que a Câmara tinha “de 300 a 400 achacadores”. Depois foi o ministro da Comunicação Social, Thomas Traumann, defenestrado após o “vazamento” de um texto que apontava “caos político” no governo.

Em público, os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), elogiaram a mudança. Nenhum dos dois, porém, comprometeram-se a dar trégua ao Planalto nem a apoiar o ajuste fiscal.

“Não há dúvida de que a articulação política vai melhorar. Não dá nem para comparar. É como fazer um jogo de futebol e botar determinados tipos diferentes de atleta jogando”, afirmou Cunha. “Ninguém melhor do que Michel para exercer a tarefa neste momento complexo da vida nacional do PMDB”, disse Renan.

 

Oposição aproveita governo frágil e apresenta três CPIs

 

A oposição aproveitou ontem a fragilidade política da presidente Dilma Rousseff no Senado e apresentou três pedidos de instalação de comissão parlamentar de inquérito (CPI). Com apoio de um grupo de "independentes", o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) pediu investigação de suspeitas de irregularidades em fundos de pensão. O tucano conseguiu recolher o apoio de 32 senadores, cinco a mais do que o mínimo necessário para ser protocolado.

De acordo com o requerimento de CPI, o pedido tem por objetivo "apurar irregularidades e prejuízos na administração de recursos financeiros em entidades fechadas de previdência complementar nas sociedades de economia mista e empresas controladas direta ou indiretamente pela União, ocorridas a partir de 2003, envolvendo os Fundos de Pensão Previ, Petros, Funcef e Postalis, cujos participantes são, respectiva e principalmente, funcionários do Banco do Brasil, da Petrobrás, da Caixa Econômica Federal e dos Correios".

Já o senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO) apresentou um requerimento de abertura de CPI para investigar suspeitas de irregularidades em julgamentos realizados no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão colegiado do Ministério da Fazenda responsável por apreciar autuações fiscais que se tornou alvo da Operação Zelotes. O pedido de abertura da comissão contou com o apoio de 32 senadores, tanto da oposição como governistas.

O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), apresentou o terceiro pedido de abertura de CPI do dia, desta vez para investigar operações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Bandeira da oposição desde o fim do ano passado, a comissão visa apurar suspeitas de irregularidades nos empréstimos concedidos pelo BNDES a entidades privadas, assim como a governos estrangeiros, a partir de 2007. O requerimento de criação da CPI foi apresentado com o apoio de 28 senadores, apenas um a mais do que o mínimo necessário para sua instalação.

As CPIs, contudo, só serão instaladas após o cumprimento de critérios como a leitura de cada um dos requerimentos em plenário, manutenção até a meia-noite do dia da leitura de pelo menos 27 assinaturas em cada comissão e a indicação dos líderes partidários dos indicados de cada legenda para a CPI.