Título: Novo setor, velhos problemas
Autor: Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 01/08/2011, Cidades, p. 18

Expansão do Setor de Autarquias Norte começa a sair do papel, mas o projeto viário e a previsão de vagas de estacionamento para a região são da década de 1970. Defasagem pode gerar transtornos já conhecidos dos brasilienses, como o caos no trânsito

Falta de vagas, de áreas verdes e a ausência de calçadas são algumas das principais reclamações de quem circula pela Área Central de Brasília. Os setores comerciais, de autarquias, bancários e de diversões Sul e Norte estão entre as regiões mais caóticas do Distrito Federal, e encontrar estacionamento nesses locais é missão praticamente impossível. Os problemas urbanísticos do centro da cidade são exemplos de um planejamento que deu errado. E essas falhas podem se repetir agora, 50 anos depois da inauguração da capital. A última área vazia do centro de Brasília começa a ser ocupada, mas as regras para construção e o projeto viário dos terrenos datam de 1970. Se não houver mudanças nos planos de ocupação, todos os problemas se repetirão.

A expansão do Setor de Autarquias Norte começou a sair do papel este ano. No local, haverá duas quadras novas com oito terrenos, que vão abrigar escritórios particulares e prédios de órgãos públicos, como a Receita Federal e a Polícia Federal. O projeto urbanístico da expansão do setor, que tem mais de 40 anos, prevê um número pequeno de vagas de estacionamento e uma única entrada para a área, pela comercial da 201/202 Norte ¿ que já tem o trânsito lento nas horas de pico. Não há previsão da construção de edifícios garagem, o que poderia amenizar o transtorno dos motoristas que circularão por esse setor no futuro.

Pelo menos três projetos já chegaram para análise na Administração Regional de Brasília e dois alvarás de construção foram emitidos. Um prédio de salas e escritórios, que terá 17 andares, está em fase avançada e é possível acompanhar os funcionários trabalhando com rapidez. O edifício, que abrigará a Confederação Nacional do Comércio (CNC), começou a ser erguido em um dos lotes da expansão do Setor de Autarquias Norte. As fundações e as escavações estão em andamento.

O terceiro projeto pronto é o da nova sede da Polícia Federal. Mas esse processo ainda está em análise e os técnicos ainda não emitiram o alvará de construção. Os outros lotes vagos também são de repartições públicas. Eles pertencem ao Superior Tribunal Militar (STM), à Receita Federal e à Embratur. A Secretaria de Patrimônio da União é dona de duas projeções, que poderão ser destinadas a qualquer órgão público que futuramente precisar de espaço para abrigar seus funcionários.

O técnico em Gestão e Planejamento Urbano da Administração Regional de Brasília Luís Armando Almeida explica que o governo exige a construção de pelo menos uma vaga de estacionamento subterrâneo para cada 50 metros quadrados de área construída. Ele reconhece que essa norma está defasada e que seria necessário exigir um número superior de vagas. "Mas temos que seguir a legislação em vigência. Qualquer alteração das normas de gabarito, que são da década de 1970, deverá partir da Secretaria de Desenvolvimento Urbano", explica Armando. Para ele, se todos os prédios previstos forem construídos com base na legislação antiga, a expansão do Setor de Autarquias Norte será "ainda mais caótica" do que outras áreas centrais, como o vizinho Setor de Autarquias Sul.

As quadras 1, 2 e 3 do Setor de Autarquias Sul são antigas e estão parcialmente consolidadas. Lá estão órgãos públicos como o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), a Petrobras e o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). As novas quadras que estão sendo ocupadas agora são as de número 4 e 5.

Garagem extra Um dos empreendimentos já em construção na expansão do Setor de Autarquias Norte é um conjunto de três torres de escritórios, de 16 andares cada. O negócio é uma parceria entre a Via Engenharia e a Tishman Speyer, empresa com atuação nos Estados Unidos, na Europa, na América Latina e na Ásia. Ao todo, serão investidos R$ 500 milhões nesse empreendimento que, segundo as empreiteiras, será o primeiro "prédio verde" do Distrito Federal.

O diretor de Construções Especiais da Via Engenharia, José Luís Wey de Brito, comenta que a expansão do Setor de Autarquias Norte é a última grande área vazia do centro de Brasília e, por isso, será uma região privilegiada. Ele afirma que, apesar de a legislação que normatiza as construções serem antigas, o empreendimento em obras já foi planejado para evitar problemas como a falta de vagas. José Luís conta que as torres terão 2 mil vagas distribuídas em quatro subsolos, número superior ao exigido pela lei. "Sabemos que Brasília tem um problema muito sério de falta de estacionamento e de transporte urbano. Elaboramos o projeto para oferecer um grande número de vagas e, dessa forma, atender um número maior do que a demanda que essas torres de escritórios terão", afirma o executivo da empresa.

José Luís Wey de Brito destacou a necessidade de mudança urgente no projeto dos estacionamentos públicos e do sistema viário do Setor de Autarquias Norte. "Quando estiver totalmente ocupado, o setor vai receber pelo menos 50 mil pessoas por dia. O projeto da área é antigo, foi feito na década de 1970 e não atende às necessidades básicas de motoristas e pedestres. É preciso discutir a revisão desse projeto para deixar o Setor de Autarquias moderno e atual. Assim, será possível evitar problemas de outras áreas centrais", cobra o diretor da Via Engenharia.

Novos acessos A Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação informou que já está em estudo a alteração do projeto das novas quadras do Setor de Autarquias Norte. A ideia é mudar o sistema viário, com a criação de novos acessos para a área e com a ampliação significativa do número de vagas públicas. "Se isso não for alterado, certamente haverá um colapso na Asa Norte", justifica o diretor do Conjunto Urbanístico Tombado da secretaria, Graco Melo Santos.

Sobre mudanças no quantitativo de vagas obrigatórias no subsolo dos prédios, ele diz que ainda não há estudos sobre isso, mas garante que esse assunto poderá ser tratado durante a elaboração do Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília e valeria apenas para os empreendimentos novos. "O projeto incluía um único acesso pela comercial. Nosso estudo prevê uma ligação com o Setor Bancário Norte e com a primeira etapa do Setor de Autarquias Norte", afirma Graco.

A comunidade das quadras vizinhas está preocupada. "Nossa esperança é que todos os prédios novos tenham muitas vagas subterrâneas, porque senão todas as pessoas que visitarem esses edifícios vão ocupar os espaços da nossa quadra residencial", comenta a prefeita Comunitária da 402 Norte, Ana Lúcia Mendes.

Funcionários que trabalham em outras áreas centrais também falam sobre a necessidade de uma grande oferta de vagas. "Aqui no Setor de Autarquias Sul, a gente tem que deixar o carro com flanelinha ou correr o risco de receber multa. Isso tem que mudar em Brasília", afirma a servidora pública Cláudia Alencar, que trabalha na Quadra 1 do setor. Para o funcionário público Ítalo Cunha, 28 anos, o governo deveria ser mais rígido na aprovação de projetos. "Não deveriam liberar a construção de prédios sem garagem para todo mundo. Senão ficamos sem nenhuma opção", ressalta.

Abaixo-assinado As antigas quadras do Setor de Autarquias Norte já sofrem com a falta de infraestrutura urbana. Funcionários dos órgãos públicos ali instalados reclamam da falta de ponto de ônibus e de furtos e de roubos no local. Pelo menos 2,5 mil pessoas fizeram um abaixo-assinado para pedir melhorias para a área.