O brasileiro Rodrigo Gularte, de 42 anos, foi executado ontem na Indonésia por tráfico de drogas. Ele é o segundo brasileiro fuzilado naquele país este ano pelo mesmo crime. A família de Gularte trará seu corpo para ser enterrado no Brasil, atendendo a seu último pedido para não ser cremado na Indonésia. A filipina Mary Jane Veloso foi excluída do pelotão de fuzilamento depois que uma mulher que a contratara para transportar droga se entregou à polícia. O governo brasileiro classificou a execução de Gularte de “fato grave” na relação entre os dois países. - CILACAP, INDONÉSIA- O brasileiro Rodrigo Gularte, de 42 anos, foi executado ontem na Indonésia, junto a outros sete condenados por tráfico de drogas presos no país. Gularte foi o segundo brasileiro a ser executado no país este ano. Em janeiro, foi fuzilado Marco Archer, de 53 anos, também condenado por tráfico de drogas. O governo brasileiro considerou a execução “um fato grave no âmbito das relações entre os dois países”. A família de Gularte vai enterrálo no Brasil, atendendo a seu último pedido para que não fosse cremado na Indonésia. O corpo será transladado, mas o Itamaraty não confirmou se irá arcar com os custos. 

Segundo a BBC Brasil, durante o encontro final com parentes, Gularte deixou um recado para a família: “Daqui irei para o céu e ficarei na porta esperando por vocês”, afirmou o brasileiro, de acordo com o encarregado de negócios do Brasil em Jacarta, Leonardo Carvalho Monteiro, maior autoridade brasileira na Indonésia, desde que o embaixador Paulo Soares voltou ao Brasil em março.

Monteiro acompanhou os disparos da execução à distância, ao lado de Angelita Muxfeldt, prima de Gularte. O fuzilamento ocorreu por volta de 0h25m (horário local, 14h25m em Brasília).

— Foram vários tiros fortes e ao mesmo tempo — contou o encarregado.

Depois de fazer a última visita a Gularte, Angelita disse à TV Globo que ele não sabia que poderia ser executado a qualquer momento. Perguntada sobre como Rodrigo estava, ela respondeu:

— Ele está calmo. Está bem tranquilo — disse ela, indicando que não havia comentado nada sobre a proximidade da execução: — Não, não (falei sobre o que aconteceria) — repetiu, abalada.

Conselheiro espiritual de Rodrigo Gularte, o pastor Romu Carolus também foi ao presídio para tentar confortar o brasileiro.

ITAMARATY CONDENA FUZILAMENTO

Em mensagem transmitida pelo secretário-geral de Relações Exteriores, Sérgio França Danese, o governo brasileiro condenou a execução e afirmou que o caso “fortalece a disposição brasileira de levar adiante, nos organismos internacionais dedireitos humanos, os esforços pela abolição da pena capital”.

— Nós achamos que essa segunda execução constitui novamente um fato grave no âmbito das relações entre os dois países. São relações que ambos os governos haviam qualificado de estratégicas. Mas, obviamente, o fato de que tantos apelos presidenciais tenham permanecido sem uma resposta satisfatória para nós, da parte do governo da Indonésia, é algo que deve ser avaliado. Nós estamos justamente procedendo a essa avaliação, sobre qual será a atitude a adotar em relação a esse país. Um país que é um importante parceiro na Ásia, um país que nós consideramos estratégico — afirmou Danese.

Na mesma nota lida pelo embaixador, o governo diz ter recebido com “profunda consternação” a notícia da morte de Gularte e transmite “sua solidariedade e seu mais profundo presar” à família do executado.

Em Bogotá, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, lamentou o fato de a Indonésia não ter aceitado os pedidos para não executar o brasileiro:

— Nunca contestamos a acusação, nem o processo judicial e respeitamos a soberania da Indonésia. Porém, sempre contestamos a aplicação da sentença, por questões humanitárias. Lamentamos que o governo da Indonésia não tenha acatado nossos argumentos e que, nessas condições, tenham executado o brasileiro Rodrigo Gularte.

FILIPINA FOI POUPADA

Segundo Danese, desde a prisão de Gularte e de Archer, o governo brasileiro encaminhou sete cartas ao presidente da Indonésia pedindo alternativas legais à pena de morte. A última correspondência foi enviada por Dilma Rousseff em 9 de fevereiro. Segundo o embaixador, ela fez um apelo veemente para que Gularte não fosse executado. Além disso, a presidente também fez uma ligação, em 16 de janeiro, para o presidente Joko Widodo, na qual transmitiu preocupação com a situação dos brasileiros.

O último pedido para suspender a sentença foi feito no último domingo, quando o Itamaraty encaminhou uma nota ao representante da Embaixada da Indonésia no Brasil. No documento, o governo brasileiro considerava “inaceitável a possibilidade de execução nacional do brasileiro” e se comprometia a “cooperar no combate ao consumo e tráfico de drogas” para que Gularte não fosse executado.

Das nove pessoas que seriam fuziladas ontem, apenas a filipina Mary Jane Veloso foi poupada depois que uma suposta traficante que a recrutou para transportar drogas se entregou à polícia das Filipinas. Mary Jane, que foi para a Indonésia trabalhar como empregada doméstica, alega que foi enganada por organização criminosa que teria arranjado o emprego para ela no país e colocado 2,6 quilos de heroína na mala dela.

— A execução de Mary Jane foi adiada porque houve um pedido do presidente filipino relacionado a um suspeito de tráfico humano que se rendeu nas Filipinas. Ela foi chamada a depor — disse o porta-voz do procurador-geral indonésio, Tony Spontana.

Presa em 2006, a filipina é mãe de dois filhos. A única mulher do grupo afirmou em defesa que foi enganada por uma agência de recrutamento, após chegar à Indonésia para trabalhar como empregada doméstica. Segundo Mary Jane, de 30 anos, um amigo que integrava uma associação criminosa foi quem colocou os 2,6kg de heroína achados no forro de sua bolsa.

A prisão de segurança máxima na ilha Nusakambangan, situada ao largo da costa de Java, teve reforço na proteção. Conselheiros religiosos, médicos e o pelotão de fuzilamento foram alertados para iniciar os preparativos finais para a execução, e uma dúzia de ambulâncias, algumas carregando caixões cobertos de cetim branco, chegaram ao local.

DRAMA DOS PARENTES

Os nove condenados, incluindo a filipina que teve sua execução suspensa, tiveram encontros de despedida emocionados com suas famílias na prisão, depois que o governo indonésio já havia rejeitado todos os apelos de clemência de várias partes do mundo.

— Eu não vou vê- lo novamente — disse, chorando, Raji Sukumaran, a mãe do australiano Myuran Sukumaran. — Eles vão levá-lo à meia-noite e matá-lo. Estou pedindo ao governo que não o mate. Por favor, não o mate hoje.

Centenas de pessoas se reunir em diferentes cidades da Austrália para vigílias por Myuran e Andrew Chan, portando cartazes e pedindo que a Austrália dê uma forte resposta ao país vizinho.

As penas de morte foram condenadas pela Organização das Nações Unidas (ONU) e abalaram os laços da Indonésia com o Brasil e a Austrália.

Em meio a cenas dramáticas fora da cadeia, um membro de uma das famílias australianas desmaiou e foi levado pela multidão.

— Eu hoje vivi algo pelo qual nenhuma outra família deveria ter que passar. Nove famílias dentro de uma prisão dizendo adeus a seus entes queridos. É uma tortura — disse o irmão de Chan, Michael.

Na segunda-feira, autoridades da indonésia concederam o último desejo do australiano Chan, que era se casar com sua namorada indonésia na prisão.