Valor econômico, v. 15, n. 3730, 07/04/2015. Finanças, p. C2

 

 

Mercado de trabalho adia aposta de alta de juro nos EUA

 

Roberta  Costa

Com os números muito fracos de criação de vagas de trabalho em março nos Estados Unidos, não será surpresa se o mercado financeiro postergar suas apostas sobre a primeira elevação de juros pelo Federal Reserve (Fed).

Já há quem tenha alterado suas convicções de que isso ocorra em 2015 - não por este único mês de resultados ruins, mas porque a conjuntura talvez exija mais paciência do BC americano.

Será interessante, portanto, observar nas próximas semanas, a partir da divulgação da ata da última reunião do Fomc (comitê de mercado aberto do Fed) na quarta-feira, como será o desenho dessas expectativas. Em outras palavras: como a estrutura da curva de juros americana se comporta e como serão divididas as apostas. Isto é sensível para o comportamento do dólar em relação às demais moedas fortes e emergentes e para os preços das commodities.

Recentemente, na reunião de março, a presidente do Fed, Janet Yellen, disse que o fato de a palavra "paciente" (no que se refere à manutenção/fim dos estímulos) ter sido retirada do comunicado não queria dizer que a autoridade monetária estivesse "impaciente" - ou com pressa de subir os juros. Essa explicação não é redundante, como poderia parecer. O Fed caminha em uma linha fina entre a necessidade de normalizar a política monetária e agir com o menor risco possível de antecipar o aperto de forma a colocar anos da semeada recuperação a perder.

O número fraco de vagas criadas teve explicações pontuais, como o clima rigoroso no Nordeste e no Centro-Oeste do país, e sua evolução é que vai definir se há uma reversão da tendência de melhora observada nos últimos anos. Mas "é provável que o primeiro trimestre seja muito fraco", disse ontem o presidente do Fed de Nova York, William Dudley, que revelou que o Fed de Nova York projeta crescimento do PIB de apenas 1% nos três primeiros meses do ano. Ele também destacou como riscos ao crescimento dois fatores presentes nos últimos meses: o petróleo e o dólar. "A queda acentuada dos preços do petróleo bruto poderá levar a uma nova redução acentuada do investimento em petróleo e gás; além disso, o aumento significativo do valor do dólar pode levar ao enfraquecimento do desempenho comercial dos Estados Unidos."

A trajetória da inflação, bastante atrelada a tais fatores conjunturais, deve ser de elevação lenta em direção à meta de 2%. "A combinação de expectativas estáveis e diminuição da folga [na economia] deve empurrar a inflação lentamente de volta para o objetivo do Fomc."

Segundo Dudley, para os mercados financeiros, o ritmo das taxas de curto prazo após a primeira elevação do juro básico é tão importante quanto o momento da elevação e, para ele, o caminho será relativamente gradual. "O quão rápido o processo de normalização prosseguirá depende principalmente de dois fatores: como a economia evolui e como as condições do mercado financeiro respondem aos movimentos da taxa dos fed funds", comentou.

"Se as condições do mercado financeiro não apertarem muito em resposta às taxas de juro de curto prazo mais elevadas, poderemos ter que nos mover mais rapidamente. Afinal de contas, o motivo para o aumento das taxas de juro de curto prazo é exercer alguma contenção nas condições do mercado financeiro. Em contrapartida, se as condições financeiras apertarem indevidamente, então isso provavelmente vai nos levar a ir muito mais lentamente ou até mesmo fazer uma pausa por um tempo", pontuou o banqueiro.

Dudley, que tem direito a voto no Fomc, mantém perspectiva otimista sobre a economia, dizendo que a taxa de desemprego está em um ponto em que os salários podem começar a subir e darão mais apoio à atividade. No mais, indicadores sugerem que o processo de desalavancagem das famílias está fortemente em curso e os desequilíbrios no setor imobiliário menores. A consolidação fiscal está feita e o emprego e gastos devem crescer tanto em nível local quanto federal.