Propina foi entregue em frente à sede do PT, afirma doleiro

Ricardo Brandt

Mateus Coutinho

 

O doleiro Alberto Youssef, peça chave da Operação Lava Jato, reafirmou à Justiça Federal que entregou cerca de R$ 800 mil em dinheiro vivo para o tesoureiro do PT João Vaccari Neto – metade desse valor, segundo ele, na porta do diretório nacional do partido, localizado na Rua Silveira Martins, coração de São Paulo.

Em novo depoimento, agora nos autos do processo sobre operações ilícitas de câmbio realizadas pelo laboratório Labogen – empresa que ele tentou infiltrar no Ministério da Saúde na gestão do então ministro Alexandre Padilha (PT) -, o doleiro declarou que “a mando da Toshiba (Infraestrutura)” fez dois pagamentos para o tesoureiro do PT.

O dinheiro, segundo Youssef, teve origem em uma contratação para obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), entre 2009 e 2010. “O primeiro valor foi retirado no meu escritório da (rua) Renato Paes de Barros (São Paulo) pela cunhada dele (Vaccari)”, declarou Youssef, referindo-se à Marice Corrêa Lima, perante o juiz federal Sérgio Moro, que conduz todas as ações penais da Lava Jato. “Eu entreguei esse valor pessoalmente. O segundo valor foi entregue na porta do diretório do PT nacional pelo meu funcionário Rafael Ângulo para o funcionário da Toshiba para que ele pudesse entregar o valor para o Vaccari.”

O sr. sabe o nome do funcionário da Toshiba?, perguntou um advogado na audiência. “Piva”, respondeu o doleiro.
É a primeira vez que o doleiro relata esse episódio à Justiça. Anteriormente, em um depoimento prestado à força-tarefa da Lava Jato, Youssef havia declarado que uma parte da propina foi levada ao próprio tesoureiro em uma “sacola lacrada” em restaurante perto da Avenida Paulista.

No dia 3 de fevereiro, porém, perante a delegada da Polícia Federal Erika Mialik Marena e os procuradores da República Carlos Fernando Santos Lima e Januário Palludo, o doleiro prestou depoimento complementar no âmbito da delação premiada que firmou. Na ocasião, foi indagado a dar mais detalhes sobre “as operações financeiras em que destinou valores para João Vaccari Neto”.

“Houve dois pagamentos (para ele, Youssef) pela empresa Toshiba, por conta de um contrato que esta havia conseguido com a Petrobrás”, disse o doleiro. “Parte desses pagamentos deveria ser destinada ao Partido dos Trabalhadores. Um primeiro recebimento por um emissário do PT foi feito direto no meu escritório na Rua Renato Paes de Barros em São Paulo pela pessoa identificada como Marice, sendo que somente após a minha prisão na Operação Lava Jato vim a saber se tratar de cunhada de João Vaccari.”

Segundo ele, Marice Corrêa Lima “entrou pela garagem do prédio”.

“Quando da necessidade de efetuar um segundo pagamento por conta dos depósitos da Toshiba, a pessoa de Piva, representante da Toshiba com quem eu tratava, havia pedido para providenciar a entrega da parte do PT em um restaurante no qual (Piva) se encontraria com Vaccari. Então, Rafael Ângulo, meu empregado, foi designado para levar o dinheiro no restaurante.”

Youssef anotou que “posteriormente tomou conhecimento que no meio do caminho Rafael foi orientado a entregar o dinheiro diretamente na sede do PT em São Paulo, tendo entregue os valores na porte da sede do partido para Piva, que lá se encontrava”.

Na audiência desta terça feira, 31, na Justiça Federal do Paraná, Youssef reiterou sua versão sobre os dois pagamentos e os locais onde ocorreram, tendo Vaccari como destinatários. Um advogado indagou de Youssef qual era o papel dele no esquema de pagamento de propinas e favores a agentes públicos e políticos. “Eu era uma mera engrenagem, totalmente descartável. A partir do momento que não cumprisse com as obrigações, não recebesse e pagasse em tempo hábil os valores de maneira correta, no outro dia eu estava fora. Poderiam contratar qualquer outra pessoa para fazer esse trabalho.”

O tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, por meio de seu advogado, o criminalista Luiz Flávio Borges D’Urso, repudia taxativamente as acusações. D’Urso tem reiterado que o tesoureiro só arrecadou quantias declaradas à Justiça eleitoral. O criminalista rechaça o valor dos depoimentos prestados em regime de delação premiada. Segundo D’Urso, os delatores “não dizem a verdade”.

O PT tem reafirmado que todos recursos arrecadados têm origem lícita. A Toshiba nega pagamento de propinas a políticos.

 

PSDB comanda CPI e antecipa ida de Vaccari

 

Com apoio do PMDB, a oposição conseguiu antecipar o depoimento do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, para a próxima semana. O petista é réu em ação no âmbito da Operação Lava Jato por corrupção e lavagem de dinheiro.

O presidente da CPI, Hugo Motta (PMDB-PB), não estava presente na sessão de ontem (31), por ter ido à Itália em viagem pessoal. A sessão foi comandada pelo tucano Antônio Imbassahy (BA). Como presidente da CPI, o deputado do PSDB pode decidir o calendário de trabalhos da comissão e propôs ouvir Vaccari no dia 9, o que irritou o PT.

Para o relator da CPI, Luiz Sérgio (PT-RJ), a pressa de Imbassahy para convocar Vaccari se deve às manifestações contra o governo marcadas para o dia 12. “Acho que o atropelo é para obedecer a uma lógica política. Esta CPI, com objetivo de investigar, não pode se submeter a pautas externas. Essa modificação, ao meu ver, obedece a essa lógica”, afirmou.

Luiz Sérgio disse que havia combinado com Motta por mensagem de celular, na noite de segunda-feira, que Vaccari seria ouvido em 23 de abril. Em um primeiro momento, a assessoria do peemedebista confirmou a data, mas depois recuou. Segundo fontes, Motta já havia acertado com o PSDB a ida de Vaccari no dia 9.

Pelo calendário apresentado por Imbassahy, o empresário Augusto Mendonça, da Toyo Setal, será ouvido no dia 14. Luiz Sérgio tentou inverter essa data com a de Vaccari, mas não obteve sucesso. Na terça-feira, será tomado o depoimento de Hugo Repsold, novo diretor de Gás e Energia da Petrobrás.

Depoimento

Ontem (31), em mais de seis horas de depoimento, o ex-gerente-geral de Implementação de Empreendimentos para a refinaria de Abreu e Lima Glauco Legatti negou ter recebido propina e se disse apunhalado pelas costas por seu “amigo pessoal”, o empresário Shinko Nakandakari. “Não tenho medo de ser preso porque não tenho por que ser preso”, afirmou. “Não recebi nada do senhor Nakandakari. Não sei se ele se aproveitou da amizade que tinha comigo para obter vantagens junto à empresa.”

Nakandakari disse em delação premiada ter pago a Legatti R$ 400 mil em propinas durante um ano. À força-tarefa do Ministério Público Federal, o empresário disse ter oferecido o suborno “na cara e na coragem” para que o ex-gerente-geral aprovasse aditivos aos contratos das obras da refinaria.

Legatti disse que tinha relacionamento “estritamente profissional” com o ex-gerente Pedro Barusco, de quem foi subordinado. Ele afirmou nunca ter atuado sob o comando do ex-diretor Paulo Roberto Costa e negou conhecer Vaccari ou o doleiro Alberto Youssef. Legatti disse que só soube do esquema na Petrobrás através dos jornais.

 

 

Offshore vinculada a Odebrecht fez repasse para Duqu

A conta que era controlada pelo ex-diretor de Engenharia e Serviços da Petrobrás Renato Duque no Principado de Mônaco recebeu em novembro de 2009 dois depósitos da offshore Constructora Internacional Del Sur S.A., apontada como detentora da conta usada pelo grupo Norberto Odebrecht para fazer pagamentos de propina ao esquema de corrupção na estatal desbaratado pela Operação Lava Jato.

Na conta de Duque aberto em nome da offshore Milzart Overseas Holdings Inc., do Panamá, foi feito o repasse de US$ 875 mil. 

Análise das movimentações financeiras da conta de Duque – que foi bloqueada pela Justiça de Mônaco – mostram dois depósitos feitos pela Constructora Internacional Del Sur S.A.: de US$ 290 mil, no dia 17 de novembro, e outro de US$ 584,7 mil, dez dias depois.

A determinação de bloqueio da conta de Duque  em Mônaco registra em uma tabela os depositantes, bem como os bancos de onde vieram os valores. No caso da Constructora Internacional Del Sur, a conta era no Credicorp Bank, em Genebra.

VEJA DOCUMENTO DE MÔNACO SOBRE CONTA DE DUQUE

Em novo depoimento à Justiça Federal, o doleiro Alberto Youssef, um dos alvos centrais da Lava Jato, confessou que a Odebrecht pagava propina e apontou a Construtora Internacional Del Sur como offshore usada para remessas ao exterior. “Odebrecht e Braskem (sociedade entre a empreiteira e a Petrobrás) era comum fazer esses pagamentos (de propina) lá fora, ou ela me entregava em dinheiro vivo no escritório da São Gabriel”, afirmou o doleiro em audiência na Justiça Federal no Paraná nesta terça-feria 31.

“Uma vez recebi uma ordem, não me lembro se foi em uma das contas indicadas por Carlos Rocha (doleiro Carlos Alberto Souza Rocha, também alvo da Lava Jato) ou Leonardo (Meirelles, outro réu da operação), da Odebrecht que a remessa foi feita pela construtora Del Sur”, relatou. Segundo o Youssef, ele teria recebido pagamentos por meio dessa empresa “umas duas ou três vezes”.

Trecho de documento de Mônaco com bloqueio de conta de Renato Duque

Trecho de documento de Mônaco com bloqueio de conta de Renato Duque

Ex-gerente. A offshore Construtora Internacional Del Sur tinha sido apontada na delação premida do ex-gerente de Engenharia da Petrobrás Pedro Barusco – que era braço direito e contador de Duque no esquema de propina. Segundo ele, a conta foi usada pela Odebrecht para o repasse de valores para uma conta sua Credit Corp Bank AS, de Genebra.

Barusco explicou o caminho da propina pago pela Odebrecht via offshore do Panamá. Entre maio e setembro de 2009, o delator indicou que a Odebrecht transferiu US$ 916.697,00 para a conta da Constructora Internacional del Sur e depois repassou para sua offshore também do Panamá.

COM A PALAVRA, A ODEBRECHT

 

A Odebrecht reiteradamente tem repudiado com veemência as suspeitas lançadas sobre sua conduta. A empreiteira nega taxativamente ter pago propinas no esquema Petrobrás.

Em nota  divulgada anteriormente, quando seu nome foi citado, a Odebrecht destacou: ”A empresa não participa e nunca participou de nenhum tipo de cartel e reafirma que todos os contratos que mantém, há décadas, com a estatal, foram obtidos por meio de processos de seleção e concorrência que seguiram a legislação vigente”.