O barulho das panelas se volta contra o PT

Correio braziliense, n. 19972, dd/06/2015. Política, p. 2

Paulo de Tarso Lyra

 O fantasma do panelaço voltou a assombrar a presidente Dilma Rousseff e o PT. Ambos haviam decidido que ela não apareceria no programa da legenda ontem à noite, em cadeia nacional de tevê, para evitar desgastes. Não deu certo. Tão logo o programa começou a ser veiculado, panelas, apitos e até vuvuzelas explodiram em Brasília, São Paulo, Rio, Santos, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre e em outras grandes cidades do país. Se Dilma escapou do panelaço na noite de 1º de maio, quando abdicou da tradicional cadeia de rádio e televisão para concentrar-se em três vídeos nas redes sociais, a noite de ontem foi trágica para todos os envolvidos na decisão.

 
Pior. Governo e PT perceberam que a insatisfação contra a presidente e a legenda não arrefeceu, como falsamente havia sido avaliado após as manifestações de12 de abril — menores que as de 15 de março. Em Santos, até vuvuzelas, instrumentos barulhentos que marcaram a Copa da África do Sul, em 2010, foram ouvidas. Em Brasília, a barulheira, embora generalizada, foi maior no Sudoeste, em Águas Claras, no Octogonal, no Lago Sul e na Asa Norte. Além das panelas, gritos de “Fora Dilma” “Fora PT” e “Fora Lula” foram entoados durante toda a propaganda eleitoral.
 
Dilma e o PT decidiram que não seria adequado que ela aparecesse na propaganda. “Eu não quero fazer qualquer avaliação sobre esta decisão. Ela deve ter chegado à conclusão de que, neste momento, não seria bom para a imagem dela aparecer na propaganda do PT, o que não significa qualquer descolamento na relação”, minimizou o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).
 
Segundo o Correio apurou, a decisão de ontem foi tomada com base em pesquisas qualitativas (feitas com grupos selecionados de telespectadores) e essas avaliaram que, neste momento, a presença da presidente no programa do PT não ajudaria em nada a ela ou ao partido. “O programa mostrou todos os avanços promovidos pelo governo nos últimos anos. E quem é a presidente? A Dilma, todo mundo sabe disso”, esquivou-se um aliado da presidente.
 
Mas pessoas próximas à presidente, como o vice-presidente Michel Temer, alertaram Dilma que seria um erro ela não aparecer na propaganda do PT. “Ela não pode ficar acuada. Daqui a pouco, vão chegar à conclusão de que ela não pode mais sair à rua. Ela vai ficar presa no Planalto?”, indagou um aliado, inconformado.
 
O presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), classificou a propaganda de ontem como a “mais enganosa e fantasiosa peça de propaganda já produzida por um partido”. Para Aécio, além de esconder a presidente, a propaganda afirma que o PT está ao lado do trabalhador no mesmo dia em “que chegam à Câmara dos Deputados duas medidas provisórias assinadas pela presidente em que são claros os cortes de conquistas dos trabalhadores”. E conclui: “O programa do PT zomba da inteligência e desrespeita milhões de trabalhadores e de famílias que conhecem bem a realidade em que vivem”.
 
Constrangimento
Os petistas, que ao longo de todo o dia de ontem tiveram dificuldades em fechar o acordo interno para votar a favor da Medida Provisória nº 665 — que altera as regras trabalhistas e é a primeira MP do ajuste fiscal a ser apreciada pelo Congresso —, tentavam disfarçar o constrangimento. “Eu não assisti à propaganda”, disse o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE). “Estava concentrado o dia todo na negociação das MPs. Mas as pessoas que assistiram ao programa não vão ligar para o fato de a presidente Dilma não ter aparecido”, disfarçou um dos vice-líderes do governo na Câmara, Carlos Zarattini (PT-SP).
 
O presidente do Solidariedade e da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (SP), disse que a presidente está apavorada com a própria imagem. “Ela já não sabe o que fazer para não ser vaiada”, ironizou ele. Paulinho disse que postou, em seu Facebook, uma convocação de panelaço para ontem à noite, antes da concretização do protesto. “Tive quase 5 milhões de compartilhamentos e curtidas”, completou Paulinho.
 
A propaganda, além de enumerar ações dos governos nos últimos anos, apresentadas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, citou a corrupção sem mencionar a Petrobras ou a Operação Lava-Jato. No fim da inserção partidária, o presidente nacional da legenda, Rui Falcão, prometeu que qualquer filiado que for condenado com sentença transitada em julgado será expulso do PT. “O governo e o PT perderam a popularidade e a credibilidade. Por isso, decidiram esconder a presidente do programa partidário”, completou o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB).
* “As pessoas que assistiram ao programa não vão ligar para o fato de a presidente Dilma não ter aparecido”
(Carlos Zarattini (PT-SP), deputado federal)
 
* “O governo e o PT perderam a popularidade e a credibilidade. Por isso, decidiram esconder a presidente do programa partidário”
(Cássio Cunha Lima, líder do PSDB no Senado)
 
* “Ela (Dilma) já não sabe o que fazer para não ser vaiada”
(Paulo Pereira da Silva (SDD-SP), deputado federal)
 
Análise da notícia: Uma legenda perdida e acuada
 
O panelaço de ontem reforça a imagem de um PT acuado. Nas ruas, a cobrança pela ausência da postura ética e pela quebra das promessas de campanha. No Congresso, uma legenda perdida, que não consegue fechar questão na aprovação de uma medida provisória-chave para o governo que tem uma petista no poder. E que só consegue aprovar matérias “quando nós temos pena”, segundo as palavras jocosas do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

O PT abdicou da presidente Dilma Rousseff com cinco meses do segundo mandato. Lula foi o porta-voz das ações do Executivo e das estratégias do futuro. Mas como o cerne do problema não é Dilma, mas Lula e o PT, ele também foi vítima do panelaço.

Ao prometer a expulsão de qualquer filiado condenado por corrupção, o PT não faz qualquer menção aos detidos por causa do mensalão. Foi uma propaganda voltada aos militantes, ignorando os 200 milhões de brasileiros que o PT governa. (PTL)

Marta despista sobre futuro
A senadora Marta Suplicy disse ontem que ainda não decidiu para qual partido vai. Ela desfiliou-se do PT no fim de abril, sigla da qual fez parte por 33 anos. Segundo Marta, o martelo “não está batido” e a decisão não sairá em breve. “Posso ter até outubro para fazer isso. Não terá nenhuma decisão em breve”, afirmou.  O PSB ofereceu à Marta a candidatura para disputar a Prefeitura de São Paulo em 2016. O presidente da legenda, Carlos Siqueira chegou a dar como “certa” a filiação de Marta. Em carta no dia em que se desfiliou do PT, Marta afirmou que foi “cerceada e limitada” ao tentar “uma linha de providências” para o partido resgatar seus fundamentos. A saída dela acabou vista por alguns petistas como uma tentativa de migrar para outra sigla e tentar novamente a prefeitura da capital paulista.  (Julia Chaib)