Economistas apontam queda de até 3,5% no PIB no primeiro trimestre

Luiz Guilherme Gerbelli

Márcia de Chiara

 

As previsões econômicas para o primeiro trimestre indicam que o desempenho da economia brasileira foi muito pior do que o esperado. A rápida deterioração dos indicadores econômicos pode ter levado o Produto Interno Bruto (PIB) - soma de todas as riquezas produzidas no País - a ter a maior queda trimestral em duas décadas.

Nas projeções de bancos e consultorias, a economia deve ter uma retração de 1,2% a 3,5% entre janeiro e março na comparação com o mesmo período de 2014. Se o resultado mais pessimista for confirmado, será a mais brusca queda trimestral do PIB em bases anuais desde o primeiro trimestre de 1992. Naquela época, com o País envolvido nas denúncias de corrupção que tirariam do poder o presidente Fernando Collor de Mello, a economia brasileira encolheu 3,2% (ver quadro).

 

 

Na sexta-feira, 17, o diretor do Departamento de Hemisfério Ocidental do Fundo Monetário Internacional (FMI), Alejandro Werner, disse, em Washington, que o Brasil está passando pela mais séria desaceleração da economia desde o começo dos anos 90.

“Embora faltem alguns dados econômicos de março, todos os indicadores mostram um comportamento bastante negativo no primeiro trimestre”, afirma Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria Integrada. Ela estima uma retração de 3,5% no primeiro trimestre ante o mesmo período de 2014.

Há uma combinação perversa que tem levado a essa retração: a economia brasileira enfrenta um duro ajuste fiscal, a inflação está elevada - em abril, o IPCA-15 chegou a 8,22% em 12 meses, nível mais alto desde janeiro de 2004 -, o mercado de trabalho começou a dar sinais de piora, o investimento se tornou anêmico e o desempenho da indústria e dos serviços piorou. O que já era ruim foi agravado pelos desdobramentos da Operação Lava Jato, que investiga contratos da Petrobrás e levou grandes construtoras à recuperação judicial, agravando o cenário do emprego. 

“Os problemas da Petrobrás e de toda a cadeia da construção pesada dão um quadro dramático para a economia brasileira no primeiro trimestre”, diz Julio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. Na avaliação dele, a economia pode ter recuado mais de 3% no primeiro trimestre. “Espera-se que o ajuste beneficie as expectativas lá na frente, mas ele deixa o crescimento ainda mais deprimido à medida que reduz o poder de compra da população com o aumento de impostos e promove o corte de gastos.” 

Serviços. O tamanho da piora econômica pode ser mensurado pelo setor de serviços. Em fevereiro, a receita nominal do setor cresceu apenas 0,8% na comparação com o mesmo mês de 2014, segundo o IBGE. Foi o menor avanço registrado desde o início da série histórica, em janeiro de 2012. “O encolhimento do setor de serviços é a grande novidade”, diz o diretor de Pesquisas da GO Associados, Fabio Silveira. Para o primeiro trimestre deste ano, ele projeta retração de 2,5% no PIB em relação a igual período de 2014.

O setor de serviços costumava ter uma inércia que atenuava a retração da atividade, mas agora não é possível contar com esse motor para retomar o crescimento da economia brasileira. 

“Além da desaceleração da indústria, estamos vendo na parte de serviços uma piora que não era comum no passado recente. O desempenho mais negativo ocorre tanto na parte de comércio como na de serviços ligados à indústria, transporte, e prestados à família”, diz Rodrigo Miyamoto, economista do Itaú. O banco projeta uma retração de 1,9% entre janeiro e março na comparação com o primeiro trimestre de 2014.

Na avaliação do diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, Octavio de Barros, o primeiro trimestre foi marcado por uma queda acentuada do consumo das famílias e uma forte retração dos investimentos, afetados pela construção civil e pela produção de bens de capital. Do lado da oferta, o PIB industrial deve mostrar estabilidade em relação ao trimestre anterior, enquanto o de setor de serviços deve seguir o comportamento do consumo das famílias, com queda de 1%. 

“Os dados recentes de atividade apontam para uma desaceleração profunda da economia brasileira nesse primeiro semestre”, diz Barros. Ele projeta queda do PIB de 2,1% no primeiro trimestre em relação a igual período de 2014. 

Futuro. A piora apurada no setor de serviços ampliou a expectativa de retração da economia e turvou o cenário para os próximos meses, segundo Thiago Biscuola, economista da RC Consultores - a consultoria prevê uma queda de 1,2% do PIB no primeiro trimestre. “O cenário deve piorar”, afirma

Barros acredita que a retração do primeiro trimestre deverá ser seguida por outra mais intensa no segundo trimestre, que, na projeção dele, deve marcar o pior momento do desempenho do PIB no ano. 

A avaliação de piora no quadro econômico no segundo trimestre é compartilhada por Silveira, da GO. “Será um primeiro semestre doloroso.”

 

Economia só deve iniciar uma reação no 2º semestre de 2016

 

A economia brasileira deve voltar a crescer, levando-se em conta o período acumulado de 12 meses, somente no segundo semestre de 2016. Na semana passada, projeções dos economistas do Fundo Monetário Internacional indicavam queda 1% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano e crescimento de 1% em 2016. 

“A barrigada será longa, só estamos no começo da freada”, afirma o economista da RC Consultores, Thiago Biscuola. Ele lembra que o varejo, sustentado pelo avanço do consumo das famílias que foi o motor do crescimento nos últimos tempos, deve registrar neste ano a primeira queda desde 2003. Além disso, o mercado de trabalho deve continuar cada vez mais fraco, com avanço das demissões.

“A atividade deve começar a se recuperar no segundo semestre de 2016. Os desafios que temos pela frente são imensos”, afirma o diretor de Pesquisas da GO Associados, Fabio Silveira. Ele observa que o resgate da credibilidade no mercado internacional já começou a ser sinalizado pelo controle dos gastos públicos, que está encaminhado. “Hoje as expectativas são mais favoráveis do que as de um mês atrás”, diz o economista, ressaltando que o desempenho da Bolsa espelha essa reação. Em 2015, o Ibovespa – principal termômetro do mercado acionário – subiu 7,89%.

Mas é consenso entre os economistas que o caminho será longo até que a atividade volte para o terreno positivo. A inflação em alta tira a força do consumo no mercado doméstico, que responde por 60% do PIB, e retarda a retomada do crescimento. Em 12 meses até abril, a inflação medida pelo IPCA -15, que é um indicador antecedente do índice cheio, acumula alta de 8,22%, o maior nível desde janeiro de 2004.

Silveira calcula, por exemplo, que o crédito destinado a pessoas físicas, um dos combustíveis do consumo, deve ter neste ano queda de 3%, descontada a inflação. Além disso, outro pilar do consumo, que é a massa salarial, deve avançar muito pouco, próximo de zero. “Os dissídios salariais estão cada vez menores”, lembra o economista.

Crise longa. Na avaliação de Biscuola, da RC Consultores, a crise atual será mais longa do que a de 2008/2009 porque envolve questões estruturais internas da economia brasileira.

“Na crise de 2008/2009, o que houve foi uma restrição no crédito no mercado internacional e o País teve capacidade de lidar com esse obstáculo e reagir rapidamente”, explica. Atualmente, no entanto, as restrições são mais severas e resultam de políticas macroeconômicas equivocadas, diz o economista. De um lado foi aplicada uma política monetária mais restritiva e, de outro, houve um afrouxamento na política fiscal.

O ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda Julio Gomes de Almeida acredita que a piora da economia brasileira “só está começando”. Uma mudança de perspectiva, afirma ele, só ocorreria se fosse encontrada uma solução que melhorasse o investimento da Petrobrás e a situação de toda a cadeia da construção pesada. 

Na visão dele, contudo, é difícil vislumbrar uma melhora “porque, por ora, não há porta de saída à vista.”. “O grande problema da atualidade é que, para onde você olha na economia tudo está amarrado. Qual é a porta de saída? Não tem, por ora. Qualquer antecipação é uma profissão de fé”, diz o ex-secretário de Política Econômica.