Senadores questionam indicado para o STF

Isadora Peron

 

O advogado Luiz Edson Fachin, indicado pela presidente Dilma Rousseff para vaga no Supremo Tribunal Federal, foi questionado nesta quarta-feira, 29, por senadores na primeira parte da análise da escolha de seu nome pela Casa. O senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) afirmou que Fachin continuou advogando enquanto ocupou cargo de procurador no Paraná, entre 1990 e 2006, o que é vetado pela Constituição daquele Estado.

O senador Álvaro Dias (PSDB-PR), que era governador do Paraná quando Fachin foi nomeado para o cargo, se atrapalhou na hora de defender o jurista e teve de ser acudido por assessores. No fim, disse que a atuação de Fachin estava amparada por uma lei de 1985, anterior à promulgação da Constituição estadual em 1989. 

O questionamento deu uma mostra da dificuldade que o jurista vai enfrentar para ser aprovado pela Casa. Apesar de o senador tucano ter apresentado um parecer favorável a Fachin na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), parlamentares atuaram para pôr em dúvida a idoneidade do nome indicado pela presidente.

Diante da dúvida levantada, o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) apresentou um requerimento para que fosse feita uma audiência pública com autoridades do meio jurídico do Paraná para esclarecer as questões sobre o currículo de Luiz Edson Fachin. 

Adiamento. Apesar de o pedido ter sido rejeitado pela maioria dos membros da CCJ, a oposição conseguiu adiar a realização da sabatina por uma semana, amparada numa questão regimental. Inicialmente marcada para a próxima quarta-feira, o escrutínio de Fachin deve ocorrer em 13 de maio. Depois, seu nome ainda tem de ser aprovado pelo plenário da Casa, em votação secreta. 

Normalmente, a leitura do parecer elaborado pelo relator num processo de indicação de autoridades a cargos públicos é um trâmite meramente burocrático. O tom acalorado que marcou a sessão da CCJ de ontem, e que promete se repetir na sabatina, é mais um sinal da resistência demonstrada em relação ao nome de Fachin. 

O principal temor do governo é de que o desgaste da relação de Dilma com o Congresso coloque em risco a aprovação do nome do jurista para a vaga aberta desde a aposentadoria de Joaquim Barbosa, no fim de julho do ano passado. 

Apesar dos esforços do senador Álvaro Dias para convencer os colegas tucanos da competência de Fachin, a estratégia do PSDB é trabalhar para que o nome do jurista seja recusado no plenário, para desgastar mais o governo. Na versão oficial, integrantes da oposição questionam se o futuro ministro teria imparcialidade para julgar casos envolvendo membros do PT, já que ele aparece em um vídeo pedindo voto para Dilma na campanha de 2010. Fachin tem histórico de boa relação com movimentos sociais.

Na base aliada, a indicação de Fachin também encontra resistência. Em pé de guerra com o Palácio do Planalto, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), não tem escondido a sua insatisfação com o nome escolhido por Dilma. 

Monitoramento. Ciente da dificuldade que será para que Fachin seja aprovado, o Planalto escalou interlocutores para monitorar o clima no Senado. Recém-empossado como líder do governo na Casa, Delcídio Amaral (PT-MS) foi avisado de que ajudar o governo a aprovar o nome de Fachin seria sua primeira missão à frente do posto. Dilma também teria pedido para que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, procurasse senadores para conversar sobre o assunto. 

Para os petistas, apesar da tensão, há número suficiente de senadores que apoiam Fachin. Isso só não aconteceria, alerta um senador do PT, se o PMDB arquitetasse uma “traição” contra o governo. Nomes importantes da sigla, como o líder no Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), têm demonstrado simpatia a Fachin. 

Procurado, o jurista não quis comentar o assunto. Ontem ele continuou o seu périplo pelo Senado – a ideia de Fachin é conversar com todos os 81 senadores até o dia da sabatina. Até agora, foram 47.

 

Meio jurídico diverge sobre exercício de dupla atividade

 

 A Constituição do Estado do Paraná manteve por dez anos, entre 1989 e 1999, a proibição do exercício da advocacia para procuradores do Estado. Durante este período, o professor Luiz Edson Fachin atuou nas duas frentes, na procuradoria e no seu escritório particular.

A legalidade ou até a moralidade do exercício em paralelo das duas funções, entretanto, não é ponto pacífico no meio jurídico. Argumentos de ambos os lados deverão alimentar a discussão marcada para 13 de maio, quando o indicado ao Supremo Tribunal Federal passará pelo crivo dos senadores.

Ontem, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) argumentou que Fachin foi aprovado n0 concurso público para procurador sob a égide da Lei Complementar 26/1985, que dispõe sobre o Estatuto de Procuradoria-Geral do Estado e na qual não consta proibição. A assessoria de Fachin não informou a data em que ele foi aprovado no concurso.

 

Advogado Luiz Edson Fachin, nome de Dilma para o Supremo 

Advogado Luiz Edson Fachin, nome de Dilma para o Supremo 

 

O senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) usa como marco legal o dia 8 de fevereiro de 1990, data da nomeação de Fachin. Naquele dia já vigorava a Constituição do Paraná, que claramente proibia o exercício da advocacia para procuradores. "É vedado aos procuradores do Estado exercer advocacia fora das funções institucionais", diz o artigo 125, inciso terceiro da lei.

O diretor da Associação dos Procuradores do Estado do Paraná (Apep), Eroulths Cortiano Junior, argumenta que a Constituição estadual foi revisada em 1999 e no novo texto consta a permissão. O artigo 33 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias da lei revisada diz que "o disposto no art. 125, § 3.º, I, desta Constituição não se aplica aos atuais procuradores do Estado".

Cortiano não soube dizer, entretanto, se era legal um procurador exercer advocacia privada nos 10 anos entre a promulgação (1989) e a revisão da Constituição estadual (1999). "O entendimento é que só há impedimento se o procurador advogar em causas contra a administração pública", disse. A Apep divulgou nota em que afirma que aguarda "em tenaz vigília" a nomeação de Fachin para o Supremo Tribunal Federal.

Para o professor de Direito Constitucional da FGV Rubens Glezer, o STF entende que não há direito adquirido a regime jurídico. "Isso significa que uma mudança na legislação pode restringir ou modificar a concessão de auxílios e ou certas formas de exercer uma dada função no serviço público."

Segundo ele, é usual o STF interferir em situações para tolerar eventuais irregularidades passadas se o benefício foi usufruído com boa-fé. "Realizar o exame sobre a boa-fé do candidato nessa situação é o que me parece central para fazer a avaliação moral sobre a qualificação de Fachin para exercer a função de ministro da instância superior do Judiciário Brasileiro."