Título: Brasileiros perdem R$ 258 bi na bolsa
Autor: Nunes, Vicente; Batista; Vera
Fonte: Correio Braziliense, 04/08/2011, Economia, p. 12

Incertezas em relação à economia dos EUA e da Europa deixam um rastro de prejuízos nos mercados acionários de todo o mundo. Temor é de uma crise ainda pior que a de 2008 e 2009. BM&FBovespa caiu 19,17% no ano

» Vicente Nunes » Vera Batista

Os brasileiros que costumam acompanhar constantemente as suas aplicações em bolsas de valores estão assustadíssimos. Não sem motivos. O patrimônio investido em ações está encolhendo dia após dia, solapado pela crise nos Estados Unidos e na Europa. Dados da Bolsa de Valores de São Paulo (BM&Bovespa) mostram que, desde o início do ano, as perdas já chegam a R$ 257,9 bilhões.

Esses prejuízos podem ser medidos pelo valor de mercado de todas as empresas listadas no pregão paulista e vislumbrados por meio das cotas dos fundos de ações, com saldos cada vez menores.

"A situação está feia. Ontem, o pânico tomou conta das negociações, devido à preocupação com os EUA, que podem mergulhar na recessão, e a Europa, cada vez mais encrencada", disse Demétrius Borel Lucindo, economista da Prosper Corretora. Para ele, a sensação é de que uma bomba-relógio está ligada e pode ser detonada a qualquer momento, caso países como a Espanha e a Itália entrem em colapso. "São dúvidas como essa que estão movendo a irracionalidade que tomou conta dos investidores. Tomara que essa onda passe logo. A sensação é de que já chegamos ao fundo do poço", acrescentou.

Dominado pelo nervosismo, o Ibovespa, índice que mede a lucratividade das ações mais negociadas na bolsa paulista, encerrou com baixa de 2,26% (a segunda maior do ano), nos 56.017 pontos, o menor nível desde setembro de 2009. No acumulado do mês, a queda já chega a 4,77% e, no ano, a 19,17%. "Mesmo com todas as incertezas lá fora, não há nada que justifique tamanho derretimento do mercado acionário brasileiro. Aqui, o consumo continua forte e as empresas listadas na BM&FBovespa lucrando como nunca", destacou o economista da Prosper. Ele não descartou, porém, a possibilidade de a bolsa ceder ainda mais, caso o Ibovespa rompa o suporte dos 55 mil pontos. Para isso, basta cair apenas 3,5%.

Índices medíocres Na avaliação dos especialistas, o futuro do mercado acionário está atrelado ao que os governos das maiores economias do planeta farão para evitar o pior. Os investidores sabem que, em uma nova crise, dificilmente o Poder Público terá condições de dar novos estímulos à atividade em caso de recessão. As maiores nações estão com elevado nível de endividamento e com o caixa restrito ¿ tanto que o presidente dos EUA, Barack Obama, quase foi obrigado a se ajoelhar perante o Congresso para aprovar o aumento do teto da dívida daquele país. O mercado, contudo, considerou frágil a vitória de Obama para tirar a economia norte-americana da beira do abismo. Os cortes que serão feitos no Orçamento podem contrair ainda mais o consumo. O índice do setor de serviços, por exemplo, voltou a desacelerar em julho, ficando no pior nível previsto pelos especialistas, de 52,7%.

Em Nova York, no fim do dia, surgiu um sinal de alívio em meio a nuvens pesadas de pessimismo. O índice Dow Jones, que ficou o dia todo no vermelho e havia caído 7% nas últimos duas semanas, encerrou a quarta-feira com ligeira valorização de 0,24%. Na Nasdaq, houve alta de 0,89%, devido à recuperação dos papéis de empresas de tecnologia. "Os investidores estão se dando conta de que o mercado é muito vulnerável aos problemas europeus, à dívida dos Estados Unidos e até em relação às medidas de austeridade", disse à Reuters Mace Blicksilver, da Marblehead Asset Management.

Na Europa, a Bolsa de Londres caiu 2,34%, a de Paris cedeu 1,93% e a de Frankfurt, 2,30%. "Os dados econômicos da principais economias do mundo divulgados nos últimos 10 dias foram medíocres e os de ontem não foram exceção", afirmou Michael James, da Wedbush Morgan Securities.

Bloqueio total Com o mercado financeiro tomado pela ansiedade e o crescimento econômico minguando, autoridades em todo o mundo podem ser forçadas a, mais uma vez, trabalhar contra uma crise, como fizeram em 2008 e 2009. Mas, desta vez, as opções são menores. Os bancos centrais têm menos espaço para afrouxar a política monetária do que há três anos. Os governos, com menos recursos, não podem mais bancar gastos como antes e o desarranjo político em alguns países pode tornar mais complicada a cooperação internacional. "O que dá para fazer? Em política monetária, claramente ninguém concorda com ninguém. Em política fiscal, estão todos bloqueados", disse o economista do Deutsche Bank Gilles Moec.