Daqui para frente, não será como Cunha quer

Daiene Cardoso

Ricardo Della Coletta

 

Após uma semana de desgaste na condução da votação da reforma política, líderes de partidos governistas e de oposição avaliam que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), enfrentará a partir de agora mais dificuldades para impor suas vontades ao plenário da Casa. 

O peemedebista, homem que desde que assumiu o comando da Câmara tirou o protagonismo do Palácio do Planalto, hoje é chamado nos discursos da tribuna de “autoritário”, “truculento” e capaz de passar por cima de todos quando lhe é conveniente. Contrariados com o estilo Cunha de conduzir os trabalhos, deputados falam em boicotar a coleta de assinaturas para a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que permitiria a reeleição da Mesa Diretora da Casa, hoje articulada pelo peemedebista. 

O desconforto atingiu nesta semana os partidos de oposição - que ganharam voz na gestão Cunha - e chegou à bancada do PMDB. O tratamento dado pela presidência da Câmara ao deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), relator Comissão Especial da Reforma Política, causou indignação entre os membros do partido. O colegiado não teve a oportunidade sequer de votar o parecer de Castro, destituído por Cunha, e o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) foi escolhido para relatar a proposta no plenário. 

Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB/RJ) é cercado e pressionado por lideres de partidos e parlamentas durante a votação do tempo do mandato parlamentar e clausulas de barreiras

Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB/RJ) é cercado e pressionado por lideres de partidos e parlamentas durante a votação do tempo do mandato parlamentar e clausulas de barreiras

A reação imediata foi que 13 deputados do partido votaram para derrubar o sistema eleitoral conhecido por distritão, bandeira do PMDB, e só 18 seguiram a orientação do líder Leonardo Picciani (RJ) para votar contra o fim das coligações proporcionais. Ao começar a votar contra o líder, a bancada deixa entrever que a relação com a Casa vai mudar por ela estar desgostosa com Cunha. 

Desgastes. Um dos primeiros episódios a causar incômodo entre os parlamentares foi a entrega da Secretaria de Comunicação Social da Câmara ao deputado da bancada evangélica Cleber Verde (PRB-MA). A indicação integrava a lista de promessas de Cunha para vencer a eleição para presidente da Câmara. A inclusão de uma matéria estranha ao texto original de medida provisória para a construção de um shopping na área da Casa também gerou desgaste. Com a imagem arranhada, os líderes partidários acreditam que o peemedebista ainda trabalhará com muita força para se impor, mas daqui para frente nem tudo o que ele quiser, dizem, será votado. “Ele (Cunha) vai se desgastando todo dia. Fazer gestão é isso”, desconversou o deputado Nilson Leitão (PSDB-MS). 

Por outro lado, Cunha consolidou nesta semana sua influência entre os chamados “nanicos” e as pequenas legendas. Depois de ver o distritão ser vetado e uma primeira tentativa de constitucionalizar o financiamento privado ser derrubada, o presidente da Casa ameaçou os pequenos partidos com a aprovação de um dispositivo que dificultaria o acesso ao fundo partidário e ao tempo de TV e conseguiu reverter dissidências para aprovar, na quarta-feira, uma emenda que coloca na Constituição a previsão de empresas doarem a partidos políticos. 

Com o acordo, os pequenos partidos foram os que conseguiram, na primeira etapa da reforma política, fazer suas bandeiras avançarem. A fidelidade garantiu apoio para que essas siglas barrassem o fim das coligações nas eleições proporcionais e, mais importante, deram aval a uma cláusula de barreira “light”, que vai fechar as portas para o acesso ao fundo partidário e ao tempo de TV apenas aos partidos que hoje não contam com representatividade no Legislativo. Na prática, isso alveja só os quatro dos 32 partidos registrados hoje no Tribunal Superior Eleitoral. 

Se as bancadas menores conseguiram garantir sua sobrevivência, o PT e o PSDB não levaram adiante suas bandeiras. Os petistas viram o modelo de lista fechada, pelo qual os eleitores votam em relações pré-ordenadas, naufragar. O PSDB, por sua vez, não conseguiu emplacar o sistema distrital misto. Nessa corrente, são os pequenos que respiram aliviados. 

Fim da reeleição. A Câmara dos Deputados aprovou o fim da reeleição de prefeitos, governadores e presidente da República, que terão direito a um mandato de 4 anos. Presidente da Casa, Eduardo Cunha é defensor da proposta.

Sistema de votação. Em sua primeira derrota na votação da reforma, Cunha viu o modelo distritão – sistema em que é eleito o mais votado, sem considerar os votos no partido – ser rejeitado. Cunha era um dos principais defensores do modelo, mas acabou prevalecendo o sistema de votação proporcional, adotado hoje, que considera a votação do candidato e da sigla.

Financiamento privado. A aprovação da inclusão na Constituição do financiamento de empresas a partidos foi uma vitória de Cunha, que, como defensor das doações privadas, viu, um dia antes, proposta semelhante ser rejeitada. Hoje, empresas e pessoas físicas podem doar a partidos ou candidatos, mas o repasse via empresa não está na Constituição.

Cláusula de desempenho. Pela cláusula aprovada, terão direito a tempo e TV e ao Fundo Partidário siglas que tenham eleito ao menos um deputado ou senador. A restrição, branda, foi negociada com partidos como o PC do B em troca de apoio à inclusão do financiamento privado de campanha na Constituição, bandeira de Cunha.