Valor econômico, v. 15, n. 3738, 17/04/2015. Brasil, p. A5

Aumenta a tensão entre PF e Janot

 

Por Letícia Casado e Thiago Resende | De Brasília

O clima entre Polícia Federal e Procuradoria-Geral da República (PGR) está tenso por causa de uma petição protocolada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que causou desconforto entre delegados federais. Anteontem, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki acatou manifestação de Janot para que fossem suspensos os depoimentos relacionados à Operação Lava-Jato que seriam tomados entre os dias 15 e 17 de abril.

As instituições não falam oficialmente sobre o assunto, mas nos bastidores é possível perceber que os delegados estão irritados enquanto os procuradores tentam apaziguar os ânimos com o discurso sobre "evitar conflito".

A leitura feita por delegados federais e advogados que acompanham a operação é que a PGR, insatisfeita com a forma como a investigação está sendo feita, arrumou "subterfúgios" para tirar a competência de investigação da PF e assumir o controle da linha de investigação do caso.

Na procuradoria, o discurso é que Janot quer retomar a condução das investigações, pois discordou com o rumo da coleta de provas dado pela PF.

Valor teve acesso ao documento da decisão do ministro Zavascki e à petição feita por Janot, que estão sob sigilo.

O argumento da PGR é que a medida melhoraria a organização da logística e da linha de investigação sobre a parte da Lava-Jato investigada no Supremo. No texto, Janot afirma que os fatos narrados na Lava-Jato "estão pendentes de análise de pedidos de prorrogação de prazo" pelo MPF e que "em razão de necessidade de melhor organização da estratégia e planejamento do titular da ação penal" requer a suspensão das oitivas marcadas para esta semana.

Para os federais, a PGR pediu a suspensão de oitivas porque seriam feitas na sede da PF, não na PGR, e as instituições passam mais tempo discutindo local de depoimento do que analisando as provas coletadas.

Foram porém as justificativas do texto de Janot que mais irritaram os delegados federais.

O texto justifica a medida "em razão de necessidade de melhor organização da estratégia e planejamento do titular da ação penal", mais especificamente "o modo como se desdobra a investigação e o juízo sobre a conveniência, a oportunidade ou a necessidade de diligências tendentes à convicção acusatória", que são "atribuições exclusivas do procurador-geral da República, mesmo porque o Ministério Público, na condição de titular da ação penal, é o verdadeiro destinatário das diligências executadas", diz o documento.

Advogados entendem que, quando a PGR fala sobre o "verdadeiro destinatário das diligências", a procuradoria parte do princípio de que o MPF é absolutamente isento, sendo que cabe ao ministério a tarefa de acusar. Permitir à procuradoria assumir a linha de investigação implicaria portanto em assumir o risco de que os procuradores conduzissem as perguntas de modo a produzir prova para si mesmo, colhendo prova com viés acusatório.

Outras reclamações de delegados permeiam o relacionamento entre as instituições. Eles dizem que precisam comunicar todas as intimações à PGR e que foram proibidos de conversar diretamente com o ministro Zavascki.

Um delegado da PF cita a operação Colono - que investigava desvio de recursos do programa de agricultura familiar Pronaf para campanhas eleitorais do PT no Rio Grande do Sul-, cuja investigação da Polícia Federal acabou sendo esvaziada após algumas medidas tomadas por Janot. Para este delegado, o mesmo pode acontecer na etapa da Lava-Jato no Supremo.

A queda de braço entre PF e MPF não é nova, mas a situação piorou esta semana. A PF foi comunicada sobre a suspensão das oitivas depois da decisão já tomada pela PGR, atitude considerada agressiva entre os federais.

A PF informou então a procuradoria que só suspenderia os depoimentos após ordem judicial. No pedido feito ao ministro Zavascki, Janot diz que considera "desnecessária" essa demanda de ordem judicial pela PF. A expressão também irritou os delegados. Janot fez então solicitação ao ministro Zavascki, que acatou o pedido. Foram então suspensos depoimentos em sete inquéritos sobre a participação de políticos em irregularidades envolvendo contratos da Petrobras.

Esses processos se referem a 40 investigados, incluindo o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, preso nesta quarta-feira em mais um desdobramento da operação Lava-Jato. A lista de quem iria depor, no entanto, é sigilosa.

Ontem, o ministro do STF Marco Aurélio disse que a verdade é a principal prejudicada com as divergências entre a PGR e a Polícia Federal no andamento das investigações da Operação Lava-Jato. Ele criticou a disputa. "O inquérito busca a verdade e é preciso que as instituições funcionem nas áreas reservadas pela lei", comentou.

Valor econômico, v. 15, n. 3738, 17/04/2015. Brasil, p. A5

CPI ouve Coutinho sobre empréstimos

 

Por Thiago Resende e Letícia Casado | De Brasília

 

Ruy Baron/ValorCoutinho: presidente do BNDES disse que contratos podem ser revistos em caso de aumento de risco do negócio

O presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, informou ontem que contratos já em andamento com empresas citadas na Operação Lava-Jato podem ser revistos em caso de aumento do risco do negócio. Em relação a novos empréstimos com as empreiteiras suspeitas de terem participado de irregularidades na Petrobras, ele afirmou que isso será avaliado com precaução.

Coutinho, em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara para apurar suposto esquema de corrupção na petroleira, foi questionado pelo relator, Luiz Sérgio (PT-RJ), sobre a possibilidade de o banco paralisar novos financiamentos a projetos de empresas envolvidas no caso. "A nossa obrigação é zelar pela melhor prática bancária e seguir as melhores práticas conforme nossos reguladores. Projetos em andamento que foram feitos sob contratos juridicamente perfeitos podem ser reavaliados se acontecer uma mudança relevante na classificação de risco do projeto ou nas condições cadastrais", respondeu.

Na mesma linha, o presidente do banco de fomento e que também ocupa o cargo de presidente do Conselho de Administração da Petrobras afirmou que os novos projetos das empreiteiras serão analisados de acordo com os critérios da boa prática bancária. E completou: "Temos precaução e temos observado rigorosamente os dispositivos legais e regulatórios".

Um dos assuntos mais comentados durante cerca de oito horas de depoimento foi a afirmação do ex-gerente de serviços da Petrobras Pedro Barusco, em acordo de delação premiada, a respeito de suposta irregularidade no financiamento pelo BNDES na constituição da Sete Brasil, empresa criada para exploração do pré-sal. Coutinho disse que há uma "imprecisão entre a fala e a realidade", pois o banco não tem nenhum contrato nem desembolsou recursos para a Sete Brasil, pois a companhia começou a se desorganizar, o que tornou a contratação inviável.

Deputados governistas e da oposição começaram logo um embate sobre o assunto. "Hoje está evidenciado que um ponto que inclusive motivou a vinda do Luciano Coutinho não corresponde à verdade, porque o BNDES não financiou a Sete Brasil", afirmou o relator da CPI, Luiz Sérgio (PT-RJ). A oposição, no entanto, insistiu na validade da delação premiada de Barusco, que acusou o desvio de dinheiro da Petrobras para abastecer o PT.

O presidente do BNDES confirmou que teve uma reunião com o consórcio do aeroporto de Viracopos, incluindo Ricardo Pessoa, executivo da UTC. Ele foi diversas vezes indagado sobre o encontro, pois dias depois, segundo informações citadas pelo deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), a UTC doou dinheiro para o segundo turno da campanha presidencial de Dilma Rousseff do ano passado. "De modo algum participei de financiamento de campanha", negou Coutinho a irregularidade.

Membro do Conselho de Administração da Petrobras desde 2008, Coutinho reconheceu que governança da estatal tem que ser melhorada. Apesar de qualidade nos fundamentos técnicos dos contratos e das auditorias na empresa, as revelações da Operação Lava-Jato "mostram que determinadas fronteiras de governança foram sobrepujadas e isto obviamente requer um aperfeiçoamento do sistema", admitiu.

Coutinho, que assumiu recentemente a presidência do Conselho de Administração da Petrobras, confirmou que o BNDES tem participação na estatal e foi questionado pelo deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) se fez alguma consulta jurídica sobre possível incompatibilidade em ocupar o cargo visto que já era presidente do banco. Se houver conflito entre as posições, "terei que me abster", respondeu sem dar detalhes.

Ele falou ainda que, feito o ajuste fiscal nas contas do governo, é natural que o Banco Central volte a reduzir os juros. Assim, quando a taxa básica de juros, a Selic, e a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), usada nos contratos do BNDES, convergirem, os subsídios à instituição vão "desaparecer".

 

Valor econômico, v. 15, n. 3738, 17/04/2015. Brasil, p. A5

 

Comissão pedirá relatórios do Coaf

 

Por Vandson Lima | De Brasília

A CPI do HSBC aprovou ontem um pedido de acesso a relatórios de inteligência fiscal (RIF), sob responsabilidade do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), com informações sobre atividades fiscais de 50 brasileiros com conta na filial suíça do banco.

Segundo o vice-presidente da CPI, o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), há 126 pessoas listadas pelo Coaf como detentoras de contas no HSBC em Genebra e que são alvo de investigações relacionadas a supostas fraudes fiscais. As investigações, inclusive por parte de outros órgãos, estão mais avançadas no caso de 50 correntistas desse grupo.

"O relatório do Coaf tem uma divisão. Alguns dos 126 nomes possuem somente uma investigação fiscal. Outros o próprio Coaf indica para nós que estão sob investigação fiscal, sob investigação da Polícia Federal e do Ministério Público. São elementos que apontam que estes selecionados merecem um aprofundamento de investigação por parte da CPI", disse.

Para Randolfe, "estes relatórios nos dirão, pelo menos, como estes senhores movimentaram essas contas, o porquê da opção pela Suíça e podem nos dar indícios de qual a origem do dinheiro", o que daria robustez aos trabalhos da CPI.

Ele citou o caso do Henry Hoyer, supostamente o substituto do doleiro Alberto Youssef no esquema da Petrobras investigado pela Operação Lava-Jato, cujo depoimento foi adiado. "Precisávamos de mais elementos e informações para o depoimento [do Hoyer]. Com este relatório do Coaf, que tacitamente é uma quebra de sigilo bancário, nós teremos de onde partir e aonde chegar para saber quais as razões do senhor Henry Hoyer para ter, em diferentes momentos, uma conta na Suíça", avaliou. "Sem essas informações, iríamos ter de partir do que já foi publicado pela imprensa ou perguntar a ele qual a relação entre o que está depositado na Suíça com o que foi operado na Lava-Jato", continuou.

Ainda hoje os integrantes da CPI estarão com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a quem solicitarão acesso mais célere a informações que contribuam nos trabalhos do grupo, que têm encontrado dificuldades. "A natureza dessas informações é na esfera internacional. Estamos dependendo do governo da França. A Procuradora-Geral da República nos informou que no dia 24 deverão se dirigir até Paris. E nos dias 27 e 28 terão encontros com as autoridades francesas. E vamos reunir com o ministro da Justiça hoje, para termos acesso aos dados dos 8 mil correntistas [brasileiros]".

Além do pedido de acesso a relatórios, a CPI aprovou ainda convite para que o diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello Coimbra, preste esclarecimentos em audiência pública sobre as investigações em andamento.