Valor econômico, v. 15, n. 3738, 17/04/2015. Finanças, p. C1

 

Investidor dá trégua à Petrobras e volta a comprar bônus e ações

 

Por Aline Cury Zampieri e Talita Moreira | De São Paulo

O mercado financeiro parece ter reatado com a Petrobras nas últimas semanas. Ou, ao menos, concedeu uma trégua à empresa. A expectativa de que a estatal finalmente publique os balanços auditados do terceiro e quarto trimestres de 2014 vem impulsionando o valor das ações e títulos de dívida externa da empresa, ao mesmo tempo em que contribui para uma melhora dos preços de ativos brasileiros como um todo.

Apesar do recuo registrado ontem, neste mês Petrobras PN já avançou 32,9%, para R$ 12,93, enquanto a ON subiu 37,6%, para R$ 13,18. O Ibovespa teve alta de 6,9%. No seu pior momento, em 30 de janeiro deste ano, os dois papéis chegaram próximos a R$ 8. A recuperação desde então é relevante, mas as ações ainda estão muito distantes do pico alcançado há quase sete anos, em 21 de maio de 2008, com a PN a R$ 42,68 e a ON em R$ 53,07.

 

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Levantamento feito pelo Valor Data mostra que o apetite renovado dos investidores pelos papéis fez o volume negociado com as ações dar um salto. O giro transacionado com as ações ON e PN da Petrobras saiu de 9,7% do total da Bovespa em 1º de abril para 20,3% no dia 14. A Bovespa movimentou R$ 8,064 bilhões em 1º de abril. No dia 14, o giro foi de R$ 6,789 bilhões, queda de 15,8%. Juntas, as ações de Petrobras tiveram um aumento de 77% na mesma base de comparação, passando de R$ 779,6 milhões para R$ 1,380 bilhão.

Não só as ações chamam atenção. O valor dos títulos emitidos no exterior subiu nas últimas três semanas. Analistas têm recomendado a compra dos bônus externos da Petrobras. Ontem, o diretor de mercado de capitais do BNP Paribas, Rodrigo Fittipaldi, lembrou que os spreads dos bônus da estatal giravam em torno de 300 pontos-base sobre os Treasuries, subiram para 650 pontos na fase mais aguda da crise na empresa e agora estão em torno de 400 pontos. "É um movimento forte, mas tem espaço para cair mais", destacou Fittipaldi, que participou de evento sobre renda fixa promovido pela Latin Finance. Spreads menores significam um aumento no preço dos bônus. "Sugiro comprar Petrobras, bônus ou ações, e vendendo volatilidade", afirmou o executivo.

A análise positiva não é a única. No começo da semana, por exemplo, o Bank of America elevou a recomendação para todos os bônus da Petrobras sob sua cobertura. O Deutsche Bank prevê uma redução ainda maior nos spreads dos bônus da Petrobras com a publicação do balanço, prevista para o dia 22. Porém, analistas de renda fixa do banco afirmam que os papéis não devem voltar rapidamente ao patamar típico de uma companhia com grau de investimento, já que ainda persistem incertezas sobre o endividamento e a capacidade da estatal de manter seu rating.

Em relatório, o analista Eduardo Vieira diz que uma redução no endividamento só será mais significativa a partir de 2019.

O Deutsche manteve a recomentação de "manter" para os bônus da Petrobras. O banco apontou os papéis com vencimento em 2023, 2041 e 2043 como seus favoritos por considerá-los mais defensivos e menos voláteis. Os títulos de 2019, 2020, 2024 e 2044 também estão relativamente atrativos, segundo o banco. Porém, como têm preço em dólar mais elevado, implicam um risco potencial maior caso fundos de hedge decidam questionar a legitimidade das baixas contábeis de perdas com corrupção que forem feitas no balanço.

No mesmo dia em que recomendou a compra dos bônus, o BofA Merrill Lynch elevou a recomendação para as ações da Petrobras de "neutro" para "compra", sob a expectativa do balanço. Mas, até agora, não foi acompanhado por muitas outras casas de renda variável. O J.P. Morgan, por exemplo, emitiu recomendação neutra para todas as classes de ativos ligadas à empresa, em relatório desta semana. No dia 13, o Credit Suisse tinha indicação abaixo do mercado ("underperform") para as ações.

Para o estrategista-chefe da XP Investimentos, Celson Plácido, todo o ganho acumulado pelas ações da Petrobras em antecipação ao balanço cria condições para uma correção assim que os números saírem. Ele pondera haver visto muito dinheiro especulativo, e não de longo prazo, nesse fluxo.

O presidente da Magliano Corretora, Raymundo Magliano Neto, chama a atenção para os ganhos mais fortes das ações ordinárias, com direito a voto, do que as preferenciais. Segundo ele, esse é um sinal de que os estrangeiros estão comprando Petrobras com mais força. Ações com direito a voto são as preferidas do investidor externo. Até 13 de abril, o saldo de capital externo na Bovespa é positivo em nada menos que R$ 4,135 bilhões.

Apesar de todo o otimismo, Magliano diz não recomendar a seus clientes a compra das ações. Para ele, os riscos ligados ao balanço são muito altos e, a depender do que for divulgado, os papéis podem ter forte correção para baixo.

A perspectiva de divulgação do balanço da Petrobras é um dos elementos que compõem um ambiente mais favorável ao apetite por risco e, portanto, ajuda a explicar uma melhora de preços de alguns ativos financeiros, como dólar, juros futuros e risco país.

Ao longo de abril, período em que o mercado passou a trabalhar com um horizonte mais claro para a divulgação do balanço da companhia, o custo do Credit Default Swap (CDS, uma espécie de seguro contra calote) do Brasil iniciou uma trajetória mais firme de queda. Saiu do nível de 282 pontos base em 31 de março para 239 pontos ontem. Na véspera, chegou a ser negociado 232 pontos.

O movimento foi alimentado por várias outras razões, como a melhora do ambiente político, queda do dólar e pela farta liquidez global. Mas, quando se olha para o CDS de outros emergentes, fica evidente que o recuo tem mais a ver com questões domésticas do que com as internacionais. O CDS de igual prazo do México, por exemplo, caiu 8 pontos ao longo de abril, a 117 pontos base. Já o contrato da Turquia subiu 16 pontos, a 231 pontos base, e o da Indonésia 3,5 pontos, a 157 pontos base.

Nas taxas de juro de longo prazo se observou um alívio importante, movido pelas mesmas razões. O rendimento da NTN-B 2050, que oscilava perto de 6,5% no fim de março, havia cedido ontem a 5,98%. Parte dessa queda pode ser atribuída à ideia de que Petrobras pode deixar de representar um risco para a dívida pública, por restabelecer suas condições de financiamento.

Quando houve o atraso da divulgação do balanço da companhia, investidores reagiram elevando os custos do CDS e dos juros de longo prazo, por considerar que o governo poderia ter de socorrer a companhia. Ao colocar a empresa de volta aos padrões de mercado, ainda que com questões financeiras a superar, sai de cena uma das muitas travas que impedem a retomada da confiança do estrangeiro em aplicar em Brasil. (Colaborou Lucinda Pinto)