Semana de pressão sobre Dilma

Correio braziliense, n. 18991, 25/05/2015. Política, p. 3

Paulo de Tarso Lyra

Na semana em que o Planalto volta as atenções para a votação de uma das MPs do ajuste fiscal — crucial para o rearranjo das contas públicas (leia mais na página 7) —, a presidente Dilma Rousseff sofrerá pressão extra por parte de opositores. Os líderes dos partidos de oposição entregam amanhã, na Procuradoria-Geral da República, o pedido de abertura de ação por crime comum contra a presidente Dilma Rousseff. Os oposicionistas querem que a petista seja punida pelas chamadas “pedaladas fiscais” identificadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em 2013 e 2014. Ao atrasar o repasse de recursos para os bancos públicos pagarem os programas sociais, a manobra contábil serviu para o Tesouro Nacional assegurar o cumprimento da meta de superavit primário. 

A ação penal foi a estratégia escolhida por PSDB, PPS, DEM e PSC após ver frustradas as esperanças de um pedido de impeachment da presidente. “O que nós queríamos, de fato, era o impeachment. Gostaríamos muito. Mas, para isso, teríamos de ter fundamentos jurídicos e políticos que não temos”, explicou ao Correio o líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR).

O deputado lembra, contudo, que o pedido que será feito amanhã ao procurador-geral da RepúblicaRodrigo Janot, poderá, ao fim do processo, resultar no afastamento político da presidente Dilma. “Se for, de fato, comprovado que ela cometeu crime de responsabilidade fiscal, o Congresso poderá autorizar o afastamento de Dilma por um prazo de até 180 dias, mesmo tempo previsto quando se abre um pedido de impeachment contra um presidente”, corroborou o líder da minoria na Câmara, deputado Bruno Araújo (PSDB-PE).

A escolha feita por PSDB e aliados provocou um estremecimento nas relações entre os políticos e os movimentos populares que defendem o impeachment da presidente Dilma. Nas redes sociais, inclusive, o Movimento Brasil Livre (MBL) reclamou da atitude da oposição. No último sábado, durante entrevista coletiva após proferir palestra em Brasília, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defendeu os tucanos. “O PSDB, como tal, jamais defendeu o impeachment. Essa pode ter sido uma posição pontual de um ou de outro integrante, mas não do partido como um todo”, explicou FHC.

O ex-presidente, que durante a palestra, foi bastante crítico ao governo Dilma, afirmou que as “pedaladas fiscais” poderão comprometer a presidente, além de ter prejudicado as contas públicas. E lançou um questionamento, ainda não abordado, sobre o argumento dado pelo procurador-geral da República, de que não se pode julgar a presidente por atos cometidos antes do atual mandato. “Essa regra foi imposta quando só tínhamos um mandato para o governante. Agora, os governantes podem ser reeleitos. A regra passa a ser a mesma? Ninguém debateu isso ainda”, ponderou.

Para tentar uma reaproximação com os movimentos populares, que chegam a Brasília na quarta-feira — três dias depois do acidente que feriu integrantes da caminhada que partiu de São Paulo em 24 de abril (leia mais na página 17) —, os partidos de oposição marcaram reunião com os ativistas. “Vamos preparar uma recepção a esses manifestantes na quarta. Creio que esse estranhamento é porque eles não entenderam que continuamos defendendo as mesmas coisas, apenas buscamos um outro caminho”, justificou Rubens Bueno.

Impeachment

Em entrevista ao jornal mexicano La Jornada, publicada ontem, a presidente Dilma Rousseff garantiu não temer um possível impeachment. “Eu não tenho temor disso, eu respondo pelos meus atos. E eu tenho clareza dos meus atos”, disse. Segundo a petista, “o problema do impeachment é sem base real” e está sendo usado como “arma política”.

Dilma, que viaja ao México hoje, afirmou não acreditar que a democracia “engendre situações de paz dos cemitérios”. Ela diz que, “quanto mais resilientes formos, quanto mais normal for a manifestação política, (...) mais evoluídos, do ponto de vista democrático, nós somos”.

Fundador morre no Rio

Morreu ontem, no Rio de Janeiro, o militante Antonio de Neiva Moreira Neto, 66 anos, um dos fundadores do PT no estado fluminense. Ele estava internado desde a semana passada devido a uma pneumonia, mas não resistiu a uma infecção generalizada. Neiva, como era conhecido, nasceu no Rio, em 1949, e, ainda criança, mudou-se para o Maranhão.

Em nota, o PT lamentou a morte de Neiva, classificado de “um líder encantador e incansável”. Segundo o texto, os petistas estão “felizes com o legado e com as sementes que ele plantou”.

O petista participou do movimento estudantil e atuou contra a ditadura. Ele foi preso em duas ocasiões. E uma delas, em 1968, cursava engenharia elétrica na Universidade de Brasília (UnB). Ao deixar a prisão, voltou à cidade natal, onde se formou em economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), antes de participar da fundação do PT no estado.

O corpo do militante será enterrado hoje, no Cemitério São João Batista, Zona Sul da capital fluminense.