Doações chegam a R$ 10,5 milhões

Correio braziliense, n. 18988, 22/05/2015. Poítica, p. 3

João Valadares

André Shaders

Quatro das empresas que demonstraram interesse na parceria público-privada (PPP) para a ampliação da Câmara doaram, juntas, R$ 10,5 milhões nas últimas eleições para 10 deputados federais, 20 estaduais e oito candidatos a governador. Há repasses para oito partidos, incluindo legendas oposicionistas (PSDB, DEM e PPS) e da base do governo (PT, PTB e PR). Candidatos do PMDB, legenda responsável pela articulação para aprovar o artigo da Medida Provisória nº 668, que permite a realização de PPPs pelo Legislativo, também foram contemplados. EMSA, Via Engenharia, Concremat e Servi são as empresas que devem disputar a implantação do projeto. A proposta, que inclui a construção do Parlashopping nas imediações da Câmara, terá custo total próximo de R$ 1 bilhão.

Na tarde de ontem, o PPS protocolou mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar anular os efeitos da proposta que trata das normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privadas para a construção do anexo. No documento, o líder da legenda, deputado Rubens Bueno (PR), pede a anulação da votação, que, em sua avaliação, não cumpriu os requisitos previstos na Constituição para apreciação de MPs.

A chamada “emenda do shopping” foi incluída no texto do projeto de conversão da MP nº 668, que aumenta as alíquotas de contribuição para o PIS-Pasep-Importação e da Cofins-Importação. “Não é de interesse da educação, não é de interesse da saúde, não é de interesse da segurança nem do povo brasileiro votarmos uma matéria como esta, que vai envolver milhões de reais. Tenhamos o mínimo de sensibilidade. Apelamos ao bom senso desta Casa”, afirmou o parlamentar. A ampliação dos gabinetes e a construção do centro comercial é uma proposta de campanha do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que se empenhou pessoalmente para a aprovação do dispositivo. A inclusão de “matéria estranha” em MPs é vetada por uma lei complementar de 1998. Na quarta-feira, diante da resistência de parte dos deputados em votar a medida, Eduardo Cunha chegou a dizer que a alteração na lei era apenas “um preciosismo” da consultoria jurídica da Câmara, e que a obra poderia ocorrer sem ela.

Repercussão

O deputado Júlio Delgado, que foi adversário de Cunha na disputa pela Presidência da Câmara, também criticou a proposta. “Não podemos transformar a Câmara, que é o local de participação do povo, num local onde se fazem negócios. Um patrimônio públicovirar ação de direito privado é uma aberração. Nós somos representantes do povo, não somos clube de amigos. Não podemos resolver nossos problemas e o povo é que se dane. Isso é uma aberração. Não podemos transformar patrimônio histórico em palco onde se vai ter negociação do direito privado. Isso aqui não é sociedade anônima nem sociedade de economia mista.”
Ao todo, 273 deputados votaram a favor da proposta e 183 foram contrários. Sete se abstiveram. Até mesmo parlamentares que apoiaram a eleição de Cunha ficaram constrangidos em apoiar a medida. PT, PSDB, PPS e PCdoB orientaram os parlamentares a votar contra a medida. Pressionado pelo PMDB, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), defendeu o projeto. A discussão em torno da ampliação do espaço da Câmara é antiga. Em 2005, o então presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), tentou construir mais um prédio de gabinetes, o chamado “Anexo V”, mas a ideia não prosperou. O presidente seguinte, Michel Temer (PMDB-SP), travou de vez a construção. Os sucessores dele, Marco Maia (PT-RS) e Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), não tocaram mais no assunto.

No começo de março, Cunha removeu o engenheiro Maurício da Silva Matta da chefia do departamento técnico, depois dele conceder entrevista ao Correio sobre o tema. No fim daquele mês, a Câmara publicou a Proposta de Manifestação de Interesse (PMI), uma espécie de edital preliminar para a PPP. E, na semana passada, o primeiro-secretário da Mesa, Beto Mansur (PRB-SP), realizou uma reunião preliminar com cinco empresas interessadas em obter a concessão do espaço. Além do consórcio EMSA/SERVI, da Concremat e da Via Engenharia, também participaram da reunião representantes da Planos Engenharia e da Ceres Inteligência Financeira.

O que muda
Veja os itens previstos na Proposta de Manifestação de Interesse (PMI), publicada pela Câmara no fim de março. Ao todo, a obra terá 332 mil metros quadrados

Reforma do Anexo IVa
Apelidado de “serra pelada”,
o prédio atual onde ficam os gabinetes da maioria dos
deputados, foi inaugurado nos anos 1980. Após a reforma , ficaria
com gabinetes de 60m², ao
contrário dos 40m² atuais

Anexo IVc
É o “Anexo V” propriamente dito. Será uma réplica do Anexo IV atual, em posição espelhada. Projetado por Niemeyer, terá outros 256 gabinetes de deputados

Anexo IVb
Prédio de três andares que será construído entre os anexos IV e V. Será destinado às estruturas da Câmara e a salas de reunião para os parlamentares. Também terá um auditório para 700 pessoas

Parlashopping
É chamado na proposta da Câmara de “Praça de Serviços” e ficará
localizado logo à direita do
“Anexo V”. Terá “restaurantes,
cafés e áreas de convivência”. Segundo a PMI, terá
3.125 metros quadrados

Anexo IVd
Prédio de três andares térreos e oito subsolos, que serão ocupados por vagas de garagem. Será a última obra do complexo, construída depois do Parlashopping